Bloomberg Línea — A startup colombiana Rappi encerrou o ano como o unicórnio da área tech mais valiosa da América Latina em meio a uma forte correção nos valuations das empresas, de acordo com os dados mais recentes da plataforma de análise de mercado CB Insights.
Depois da Rappi, o unicórnio mais valioso da região é a plataforma de habitação QuintoAndar (US$ 5,1 bilhões) e o banco digital C6 Bank (US$ 5,05 bilhões), todos na faixa de US$ 5 bilhões.
Depois, aparecem a plataforma de comércio eletrônico Nuvemshop (US$ 3,1 bilhões) e a empresa de jogos para celular Wildlife Studios (US$ 3 bilhões).
Mais abaixo estão a Ualá (US$ 2,75 bilhões), a Unico (US$ 2,6 bilhões) e a Kavak, juntamente com a Bitso, ambas com US$ 2,2 bilhões, enquanto a CloudWalk atinge US$ 2,15 bilhões.
Clip e Loggi, com avaliações próximas a US$ 2 bilhões, vêm logo atrás, de acordo com os dados da CB Insights.
Kavak e a crise de valuation
O ano de 2025 foi marcado pela compressão da valuation da plataforma mexicana de compra e venda de carros Kavak.
A queda na avaliação da Kavak está associada a uma rodada de redução em abril de 2025, que reduziu seu valor de mercado de US$ 8,7 bilhões para aproximadamente US$ 2,2 bilhões.
Até dezembro do ano passado, a Kavak era o unicórnio mais valioso da América Latina.
A CB Insights mapeou mais de 1.300 unicórnios em todo o mundo.
“Durante anos, confundimos ‘valuation’ com ‘solidez’, e 2025 está separando os unicórnios que eram uma história de capital abundante e pouco exigente (liquidez barata) daqueles que têm um motor econômico próprio“, disse Fernando Pontaza, cofundador e sócio-gerente do Invariantes Fund, à Bloomberg Linea.
Ele explica que o mercado está recompensando menos o “crescimento por decreto” e mais a capacidade de alcançar avanço com margens, eficiência e disciplina de capital.
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Em nível global, ele considera que o ajuste é robusto.
De acordo com vários relatórios citados por Fernando Pontaza, dos 726 unicórnios tecnológicos apoiados por empreendimentos, 28% não estão crescendo, 79% não são lucrativos e apenas uma minoria atende aos critérios financeiros para uma sólida abertura de capital IPO (na sigla em inglês).
Na América Latina, esse filtro é ainda mais rigoroso devido ao menor acesso ao capital de crescimento e ao seu custo mais alto.
Em vez de uma punição, Pontaza vê a correção como uma auditoria do modelo de negócios, separando as empresas com margens saudáveis e economias unitárias daquelas que continuam dependentes da constante queima de capital.
“O balanço patrimonial deixou de ser um apêndice contábil e se tornou uma estratégia. A equação é simples: quem não controla, queima caixa (acaba financiando sua sobrevivência com diluição, dívidas caras ou vendas forçadas)“, disse ele.
Victor Lau, sócio-gerente e CFO do fundo de investimento Impacta VC, considerou em uma análise que, nos últimos anos, “o ecossistema empresarial da América Latina passou por uma verdadeira montanha-russa em termos de valuations”.
Após o boom de 2021, quando várias startups latino-americanas alcançaram rapidamente o status de unicórnio, o mercado passou por um forte ajuste.
Em 2023, as avaliações e os investimentos despencaram, caindo mais de 80% em relação aos máximos anteriores.
A partir de 2024 e até 2025, o investimento voltou a crescer, com avaliações mais moderadas, porém mais fortes.
Nos estágios iniciais, embora as avaliações permaneçam abaixo das dos EUA, elas estão crescendo em um ritmo mais rápido, refletindo uma recuperação e maior maturidade do ecossistema.
“O que vemos daqui para frente é promissor. Muitos fundos estão novamente em processo de levantamento de capital, e isso significa que o ciclo de investimento continuará com mais inteligência e foco na sustentabilidade”, disse Victor Lau.
“As startups que realmente geram valor - não apenas em projeções, mas em métricas claras de uso, receita e expansão - serão as que se beneficiarão de valuations mais fortes.”
O TTR Data explica que, até novembro de 2025, um total de 147 transações de private equity foram concluídas Patrimônio privado na América Latina por US$ 8.849 milhões na região.
Isso “representa uma tendência de queda no número de transações (-22%) e um aumento de 41% em seu capital mobilizado, em comparação com o mesmo período do ano passado”, diz.
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Por outro lado, o segmento de capital de risco (VC) continua fraco na região, o que se traduz em menor disponibilidade de recursos para as startups latino-americanas .
De acordo com os analistas da TTR Data, um total de 485 transações de capital de risco (-18%) com um valor agregado de US$ 4.432 milhões (-10%) foi registrado até novembro .
O caso Rappi

No caso da Rappi, a plataforma ganhou as manchetes em setembro, quando foi noticiado que a gigante do comércio eletrônico Amazon (AMZN) comprou uma participação na empresa.
A Rappi, que conta com o apoio do SoftBank, Sequoia Capital e T. Rowe Price, recebeu um investimento de US$ 25 milhões da Amazon com a opção de adquirir até 12% da empresa por meio de bônus de subscrição, a Bloomberg informou.
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A aliança dá à Rappi o apoio do maior varejista digital da América do Norte e a capacidade de aproveitar sua infraestrutura de logística e serviços em nuvem.
Em novembro, a Amazon lançou um serviço de entrega de 15 minutos para o México, conhecido como Amazon Now, em parceria com a Rappi.
Ele explicou que os clientes podem acessar o Amazon Now e o Rappi Restaurants diretamente do aplicativo da Amazon ou do site Amazon.com.mx.
O serviço inclui entregas de mais de 5.000 produtos essenciais em 10 grandes cidades, incluindo Cidade do México, Guadalajara e Monterrey.
“Graças à colaboração com a Amazon, os restaurantes agora poderão expandir sua base de clientes”, disse Ivan Cadavid, CEO da Rappi no México, em um comunicado.
Em agosto, a Rappi obteve um empréstimo de US$ 100 milhões do Banco Santander e da Kirkoswald Capital Partners para impulsionar sua expansão na América Latina.
A linha de crédito sênior garantida de quatro anos apoiará as necessidades de refinanciamento e capital de giro, à medida que a Rappi busca expandir-se no competitivo mercado de entregas da região, disse a empresa em um comunicado.
Panorama para 2026
Mariano González Vasconcelos, sócio geral da MGV Capital, diz que os balanços patrimoniais que atrairão capital em 2026 serão aqueles que demonstrarem disciplina, transparência e uma história consistente entre crescimento e lucratividade.
“Veremos mais apetite por empresas com receitas recorrentes, margens estáveis e uma estrutura de capital equilibrada”, disse ele.
Ele também disse que as equipes que entendem que levantar capital é uma consequência da boa execução, e não uma meta em si, serão fundamentais. “Os investidores estão buscando menos apostas e mais convicção.
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Em 2026, “o capital não recompensará aquele que gritar mais alto, mas sim aquele que não precisar gritar para sobreviver“, de acordo com Fernando Pontaza, do Fundo Invariantes.
Essas são empresas que, embora ainda sejam privadas, já operam de acordo com os padrões do mercado aberto.
Isso não significa ser imediatamente lucrativo, mas demonstrar controle financeiro, flexibilidade estratégica e métricas confiáveis, de acordo com o analista.
Fernando Pontaza resumiu o que ele considera serem os fatores que atrairão mais capital em 2026:
- Pista de pouso real de 12 a 24 meses com queima controlada e alavancas claras para reduzir se o mercado fechar.
- Ampliação da margem e clareza sobre como a lucratividade é obtida por unidade, e não apenas por escala.
- Baixa fragilidade financeira, baixa alavancagem, risco de crédito medido, capital de giro sob controle.
- Governança e relatórios no nível de uma empresa pronta para o mercado aberto, com auditorias formais, indicadores claros e consistentes e sem ajustes contábeis discricionários.
- Um caminho claro e confiável para a liquidez, porque o mercado já avalia como as empresas estão prontas: o benchmark continua sendo um nível próximo a US$ 300 milhões em receitas e a conformidade com a Regra dos 40 (a soma da taxa de crescimento da receita anual mais a margem de lucro deve ser igual ou superior a 40%), um limite que apenas uma minoria atinge.
- Captura de valor da IA: embora a IA continue a capturar dólares, o mercado se tornará mais seletivo nesse segmento. “Se a empresa depender de capital barato para subsidiar a operação, o risco de múltiplos inflacionados e correções aumenta”, disse Pontaza.
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