Procura por jatos maiores muda o perfil da aviação executiva no Brasil, diz Citi

Em entrevista à Bloomberg Línea, Michael Francis, especialista do Citi, e Fernando Fleury, head do Citi Private Bank para o Brasil, explicam as razões por trás do aumento da demanda por jatos privados no país; Brasil é o segundo maior mercado do mundo

Global 7500, jato da Bombardier
22 de Agosto, 2025 | 06:00 AM

Bloomberg Línea — O mercado de aviação executiva no Brasil passa por uma fase de expansão, impulsionado pelo crescimento econômico e pela internacionalização de empresas e famílias do país, o que também tem mudado o perfil da frota brasileira de jatos privados.

Tradicionalmente composto por aeronaves menores voltadas para voos domésticos, o setor está evoluindo com o aumento da procura por jatos com autonomia para distâncias mais longas, segundo dois profissionais do Citi que atuam com o segmento.

PUBLICIDADE

O desenvolvimento de setores como a agricultura e a indústria e a crescente participação do Brasil nos mercados internacionais têm demandado aeronaves maiores para alcançar destinos estrangeiros.

“A quantidade de aviões maiores está se tornando uma representação maior da frota total”, disse Michael Francis, head global de Aircraft Financing do Citi, à Bloomberg Línea.

Leia mais: Catarina, aeroporto da JHSF, atrai ultrarricos de olho em ‘triângulo do luxo’

PUBLICIDADE

No ano passado, a frota brasileira de jatos superou pela primeira vez a marca de 1.000 unidades. No primeiro semestre, o número de jatos aumentou 6% para 1.075 em junho na comparação com dezembro (1.013). Foram 62 adições em seis meses.

De janeiro a junho, as novas matrículas por categoria incluíram 39 jatos leves, 17 médios e 6 pesados. Os dados são da Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral) citando como fontes a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e o RAB (Registro Aeronáutico Brasileiro).

Por trás da mudança do tipo de aeronave demanda, está também uma diversificação do perfil dos compradores de jatos privados, segundo o head do Private Bank para o Brasil, Fernando Fleury, que também participou da entrevista.

PUBLICIDADE

Historicamente, segundo ele, o mercado era limitado a poucos indivíduos, mas agora há mais pessoas gerando riqueza e sendo capazes de acessar esses mercados.

Além disso, ele vê um movimento de internacionalização entre famílias brasileiras e de um número crescente de empresas que ultrapassam as fronteiras nacionais e buscam oportunidades em mercados fora do país.

“Cada vez mais, vemos filhos de brasileiros estudando no exterior, morando em casas nos Estados Unidos, na Europa e em outros países. Paralelamente, as empresas brasileiras também estão se expandindo globalmente”, disse Fleury.

PUBLICIDADE

Essas tendências demandam maior mobilidade dos executivos para viagens internacionais, pois exigem que os empreendedores estejam presentes fisicamente nesses países, para acompanhar operações, estabelecer parcerias e entender melhor os mercados locais.

Segundo maior mercado do mundo

O Brasil ocupa uma posição de destaque no cenário mundial da aviação executiva. O país é o segundo maior mercado de aviões privados em todo o mundo, segundo Francis, o que já o torna único em relação aos demais países da região.

O México também figura entre os maiores mercados, mas o Brasil mantém sua posição consolidada como vice-líder global.

Leia mais: Líder Aviação firma parceria com Beta Technologies para aeronaves elétricas no Brasil

Em junho, a aviação executiva do Brasil era composta por 10.940 aeronaves, principalmente turboélices (2.178 unidades ou 20% do total), com motor a pistão (6.084 ou 56%), helicóptero a turbina (1.363 ou 12%), jato (1.075 ou 10%) e helicóptero a pistão (240 ou 2%).

Um aspecto particularmente distinto do mercado brasileiro é sua frota de helicópteros. “O Brasil tem uma das maiores frotas de helicópteros do mundo”, diz Francis, acrescentando que “há mais helicópteros em São Paulo do que há em Nova York”.

A geografia brasileira também é um fator fundamental que influencia a demanda por aviação executiva. Francis explica que, comparando com os Estados Unidos - país com uma extensão similar -, há uma grande disparidade na infraestrutura de transporte aéreo comercial, como o déficit de aeroportos.

Essa limitação da aviação comercial cria uma demanda natural por aeroportos privados. Para muitos empresários e executivos, é preciso ter seu próprio avião para viajar de forma eficaz, observa Francis.

Quanto à sensibilidade do setor aos ciclos econômicos, Francis demonstra otimismo baseado no que tem observado do mercado. O especialista se mostra “impressionado” com a quantidade de demanda dos clientes em pedidos de financiamento. “A demanda “não tem desacelerado em nenhum momento no curso do ano”, afirmou.

O financiamento das aeronaves apresenta características específicas no mercado brasileiro. Para aviões maiores, na maioria dos casos, o financiamento é em dólares. Este modelo se adequa ao perfil dos clientes, que “já pensam em dólares, porque eles têm um negócio internacional, uma família internacional”, segundo Fleury.

A instabilidade cambial, que no início de 2025 levou o dólar ao pico de R$ 6,30, não tem representado obstáculo significativo para o setor. “Não tivemos nem vimos nenhuma diminuição na demanda por causa do que aconteceu com o dólar em reais”, disse Fleury.

Mineração e agronegócio

A aviação executiva está se tornando fundamental para setores estratégicos da economia brasileira. Para mineração e agricultura em regiões remotas, a aviação privada “é essencial”.

Como explica Francis, quando as aeronaves comerciais não oferecem conectividade, “você precisa de um avião ou um helicóptero para chegar lá oficialmente e operar aquele negócio”.

O setor agrícola, em particular, demonstra forte demanda, o que reflete a importância crescente do agronegócio na economia brasileira.

Em junho, em entrevista à Bloomberg Línea, Michael Anckner, VP Global da Bombardier para Seminovos, Frota, Defesa e América Latina, citou o agronegócio como um dos principais motores de crescimento de vendas de jatos no Brasil.

A saúde do mercado pode ser avaliada através do backlog dos fabricantes. “O backlog significa as ordens que os fabricantes têm, em comparação com o quão rápido eles podem entregá-las”, disse Francis.

Este indicador “permaneceu bastante consistente nos últimos anos”, demonstrando que “há tanta demanda para novos helicópteros” que os clientes estão “dispostas a esperar alguns anos para a entrega”, segundo o head global para financiamento de aeronaves.

A fila de espera na entrega de jatos é considerada um gargalo na indústria aeronáutica.

“Temos um grande problema na indústria. Estamos com uma fila de espera hoje que, em algumas categorias e modelos, chega a três anos”, afirmou o presidente da Abag, Luiz Carlos Corrêa Carvalho, em entrevista durante a Labace, feira de aviação executiva realizada no Aeroporto Campo de Marte, em São Paulo, entre os dias 5 a 7 de agosto.

Carvalho destacou que, nos últimos 12 meses, a frota de jatos cresceu quase 20% no Brasil, evidenciando o ritmo acelerado de expansão nessa categoria.

“No final de 2024, ultrapassamos o número mágico de mil jatos, enquanto o México contava com cerca de 950 aeronaves”, comparou o presidente da Abag.

Além dos jatos, Carvalho também ressaltou o desempenho consistente dos turboélices, que vêm mantendo crescimento de dois dígitos há algum tempo.

“A turboélice sempre foi um avião muito bem adaptado ao Brasil, tem essa faculdade de poder pousar em pista não pavimentada. É o avião do agro, pois o país tem muita pista que não é asfaltada nem iluminada”, disse.

Leia também

Shops Faria Lima a health center: JHSF avança em ecossistema de alta renda, diz CEO

Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 30 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.