Mobly cita provas documentais de conluio em OPA; família da Tok&Stok nega

Investigação interna do Grupo Toky aponta prejuízo a acionistas minoritários com suposto acerto prévio da família Dubrule com acionistas europeus da home24, disseram fontes à Bloomberg Línea

Mobly e Tok&Stok estão entre as maiores empresas de móveis e decoração do Brasil, com atuação mais destacada em canais digitais e em lojas físicas, respectivamente (Foto: Montagem/Divulgação)
22 de Abril, 2025 | 08:18 PM

Bloomberg Línea — O mercado brasileiro testemunha um dos maiores conflitos corporativos de sua história.

A fusão entre Mobly (MBLY3) e Tok&Stok, anunciada em agosto do ano passado, transformou-se em uma “novela jurídica”, com troca de acusações entre acionistas e investidores e disputa de desfecho incerto pelo controle do Grupo Toky, criado a partir da união entre as duas companhias.

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Nesta terça-feira (22), o litígio escalou para as esferas da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), do Ministério Público Federal e da Justiça, disseram duas pessoas com conhecimento da situação, que pediram anonimato à Bloomberg Línea, pois não têm autorização para tratar do tema em público.

O Grupo Toky, sob o comando do CEO Victor Noda, teria encontrado “indícios” de conluio, fraude, insider trading e manipulação de mercado na tentativa da família Dubrule, fundadora da Tok&Stok, de realizar uma OPA (oferta pública de aquisição de ações) para adquirir a fatia do grupo austríaco XXXLutz, controlador da alemã Home24, que detém 44,3% do capital, segundo as pessoas ouvidas pela Bloomberg Línea.

A família Dubrule negou quaisquer irregularidades em nota enviada à Bloomberg Línea.

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“Tudo o que temos a dizer no momento é que nossa OPA está obviamente mantida. A série de chicanas dos administradores para tumultuar o processo e criar obstáculos artificiais indica para nós que estamos no caminho certo”, disse o casal Ghislaine e Régis Dubrule na nota à Bloomberg Línea.

Pela manhã, a Mobly informou em fato relevante ao mercado ter realizado uma investigação interna e identificado “indícios de atuação coordenada e não divulgada ao mercado” entre membros dos Dubrule, representantes do Grupo XXXLutz e a controlada Home24, em “condições diversas àquelas divulgadas pelos ofertantes no edital da OPA”. Não houve detalhamento do que seriam esses indícios.

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A Lefosse Advogados assessora o Grupo Toky - nome da empresa resultante da aquisição da Tok&Stok pela Mobly -, enquanto a família Dubrule contratou a Spinelli Advogados.

O conselho de administração do Grupo Toky (Mobly) autorizou a companhia de “tomar as medidas cabíveis nas esferas administrativa, cível e criminal”, disse a empresa no fato relevante.

Ainda de acordo com esse documento mais cedo, a companhia pedirá o cancelamento da OPA junto à CVM e a apuração de responsabilidades dos envolvidos.

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O leilão da OPA está marcado para o dia 15 de maio, com o preço fixado no edital de R$ 0,68 por ação.

Antes, na quarta-feira da semana que vem (30), está prevista uma Assembleia Geral Ordinária (AGO) em que os acionistas devem avaliar a proposta do acionista majoritário (Home24) de retirada da cláusula de poison pill (mecanismo de proteção de acionistas minoritários contra aquisição hostil) do estatuto.

Acionistas também devem votar pela manutenção ou exclusão de uma cláusula de proteção a credores, igualmente defendida pelos fundadores da Tok&Stok e pela Home24.

Mobly: prejuízo a minoritários

A investigação interna da Mobly encontrou, segundo as pessoas ouvidas pela Bloomberg Línea, “provas documentais” de que membros da família Dubrule teriam um acordo de exclusividade com o grupo XXXLutz na aquisição das ações detidas pela Home24 na Toky.

E também que teria ocorrido um pagamento no exterior ao controlador por um preço dez vezes acima do valor fixado por ação no edital da OPA - de R$ 0,68 -, o que evitaria o pagamento de prêmio aos minoritários no Brasil, segundo as pessoas.

Esse pagamento é obrigatório justamente em razão da cláusula de poison pill vigente, mas que os franceses pedem para que seja excluído do estatuto da companhia.

Uma operação de 5 milhões de euros para a compra dos papéis da Mobly, fora da OPA, também foi citada pelas pessoas ouvidas pela Bloomberg Línea como estratégia para “prejudicar acionistas minoritários” e garantir a venda do controle da companhia para os fundadores da Tok&Stok.

Leia mais: Mobly planeja levar Tok&Stok a marketplace e dividir área de lojas físicas, diz CEO

Família Dubrule aponta ‘campanha infundada’

A família Dubrule disse lamentar “a campanha infundada, desesperada e sem quaisquer limites éticos movida pela administração da Toky” e defendeu que sua proposta de OPA segue as normas do país.

“Os administradores demonstram mais uma vez estar claramente tentando fugir a suas obrigações fiduciárias junto à companhia de submeter ao conjunto dos acionistas uma proposta apresentada em acordo com todas as leis e regulamentos aplicáveis”, afirmou a nota dos fundadores da Tok&Stok.

Segundo os Dubrule, na mesma nota, a proposta “dá liquidez a acionistas hoje sem horizonte para vender suas participações e sem motivos para ter esperança no futuro da empresa”.

Com a conclusão da fusão entre Mobly e Tok&Stok em novembro passado, houve o início do processo de integração dos sistemas de tecnologia das duas empresas.

Na prática, isso significou à direção da Mobly - depois Grupo Toky - acesso aos e-mails corporativos de executivos que passaram pela Tok&Stok, segundo as duas pessoas ouvidas pela Bloomberg Línea. As ações distribuídas hoje às autoridades devem correr sob segredo de Justiça.

Na Mobly, as expectativas de evolução do caso incluem alternativas como a possibilidade de a CVM suspender a assembleia geral ordinária da próxima semana, a retirada da proposta de exclusão do poison pill da pauta e o cancelamento da OPA - nos cenários de obtenção de uma decisão favorável do órgão regulador aos relatos indicados pela investigação interna, de acordo com as pessoas.

Além do casal fundador da Tok&Stok, a investigação da Mobly sobre a OPA, enviada às autoridades, cita o irmão de Régis, Paul Dubruly, Claude-André Pierre Deschamps, responsável pelo family office, e Bertrand Lefort, interlocutor da família na XXXLutz, segundo as pessoas.

A ação da Mobly fechou em alta de 10,58% nesta terça-feira, cotada a R$ 1,15, o que reduziu a perda acumulada no ano para cerca de 23%.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.