Indústria náutica vê impacto de 30% na exportação de lanchas e iates com tarifas

Mercado americano é o principal destino de vendas de estaleiros instalados no Brasil, tendo gerado receita de US$ 41 milhões em 2024, o equivalente a cerca de 60% dos embarques

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Bloomberg Línea — Estaleiros brasileiros projetam uma redução de mais de 30% nas exportações de embarcações, principalmente lanchas e iates, para os Estados Unidos em razão da aplicação de tarifas de 50% a partir de 1º de agosto, caso não haja uma mudança de última hora do governo de Donald Trump.

O setor náutico mantém conversas com entidades do setor produtivo e autoridades na tentativa de reverter a medida anunciada no último dia 9 de julho.

Em 2024, o Brasil exportou US$ 68,8 milhões em embarcações, o que representou aumento anual de 10%.

O mercado americano foi o principal destino, responsável por 60% da receita (US$ 41,3 milhões), segundo dados enviados à Bloomberg Línea pela Acobar (Associação Brasileira dos Construtores de Barcos e Seus Implementos).

A entidade que representa o setor estimou impacto de “mais de 30%”nas exportações com a potencial tarifa norte-americana de 50%.

No ano passado, foram produzidos 4.500 barcos pela indústria náutica no Brasil, sendo que o equivalente a 10,8% (484 unidades) foi exportado para diferentes destinos, principalmente para clientes americanos.

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Feiras náuticas em cidades da Flórida, como Miami, Palm Beach e Fort Lauderdale, costumam expor embarcações brasileiras, que apresentam preços competitivos devido aos incentivos fiscais e ao menor custo de produção.

“Estamos em contato com Amcham [Câmara Americana de Comércio para o Brasil], CNI [Confederação Nacional da Indústria], Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo] e governo federal para reverter essa tarifa de 50%“, disse Eduardo Colunna, presidente da Acobar, à Bloomberg Línea.

Neste ano até maio (último dado disponível), as exportações brasileiras de embarcações totalizaram US$ 25,8 milhões, uma redução de 22% na comparação com igual período de 2024 (US$ 20,1 milhões).

Nos cinco primeiros meses deste ano, os EUA responderam por48% do valor total dos embarques realizados por estaleiros instalados no Brasil, fatia inferior à participação (53%) em igual intervalo do ano passado.

“Infelizmente, as tarifas americanas afetam o mercado de iates produzidos no Brasil”, disse o CEO da Azimut Yachts Brazil, Francesco Caputo, em conversa com a Bloomberg Línea em abril, quando já havia a expectativa da taxação.

A operação brasileira da italiana Azimut tem como base a região Sul, onde produz embarcações em Itajaí, litoral de Santa Catarina, que concentra diversos estaleiros.

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A tarifa dos EUA contra os bens produzidos no Brasil ocorre em um momento desafiador para os estaleiros, que sofrem com um maior pressão dos custos devido às bruscas oscilações cambiais desde o ano passado.

“Estamos vivendo uma época extremamente difícil, porque as oscilações cambiais são extremamente pesadas e repentinas. Meu custo é em euro”, afirmou Caputo, que lembrou que o euro valorizou 19,5% ante o real em 2024.

Em geral, o setor náutico aplica dois reajustes aos preços dos barcos — um no primeiro trimestre e outro no terceiro. Com a instabilidade cambial, essa regra foi deixada de lado neste ano, segundo o executivo.

“Os reajustes estão sendo cada vez mais frequentes para tentar lidar com essa situação. Imagina se você perde 20% de sua margem: você não ganha mais nada”, observou Caputo.

Retomada para Argentina

O repasse da alta dos custos para os clientes não tem sido integral, segundo o CEO da Azimut Yachts, porque não há intenção de derrubar a demanda.

“Estamos repassando um pouco dessa alta de custos, porque não queremos chocar o mercado com um aumento de 20% do dia para a noite”, explicou.

Há, no entanto, uma novidade encorajadora para os estaleiros instalados no Brasil: a recuperação das exportações para a Argentina, um mercado mais próximo de Santa Catarina, estado considerado o coração da indústria náutica brasileira.

“A Argentina está sendo um vento positivo. Depois de muitos anos, voltamos a ter um representante da Azimut no país vizinho e já fechamos entrega”, disse Caputo.

Um negócio já fechado foi a venda do modelo Azimut 62 por R$ 18,9 milhões para um cliente não identificado, que marcou a retomada das vendas do estaleiro para o país vizinho após um hiato de décadas.

“Havia barreiras da Argentina. A troca de pesos para dólares não era autorizada, embora não houvesse proibição formal para exportar para o país. Mas, na prática, antes a Câmara de Comércio não autorizava a compra de divisa [por clientes potenciais] para adquirir a embarcação”, explicou.

O fim do controle cambial sobre o dólar foi anunciada em abril pelo presidente argentino Javier Milei.

“A situação na Argentina ainda está longe de ser maravilhosa, mas começar a vender para o país representa uma grande satisfação devido ao potencial interessante. O mercado argentino tem uma história muito grande na náutica. É só ver a grande quantidade de embarcações em Buenos Aires.”

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