Guerra do delivery: Rappi aposta em taxa zero e novo app para ganhar mercado

Plataforma colombiana mira nova fase no Brasil com política agressiva de taxas para atrair restaurantes e usuários e redesenho do aplicativo até com funcionalidades de redes sociais, segundo contou o CEO Felipe Criniti à Bloomberg Línea

A empresa colombiana de entregas é uma das startups mais valiosas da América Latina e busca ganhar market share
29 de Maio, 2025 | 08:35 AM

Bloomberg Línea — Na guerra dos aplicativos de delivery no Brasil, a Rappi também decidiu fazer a sua ofensiva com investimento igualmente bilionário.

A startup colombiana passou a adotar uma política de taxa zero da sua parte para bares e restaurantes desde o dia 5 de maio e por três anos, dentro de um plano de retomada no país que conta com investimentos de R$ 1,4 bilhão até 2028.

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E começa a oferecer uma nova taxa de entrega aos entregadores a partir desta sexta-feira (30).

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A plataforma é a principal concorrente do iFood, ainda que detenha menos de 10% de participação no mercado brasileiro de entregas.

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Ao longo dos últimos anos, problemas de usabilidade do aplicativo e falhas no atendimento, além de taxas de entrega em geral mais elevadas, fizeram com que a startup perdesse espaço.

A redução das taxas é um dos caminhos escolhidos pela empresa para tentar atrair mais estabelecimentos para a plataforma, ao mesmo tempo em que busca mais usuários, com a promessa de preços mais baixos e uma nova experiência.

Segundo a Rappi, a contrapartida exigida é que o restaurante cobre preços mais próximos aos oferecidos no seu balcão e no seu salão.

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“Vamos imaginar que um prato custe R$ 73 no balcão do restaurante. Antes da tarifa zero, como a média do valor cobrado pelo mercado de delivery era de cerca de 27% de taxa de intermediação total, o restaurante precisava subir o preço para cerca de R$ 100 no app para não sair no prejuízo”, disse Felipe Criniti, CEO da operação brasileira da Rappi.

Os investimentos chegam em um momento em que o mercado de delivery de refeições no Brasil começa a ficar mais competitivo.

A gigante chinesa de tecnologia DiDi, controladora da 99, começou a investir R$ 1 bilhão para colocar a 99Food de volta ao mercado, enquanto a sua “compatriota” Meituan, líder no mercado da segunda maior economia do mundo, prevê destinar R$ 5,6 bilhões para competir no Brasil a partir da bandeira Keeta.

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Segundo Rocio Franco, consultora sênior de pesquisa na Euromonitor International, existe hoje um clima de tensão no mercado de alimentação, com operadores de restaurantes pressionados pela dependência e pelas taxas das plataformas.

“Muitas vezes, eles [operadores de restaurantes] não conseguem repassar esses custos ao consumidor final devido à forte concorrência”, afirmou.

Esse novo contexto, por sua vez, “abre espaço para a entrada de novos players que ofereçam condições mais vantajosas ou modelos de negócio mais flexíveis para os restaurantes.”

Felipe Criniti, CEO da Rappi no Brasil: plano para acelerar o ganho de escala (Foto: Divulgação)

A 99Food, com operação prevista para começar neste mês em Goiânia, também adotou a estratégia de isenção de taxas para ampliar as adesões de estabelecimentos para plataforma, com a retirada de comissões e eventuais mensalidades. As taxas de delivery foram reduzidas para 4,5%.

Em simulação de um pedido de refeição de R$ 100,00 enviado à Bloomberg Línea, a Rappi disse que somente seria cobrada a taxa de pagamento, equivalente a 3,50% - ou seja, R$ 96,50 ficariam para o estabelecimento.

No caso da 99Food, a plataforma cobra uma taxa delivery de 4,5% + 3,2% transação de pagamento. No exemplo, o restaurante ficaria com R$ 92,30.

O setor convive hoje com taxas somadas que vão de 18% a 30%, segundo Paulo Solmucci, presidente da Abrasel, associação de bares e restaurantes no país.

“A vertical de alimentos é a porta de entrada para as demais, o que abre espaço, na nossa visão, para que essas taxas zero possam até se perpetuar para o setor ou que possam existir taxas muito mais baixas do que as atuais”, disse Solmucci.

Destinação dos recursos

Do total anunciado pela Rappi, 40% serão direcionados para a frente de delivery de alimentos.

A modalidade denominada Rappi Turbo, de entregas consideradas “ultrarrápidas”, em geral de até 10 a 15 minutos, consumirá 22%; e os 38% restantes serão investidos em eficiência operacional, tecnologia e melhorias na experiência do usuário.

Segundo Criniti, o plano vem sendo desenhado desde novembro de 2024 e não é uma resposta pontual ao aumento da concorrência neste ano.

“É uma estratégia robusta de longo prazo. Seguimos operando no Brasil desde 2017, mesmo quando outros players recuaram. Nosso compromisso é com o mercado local”, afirmou o executivo, que chegou à Rappi a partir da compra da Box Delivery, especializada na entrega na última milha - last mile - em 2023.

As ações adotadas no Brasil estão conectadas com o que a empresa tem chamado globalmente de “nova Rappi”, plano apresentado em dezembro passado na Colômbia e introduzido em outras geografias relevantes na sequência.

“Trata-se da maior atualização do aplicativo desde sua criação, com foco em usabilidade, eficiência e interatividade. Reestruturamos toda a jornada do usuário, incorporamos inteligência artificial para personalizar buscas e sugestões e redesenhamos o app com funcionalidades mais intuitivas”, contou Criniti.

Na remodelagem, o app ganhou ainda atributos “sociais” que permitem que usuários sigam amigos, influencers e chefs para acompanhar recomendações e descobertas gastronômicas. Uma nova aba de ofertas foi criada, e o Rappi Turbo, ampliado, com lojas em operação por 24 horas.

Como a conta se paga

Ao optar por um modelo de taxa zero por três anos, incluindo todos os restaurantes presentes na plataforma até 31 de julho, a Rappi deixará de receber uma receita considerável. Mas, segundo o CEO, a iniciativa vai ajudar a fortalecer toda a cadeia de valor da empresa.

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“A vertical de restaurantes é a nossa principal porta de entrada para novos usuários no app — cerca de 80% chegam por meio dela. E o que é mais interessante: 32% desses usuários fazem cross-sell e passam a comprar em outras categorias, como supermercado, farmácia, bebidas e Rappi Turbo”, disse. “O modelo se sustenta no ganho de escala.”

A aposta é que a combinação entre o modelo de taxa zero, a melhora na experiência do usuário e a diversificação das verticais torne a Rappi mais relevante em um mercado cada vez mais competitivo.

A empresa, que hoje opera em mais de 50 cidades brasileiras, pretende chegar a mais de 300 municípios até 2028 como parte da nova fase de expansão.

Fechar essa equação será essencial para os planos globais da companhia. Em recente entrevista à Bloomberg Línea na Colômbia, o co-fundador e CEO global, Simón Borrero, afirmou que levar a startup à abertura de capital nos próximos anos segue nos planos, embora não seja um foco imediato.

O co-fundador da Rappi, juntamente com Sebastián Mejía e Felipe Villamarín, disse que a empresa tem testado o timing do mercado. Os executivos estão à espera da próxima reabertura de janela para IPOs para empresas latino-americanas de tecnologia, projetada por eles quem sabe para o fim de 2026.

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Marcos Bonfim

Jornalista brasileiro especializado na cobertura de startups, inovação e tecnologia. Formado em jornalismo pela PUC-SP e com pós em Política e Relações Internacionais pela FESPSP, acumula passagens por veículos como Exame, UOL, Meio & Mensagem e Propmark