Bloomberg Línea — “Impossível.”
Iuri Miranda diz que essa foi a palavra que mais ouviu, inclusive de fornecedores importantes de carne, por exemplo, quando fez há mais de uma década reuniões para apresentar os planos então ambiciosos de expansão do Burger King no Brasil. Os planos incluíam a abertura de 900 unidades ou pontos de venda nos anos seguintes. Nem o McDonald’s em mais de 30 anos de país tinha isso.
A operação acabava de ganhar nova direção por meio de um plano de investimento conjunto da matriz - recém-adquirida pela 3G Capital de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira - em sociedade com a Vinci Partners. Com o tempo, em mais de uma década, a rede superou a marca das 950 unidades.
Passados 14 anos do seu começo com o Burger King no país, Miranda está de volta ao mercado de fast food com novos planos igualmente ambiciosos, desta vez com a rede americana Firehouse Subs, especializada em carnes com cortes especiais, como brisket, pastrami e rosbife, entre outros.
A projeção é abrir 500 unidades em dez anos, entre lojas próprias e de franqueados. O investimento inicial é estimado em R$ 200 milhões em três anos. Ele disse que não só não ouviu a palavra “impossível” como sua convicção de sucesso tem sido acompanhada por quem já conhece o seu track record.
A primeira unidade abre nesta segunda-feira (2) no Internacional Shopping Guarulhos, em localização “escolhida a dedo” do ponto de vista de fluxo de pessoas, demanda e presença das classes A, B e C1, o público-alvo. Até o fim do ano serão mais quatro unidades, todas em shoppings na Grande São Paulo (veja mais abaixo).
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Miranda está de volta com velhos conhecidos: a 3G Capital, desta vez por meio de sociedade com a RBI (Restaurants Brands International), holding que nasceu a partir da fusão do Burger King com a canadense Tim Hortons em 2014. O Popeyes e a Firehouse Subs são as duas outras empresas do grupo.
“Eles me procuraram e eu viajei para os Estados Unidos para estudar a fundo o modelo. Quando acabei, sentamos e eu disse que só entraria no negócio se certas condições para a operação no Brasil fossem atendidas”, disse Miranda, CEO da Firehouse Subs Brasil (FHB), em entrevista à Bloomberg Línea.
Naquele momento, Miranda havia se desligado totalmente da Zamp - empresa que passou a abrigar a BK Brasil - ao deixar o conselho de administração em março de 2024. Pouco mais de um ano antes, no início de 2023, ele havia dado passagem a Ariel Grunkraut como CEO, como parte de um plano de sucessão.
Entre as condições à RBI, ter acesso às receitas para desenvolver de forma local o cardápio pensado no gosto do brasileiro, com ingredientes do país, a fim de evitar a exposição ao câmbio e conseguir praticar preços alinhados ao mercado.
Do brisket ao patrami, passando por salames, presunto com mel, frango com lemon pepper, quase tudo - exceto a batata - foi desenvolvido pela operação no Brasil, sob a liderança do chef alemão Thomas Heitz, que veio doze vezes ao país no processo de pesquisa, experimentação e testes com consumidores.

Outra condição foi poder trazer para a operação executivos de sua confiança com quem já havia trabalhado.
Um deles é William Giudice, o COO (Chief Operating Officer), que ocupou o mesmo cargo na BK Brasil, além de ter comandado as áreas de Expansão e Franquias - ele foi mais recentemente CEO da Subway no Brasil. Moacir Bastos, que liderou a área de expansão da Oxxo no país, é o CDO (Chief Development Officer).
Miranda também pediu - e conseguiu - acesso a 100% das especificações técnicas dos equipamentos industriais de cozinha, como máquinas de cocção para o preparo das carnes. O objetivo foi evitar o custo de importação com impostos e câmbio.
Não menos importante, ele também teve autonomia para definir a estratégia de abertura das primeiras unidades, todas em shoppings, diferentemente do padrão de lojas de rua da Firehouse Subs no mercado americano.
“Não faltam casos de redes estrangeiras que chegam ao Brasil e abrem a primeira unidade na Faria Lima ou no Itaim. Pagam uma fortuna pelo ponto. E depois fecham, porque têm um negócio que não paga o aluguel e uma marca pouco conhecida pelo público”, disse Miranda.
‘Do metrô à universidade’
Segundo ele, o plano é semelhante ao que foi executado de forma bem-sucedida pelo Burger King: expansão inicial em shopping, para atingir de 80% a 90% de brand awareness, e só então partir para restaurantes em ruas.
Em um primeiro momento, não haverá campanha agressiva de marketing, em razão da abertura gradual de unidades: “não faz sentido gastar tanto em campanha se não posso atender todo mundo.”
O plano de expansão já está desenhado, com todos os shoppings mapeados, do tier 1 ao tier 5, e as aberturas previstas a cada ano, com ocupação de área padrão em praça de alimentação - “para não ter que ficar negociando uma área e meia” - e 100% de digitalização dos pedidos por meio de totens.
“É um formato altamente escalável, porque ocupa um espaço que não comporta um Burger King e um McDonald’s. Funciona em uma estação de metrô, em uma universidade ou na rodoviária, por exemplo”, disse o executivo.
Miranda disse que o retorno do investimento previsto para um restaurante é de cerca de três anos, com capital alocado de R$ 1 milhão a R$ 1,5 milhão por unidade, com tempo e valores mais baixos do que para equivalentes de Burger King e McDonald’s. “É uma operação muito menos complexa, e a nacionalização dos equipamentos ajuda a reduzir os custos.”
O avanço do conhecimento de marca remete ao desafio enfrentado pelo Burger King quando assumiu o comando da operação no país em 2011, ainda que a rede tivesse um apelo maior do que o da Firehouse Subs hoje, como ele próprio admite. “Hoje ninguém conhece a rede.”
Naquele momento, embora já estivesse presente no Brasil com franqueados desde meados dos anos 2000, o Burger King não só não havia decolado no país como ainda enfrentava o desafio de se tornar conhecida de verdade pelos brasileiros.
“Quando entramos, o nível de conhecimento da marca era inferior a 50% no país. Nas pesquisas que fazíamos, mostrávamos o Burger King e menos da metade das pessoas dizia que conhecia”, contou.
“Hoje é 100% de conhecimento, assim como o McDonald’s.”
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A experiência e os aprendizados à frente do Burger King no país também foram mencionados pelo executivo ao explicar o espaço do mercado de alimentação fora do lar que ele espera ocupar com a Firehouse Subs.
“Diziam que na praça de alimentação de shopping só havia espaço para uma rede de hambúrguer. Nós provamos que o mercado era muito maior do que as pessoas achavam e que não era um jogo de ‘soma zero’”, disse o executivo, citando os números de expansão das duas redes desde então.
Em meados de 2011, o Burger King tinha cerca de cem lojas no país, todas por meio de franquias, e o McDonald’s, cerca de 630. Hoje a BK Brasil tem quase 960 unidades no país, enquanto o seu concorrente direto tem 1.180, de acordo com dados do primeiro trimestre de 2025.
Aposta no sanduíche
Mas é principalmente nas características e no tamanho do mercado brasileiro de fast food, estimado em R$ 135 bilhões, citando dados da Euromonitor International, que o CEO da Firehouse Subs Brasil disse apostar.
“Desse mercado, cerca de um terço é de sanduíches e padarias - não entra hambúrguer -, segmento no qual a Firehouse Subs compete, o que dá perto de R$ 40 bilhões. E só uma empresa é de marca, com rede: o Subway, que tem 2%. O resto é de independentes”, afirmou Miranda.
Ele disse antever evolução semelhante à que ocorreu no mercado de hambúrguer com a expansão do Burger King, em que as redes de marca ganharam market share na esteira de ganhos de escala com fornecedores e preços competitivos - o que ele disse que a nova rede vai praticar versus a concorrência.
Nos Estados Unidos, players de marca dominam, somados, mais de 50% do mercado de sanduíches e equivalentes, exceto hambúrguer.
Miranda disse apostar também, não por último, na qualidade do seu produto.
“Tudo isso que eu contei é importante. Mas não iria funcionar se os sanduíches não fossem gostosos, sem comparação com o que há no mercado”, defendeu.
Além dos cortes em si já citados, Miranda disse que o método de cocção utilizado pelos equipamentos garante uma textura às carnes que a chapa ou a grelha não oferecem.
Segundo Miranda, que não escondeu o entusiasmo com o novo projeto, a evolução do mercado brasileiro, em parte com impulso do próprio BK Brasil, torna a nova missão ainda mais factível de ser concretizada e em menos tempo.
“O crescimento do Burger King, que deu destaque para o hambúrguer grelhado, preparado na hora, aumentou o conhecimento das pessoas e abriu caminho, por exemplo, para a onda de hamburguerias gourmet que existem hoje”, disse.
“O plano de 500 unidades em dez anos é realista. Se você me perguntar, eu acredito que há espaço para mais de 500 lojas. Claro, vai depender da reação do público, mas é um plano mais escalável em menos tempo.”
Segundo ele, nos testes realizados com grupos de consumidores, nove em cada dez pessoas que provaram os sanduíches da Firehouse Subs disseram que comprariam se os preços forem “competitivos” em relação à concorrência.
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