Como as startups podem atrair mais capital em LatAm, segundo especialistas

O capital de risco captado no ano passado na América Latina chegou a US$ 2,85 bilhões, mas ainda está longe dos grandes volumes registrados em tempos de juros baixos

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26 de Maio, 2025 | 11:46 AM

Bloomberg Línea — A América Latina precisa reforçar o financiamento local, impulsionar a reinversão interna, acelerar sua integração com ecossistemas globais e promover mais ‘saídas’, se quiser continuar sendo um destino atrativo para o investimento em startups, em meio à incerteza causada pela guerra comercial.

Com a recuperação dos investimentos de capital de risco, as startups da região enfrentam um novo desafio: o aumento da aversão ao risco provocado pela guerra comercial entre Estados Unidos e China.

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Uma escalada nesse conflito, especialmente entre essas duas potências, pode redirecionar fluxos de investimento para mercados considerados mais seguros ou com menor exposição.

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“Se a região quiser manter sua atratividade, terá que avançar em duas frentes: fortalecer as fontes de financiamento local, para depender menos de choques externos, e fomentar a reinversão interna dos próprios sucessos do ecossistema”, disse à Bloomberg Línea Alfredo Castellanos, sócio-gerente da Glisco Partners, empresa especializada em Growth Equity.

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“Essa será a diferença entre resistir às mudanças ou aproveitá-las.”

Na opinião dele, um dos grandes desafios para o capital de risco em 2025 será navegar em um ambiente global cada vez mais incerto.

A combinação de volatilidade macroeconômica, tensões geopolíticas e a possibilidade de ajustes nas taxas de juros pode esfriar o apetite por ativos de risco, especialmente nas fases mais avançadas, onde o capital estrangeiro tem um papel central.

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O executivo da Glisco Partners explicou que a América Latina não está isenta desses desafios, embora tenha demonstrado uma resiliência notável, em parte graças à sua demografia jovem, ao crescimento do consumo digital e à capacidade de adaptação do ecossistema empreendedor.

Nesse contexto, a região enfrentaria o desafio de não retroceder nos avanços conquistados na última década como polo emergente do Venture Capital.

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“Para sustentar o interesse dos investidores globais, a região precisa ir além do storytelling de mercado com alto potencial e adotar práticas que já são padrão em ecossistemas mais maduros, como os dos EUA, Europa e sudeste asiático”, disse à Bloomberg Línea Iris Parra, cofundadora e diretora da Enlaza, organização que promove diversidade e equidade no ecossistema de capital de risco de impacto.

Integração global

A América Latina pode se tornar mais atrativa se acelerar sua integração com ecossistemas globais de empreendedorismo, incentivando mais fundos crossborder, soft landings e coinvestimentos com fundos internacionais.

Iris Parra, da Enlaza, considera isso essencial para evitar que a região “continue operando em um ambiente relativamente isolado”.

Ao citar dados do Crunchbase de 2024, ela afirmou que apenas 18% dos deals em 2023 na região contaram com coinvestimento de fundos globais de capital de risco, em contraste com 45% no sudeste asiático.

Também é considerado crucial modernizar as estruturas de investimento, pois, segundo Iris Parra, “muitos fundos ainda operam com veículos tradicionais pouco atrativos” para os Limited Partners (LPs), ou seja, os investidores institucionais que financiam os fundos de venture capital.

A adoção de modelos mais flexíveis como os evergreen ou opportunity funds, junto com uma maior especialização em verticais como climate tech, soluções focadas em saúde e bem-estar feminino e infraestrutura para serviços financeiros (fintech infrastructure), permitiria alinhar a região aos padrões globais.

Some-se a isso a necessidade de fomentar mais exits locais e intrarregionais, já que a falta de liquidez segue como um dos principais “gargalos”.

Por exemplo, em 2023, apenas 22 saídas “relevantes” de startups foram registradas na América Latina, em comparação com 85 no sudeste asiático e mais de 250 na Europa, refletindo um ecossistema menos dinâmico, segundo dados da Dealroom, base de dados global de empresas emergentes.

Além disso, é fundamental fortalecer a adoção de métricas ESG (ambientais, sociais e de governança) desde os estágios iniciais, tanto por parte dos fundos quanto das startups, e estabelecer relatórios regulares sobre seus impactos.

Segundo a Enlaza, atualmente 70% dos LPs priorizam critérios ESG, mas ainda são poucos os fundos na América Latina que reportam esse tipo de impacto de maneira estruturada.

Investimento de capital de risco na América Latina

O capital de risco captado no ano passado na América Latina totalizou US$ 2,85 bilhões, um aumento de 26% em relação a 2023, embora esse volume tenha sido alcançado com menos rodadas.O ticket médio passou de US$ 5,1 milhões em 2023 para US$ 6,6 milhões em 2024, de acordo com relatório da rede de empreendedores Endeavor e da Glisco Partners.

Sobre isso, a Glisco Partners destacou que o Brasil continua sendo o líder em termos absolutos, com o maior número de startups ativas e rodadas avançadas, especialmente nas séries B+.

No entanto, o México tem ganhado terreno em capital captado e dinamismo em todas as etapas, consolidando-se como o segundo mercado mais relevante da região.

Segundo o sócio-gerente da Glisco, embora ainda seja cedo para projetar com precisão o encerramento de 2025, os sinais do mercado, como o aumento da participação de fundos internacionais, a retomada do venture debt, o dinamismo nas rodadas avançadas e o surgimento de novas verticais, “sugerem um ambiente favorável para superar os níveis de 2024”.

Uma das particularidades apontadas no relatório é que 65% do capital levantado em 2024 foi destinado a rodadas de Growth e Late Stage, um aumento de 81% em relação ao ano anterior.

Esse movimento reflete um mercado mais maduro, onde os investidores priorizam modelos de negócios comprovados, tração operacional e potencial de escalabilidade.

No entanto, isso implica maiores desafios para startups em estágio inicial, que enfrentam um ambiente mais seletivo.

O tempo médio entre as séries A e B se estendeu para 25 meses - o mais alto em anos - refletindo que avançar para estágios mais maduros exige uma consolidação operacional mais robusta.

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Daniel Salazar

Profissional de comunicação e jornalista com ênfase em economia e finanças. Participou do programa de jornalismo econômico da agência Efe, da Universidad Externado, do Banco Santander e da Universia. Ex-editor de negócios da Revista Dinero e da Mesa América da Efe.