Bloomberg Línea — Depois de quase duas décadas como uma das maiores consolidadoras do setor de tecnologia para serviços financeiros no Brasil, a Sinqia vive um novo ciclo.
Adquirida pela empresa porto-riquenha Evertec em 2023, a empresa trabalha em um processo profundo de integração operacional, tecnológica e cultural.
A meta é transformar um conglomerado de 26 aquisições em uma plataforma única, escalável e preparada para crescer — agora de forma mais orgânica.
A companhia reestruturou sua operação para atuar de forma horizontal, com times dedicados a grandes contas, integração entre áreas e foco na oferta de novos produtos.
Hoje, aproximadamente 40% dos clientes utilizam mais de um produto da Sinqia, mas o objetivo é avançar sobre essa base com a proposta de ser uma one-stop shop para o ecossistema financeiro, especialmente bancos, gestoras e fintechs.
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Com cerca de mil clientes, a Sinqia adotou a estratégia de aumentar o tíquete médio por meio de vendas cruzadas de produtos — o cross-sell. A integração entre as soluções, antes dispersas, é parte fundamental do plano.
“Crescer organicamente significa que você precisa chegar ao seu cliente de core banking e explorar oportunidades de vender produtos de investimento e de asset management”, afirmou Claudio Prado, CEO da Sinqia, à Bloomberg Línea.
O executivo está no comando desde abril de 2024, quando o co-fundador Bernardo Gomes deixou a Sinqia, já sob o controle da Evertec.
“Não dá mais para cinco, seis pessoas diferentes da mesma empresa baterem na porta do cliente”, exemplificou.
O plano de crescimento prevê um avanço orgânico entre 15% e 20% ao ano. Modelos de cobrança por volumetria, nos quais a receita cresce conforme o uso do sistema pelo cliente, também têm impulsionado os resultados.
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Os movimentos em execução visam transformar a companhia em um negócio de R$ 1 bilhão em receitas no intervalo de 24 e 36 meses.
Em 2022, último ano em que reportou todos os trimestres, a empresa registrou uma receita líquida de R$ 616,5 milhões.
A aquisição da Sinqia pela Evertec — companhia listada na Bolsa de Nova York, com cerca de US$ 800 milhões em receita — trouxe capital, governança e uma ambição regional.
Ambas têm porte semelhante em colaboradores e complexidade, mas a Evertec fatura cerca de cinco vezes mais. O foco da Sinqia agora está em se tornar um player latino-americano de referência.
De 26 empresas para 1
“Somos a única empresa multinacional com sistemas 100% aderentes à regulação brasileira”, disse o executivo. “Isso tem um peso enorme quando falamos com bancos globais que precisam operar aqui.”
A empresa tem exportado alguns produtos para a região, com equipes locais, que falam espanhol, e estuda expandir a exportação de software financeiro brasileiro.
Em meio às mudanças, a companhia tem buscado acelerar um processo de modernização e integração dos serviços, que incluem produtos de consórcios, core banking, asset management, investimentos, digital - com serviços como onboarding e assinatura eletrônica -, consultoria e outsourcing e a parte de pagamentos, introduzida após a chegada da Evertec.
“Após 26 aquisições, você tem uma colcha de retalhos, sendo bem sincero. É um trabalho ainda em construção, mas que temos feito nos últimos dois anos e meio. É toda uma mudança na estrutura para ela ser uma empresa única, e não um conjunto de 26 empresas distintas”, disse Prado.
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Segundo o CEO, 80% dessa jornada está concluída.
O processo, iniciado ainda antes da venda da companhia, ganhou novo ritmo com a chegada da Evertec e a maior disponibilidade de capital. O valor saltou de R$ 20 milhões desembolsados anualmente para R$ 70 milhões.
Impacto tranformacional da IA
Além da “reorganização da casa”, o dinheiro tem sido empregado para acompanhar o ritmo de transformação do mercado financeiro, com mais entrantes, maior oferta de produtos e mais demandante de plataformas que performem em alta velocidade.
É nesse rearranjo que entram os novos usos de inteligência artificial, uma das apostas centrais.
A companhia atua em quatro eixos, com capacitação dos colaboradores, uso interno para automação de processos e leitura de códigos de produtos legados. A principal estratégia passa, porém, pelo uso da tecnologia para a escrita de código.
Em um trabalho embrionário, a companhia reuniu um grupo de 15 desenvolvedores — reforçado agora com mais 30 profissionais —, que conseguiu acelerar processos de front-end em até 80%. Em sistemas mais complexos, como backoffice e regras de negócios, os ganhos chegam a 35% ou 40%.
“O que me impressiona é o quão exponencial é a melhoria dessas ferramentas com a escrita de software. Se nós não fizermos e acelerarmos essa transformação com o uso de IA, acho que em dois ou três anos estaremos fora do mercado. É absurdo o nível de melhoria”, disse Prado. Por ora, apenas 4 dos cerca de 150 softwares da Sinqia passaram por essas reformulações.
Apesar do foco na expansão orgânica, a Sinqia voltou a avaliar oportunidades de aquisição.
“Para fazer sentido, uma aquisição precisa mexer o ponteiro. Estamos falando de alvos com faturamento a partir de R$ 150 milhões”, afirmou o CEO, que disse projetar a concretização de um negócio na casa de R$ 400 milhões ainda para este segundo semestre. Os recursos para o deal viriam da Evertec.
A procura é por negócios que representem ganho de market share para a Sinqia — como bancos e fundos —, em vez de entrar em novas verticais.
Hoje, a empresa tem 8% de participação em core banking e cerca de 25% em investimentos. “Gostaria mais de aumentar nossa presença nessas áreas de forma orgânica e também inorgânica”, disse o executivo.
Antes uma “queridinha” da B3, a Sinqia não tem planos de fazer um movimento de retorno à bolsa brasileira. “Não que eu saiba, né”, brincou Prado.
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