BC foi alertado por bancos e FGC sobre os riscos do Master durante anos, dizem fontes

Segundo pessoas que falaram com a Bloomberg News, banqueiros e executivos do Fundo Garantidor de Crédito expressaram preocupações sobre as operações do Master, de Daniel Vorcaro; Banco Central não comenta

Banco Master
Por Matheus Piovesana - Cristiane Lucchesi
20 de Novembro, 2025 | 04:31 PM

Bloomberg — O principal órgão regulador financeiro do Brasil foi alertado durante anos de que o Banco Master — liquidado nesta semana em meio a suspeitas de fraude — crescia em ritmo alarmante enquanto mantinha ativos de pouca transparência.

O Fundo Garantidor de Créditos (FGC), responsável pelo sistema de seguro de depósitos, enviou diversas cartas de alerta ao Banco Central.

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Executivos dos maiores bancos do país, que são os principais financiadores do FGC, também procuraram a autoridade monetária para expressar preocupação, segundo pessoas com conhecimento do assunto que falaram com a Bloomberg News.

Alguns banqueiros e executivos do FGC chegaram a falar diretamente com o então presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que prometeu agir, disseram essas pessoas, que pediram anonimato por tratar de informações privadas.

Campos Neto deixou o cargo em janeiro e hoje integra o conselho do Nubank. Ele foi sucedido por Gabriel Galípolo, que agora enfrenta a tarefa de lidar com a quebra do banco.

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O FGC afirmou que, desde 2019, mantém um acordo de cooperação com o Banco Central — responsável por fiscalizar e regulamentar instituições financeiras — e que esse acordo prevê troca contínua de informações em reuniões regulares para reforçar a estabilidade do sistema financeiro nacional.

O FGC acrescentou que não reconhece declarações atribuídas a seus executivos sob anonimato, nem a existência de comunicações eventuais fora dos canais institucionais.

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Campos Neto preferiu não comentar, e um representante do Banco Central não respondeu de imediato a um pedido de comentário.

Na terça-feira (18), o Banco Central anunciou a liquidação do Master, medida que, segundo o FGC, exigirá R$ 41 bilhões para pagar cerca de 1,6 milhão de investidores — um valor recorde para o fundo garantidor.

A liquidação da instituição pode custar ainda mais ao FGC, chegando a R$ 55 bilhões caso outros bancos menores ligados ao caso também sejam liquidados, segundo uma pessoa a par das discussões que falou com a Bloomberg News.

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Há recursos para isso: no fim de setembro, o FGC tinha R$ 160 bilhões em ativos e cerca de R$ 122 bilhões em caixa, conforme informou em comunicado na terça-feira. Mas o fundo precisará ser recapitalizado já no início do próximo ano pelos maiores bancos brasileiros, disse a pessoa.

O FGC ainda trabalha para calcular quanto os bancos terão de pagar, afirmou outra fonte. Os bancos provavelmente reforçarão o caixa do fundo antecipando contribuições futuras, mas o processo pode levar alguns anos, acrescentou.

Em comunicado, o FGC afirmou que não há prazo definido na regulamentação para a recomposição do fundo e que o tema será discutido levando em conta o impacto para o sistema e a preservação da capitalização.

O presidente do Banco Master, Daniel Vorcaro, foi preso em uma investigação da Polícia Federal sobre suspeita de fraude.

Vorcaro e seus sócios criaram o banco a partir da compra de uma instituição pequena em 2017, cuja estratégia e nome foram alterados.

O Master dependia fortemente de captação junto a investidores individuais usando a garantia do FGC, que é financiada pelas exigibilidades dos próprios bancos. Quanto maiores os depósitos, maior a contribuição das instituições ao FGC.

Vorcaro declarou anteriormente estar disposto a colaborar com as autoridades, segundo comunicado divulgado na terça-feira.

O FGC cobre até R$ 250.000 por investidor, com limite de R$ 1 milhão ao longo de quatro anos.

Ao mesmo tempo, uma parte considerável dos ativos do Master era composta por fundos de crédito e fundos de participação, que têm liquidez menor do que títulos públicos. Esses fundos representavam 69% dos ativos líquidos do banco em junho de 2024, segundo a Moody’s.

Havia preocupações porque não estava claro qual era, de fato, o negócio do Master — pontos que também foram levados ao Banco Central, disse de forma reservada o presidente de outro banco.

Executivos do Banco Master, que saiu do anonimato para se tornar um nome de destaque no setor financeiro brasileiro nos últimos cinco anos, são acusados pelas autoridades federais de fabricar instrumentos de crédito.

A instituição atraiu investidores de varejo pagando taxas acima do mercado em seus depósitos, enquanto buscava investimentos diversificados com uma série de parceiros com vínculos com o banco.

O Master começou a enfrentar mais dificuldades em 2023, quando uma mudança de regra no FGC tornou seu uso mais restrito e passou a ameaçar o modelo de negócios do banco.

No fim de 2024, a Polícia Federal e o Ministério Público iniciaram uma investigação sobre a venda de carteiras do Master para o Banco de Brasília (BRB), controlado pelo governo do Distrito Federal.

Em março, o BRB chegou a anunciar a compra do Master, negócio que atraiu críticas por ser visto como um resgate estatal a uma instituição arriscada. Em setembro, o Banco Central vetou a transação.

O presidente do BRB, Paulo Henrique Costa, foi afastado do cargo e está nos Estados Unidos, segundo a imprensa brasileira.

O BRB afirmou que comunicou o Banco Central sobre as operações com o Master tão logo identificou a possível participação de um terceiro, o que infringiria a obrigação contratual de que todos os empréstimos deveriam ser originados pelo próprio Master.

De acordo com o BRB, a ordem do Banco Central para interromper as operações foi cumprida assim que foi emitida.

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