Wall St projeta recorde de emissões de títulos high grade em 2026 com avanço da IA

Instituições como Morgan Stanley e TD Securities esperam um volume de mais de US$ 2 trilhões em emissões de dívida corporativa de grau de investimento, impulsionadas por investimentos em IA

New York Stock Exchange (NYSE)
Por Gerson Freitas Jr. - Abraham Gonzalez - Rainier Harris
23 de Dezembro, 2025 | 06:26 PM

Bloomberg — Empresas dos Estados Unidos e da Europa se preparam para vender um volume recorde de títulos corporativos de alta qualidade em 2026, colocando à prova o apetite dos investidores em um cenário de queda gradual dos rendimentos.

Estrategistas do Morgan Stanley preveem que mais de US$ 2 trilhões em dívida de grau de investimento nos EUA cheguem ao mercado no próximo ano, o maior volume já registrado.

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A expectativa é que esse movimento seja impulsionado por projetos de expansão em inteligência artificial, refinanciamento de vencimentos próximos e financiamento de aquisições.

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A projeção otimista de emissões surge apesar das dúvidas sobre por quanto tempo o atual boom do crédito pode se sustentar. Com os rendimentos em queda e as preocupações sobre uma possível bolha de IA ficando mais difíceis de ignorar, investidores devem começar a exigir spreads maiores para comprar dívida corporativa.

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“O ciclo de crédito ainda deve esquentar mais antes de se esgotar”, escreveram estrategistas do Morgan Stanley, incluindo Andrew Sheets, em nota a clientes no início de dezembro, ao projetar que a oferta de títulos de alta qualidade nos EUA salte 25% no próximo ano, para US$ 2,25 trilhões.

Após anos de cautela, as empresas parecem dispostas a assumir mais riscos. Elas são estimuladas por um custo de financiamento mais baixo, regulamentação mais flexível e pelo que o banco chama de o maior ciclo de investimentos em capital “de uma geração”, segundo os estrategistas.

As emissões de dívida ligadas apenas à inteligência artificial devem mais do que dobrar no próximo ano, alcançando US$ 400 bilhões, de acordo com o Morgan Stanley.

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Esse salto faz parte de um boom de investimentos muito mais amplo. Os gastos com IA, computação em nuvem e construção de data centers devem atingir, juntos, US$ 3 trilhões até 2029, e a dívida “rapidamente se tornou o instrumento de financiamento preferencial”, segundo a Bloomberg Intelligence.

O Morgan Stanley estima que as gigantes de computação em nuvem conhecidas como hyperscalers — grupo que inclui Alphabet, Amazon, Meta Platforms e Oracle — têm espaço para emitir até US$ 700 bilhões adicionais em dívida sem provocar um único rebaixamento de rating.

Embora o JPMorgan Chase também projete um recorde histórico de emissões de dívida de grau de investimento no próximo ano, o Bank of America espera que as vendas desse tipo de papel cresçam 11% em 2026, para US$ 1,84 trilhão — ainda abaixo do recorde de cerca de US$ 1,86 trilhão registrado em 2020.

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Mesmo assim, há riscos, especialmente para empresas que investem pesado em IA, enquanto investidores aguardam para ver como essas apostas irão se desenrolar.

“Talvez seja necessário que os spreads continuem subindo um pouco para compensar a incerteza por trás dessa mudança de tendência em IA”, disse Collin Martin, chefe de pesquisa e estratégia em renda fixa da Charles Schwab.

Nem todos, porém, compartilham dessa preocupação. Os hyperscalers “estão entre as empresas com melhor classificação de crédito da história do mercado”, afirmou Vishwas Patkar, chefe de estratégia de crédito corporativo nos EUA do Morgan Stanley. “Não há necessariamente aumento de risco de crédito.”

Emissões na Europa

Empresas americanas que vendem títulos denominados em euros também devem ajudar a impulsionar emissões recordes na Europa.

A chamada oferta “reverse Yankee” alcançou um recorde de € 188,1 bilhões em 2025, incluindo dívidas financeiras e não financeiras, segundo dados compilados pela Bloomberg. A maioria dos analistas espera novo avanço em 2026.

“Nossa pesquisa indica que 2026 pode estabelecer um novo recorde para a emissão primária de títulos corporativos em euros”, disse Xavier Beurtheret, chefe global de DCM corporativo do Credit Agricole, durante uma apresentação virtual em dezembro.

“Os emissores dos EUA devem ser muito ativos no próximo ano para aproveitar o diferencial cambial, que ainda permanece atraente para eles, além de diversificar sua base de investidores.”

A emissão total de títulos corporativos de alta qualidade denominados em euros deve crescer mais de 6%, para um recorde de €836 bilhões, também impulsionada por volumes maiores de vencimentos, segundo o Barclays.

Outros motivos para tomar empréstimos

Além de financiar o boom da IA, as empresas também precisarão refinanciar mais de US$ 1 trilhão em dívidas em 2026, à medida que obrigações existentes se aproximam do vencimento, estima o JPMorgan.

O banco projeta um aumento de 17% nas emissões de títulos de grau de investimento nos EUA em 2026, para um recorde histórico de US$ 1,81 trilhão. As previsões entre bancos nem sempre são perfeitamente comparáveis, pois utilizam metodologias diferentes.

Uma retomada da atividade de fusões e aquisições, após anos de contenção, também deve elevar a oferta de títulos. Entre os negócios que devem ser ao menos parcialmente financiados com dívida no próximo ano estão o desmembramento planejado da divisão North American Grocery da Kraft Heinz e a aquisição, pela AT&T, das operações de fibra para consumidores da Lumen Technologies, segundo o banco.

Títulos de grau de investimento também serão emitidos independentemente de a Paramount Skydance ou a Netflix vencerem a disputa pela aquisição da Warner Bros. Discovery.

A emissão de dívida relacionada a M&A deve atingir US$ 182 bilhões em 2026, um aumento de 21% em relação ao ano anterior, de acordo com o JPMorgan.

Com a oferta de dívida em expansão, é muito menos certo que a demanda acompanhe esse ritmo. Algumas das forças que sustentaram o apetite dos investidores nos últimos anos — incluindo rendimentos excepcionalmente elevados — começam a perder força. O Federal Reserve já cortou os juros três vezes neste ano, e novas reduções são esperadas em 2026.

Além disso, a qualidade de crédito — que se fortaleceu nos últimos anos após as empresas reduzirem alavancagem por temores de recessão — agora tende a se deteriorar, segundo o Bank of America. Isso ocorre à medida que companhias recorrem a operações financiadas por dívida elevada para sustentar o valor ao acionista.

“Esperamos fundamentos e condições técnicas mais fracos em 2026”, escreveram Yuri Seliger e Sohyun Marie Lee, do BofA, em nota a clientes. “Isso significa que os spreads devem operar um pouco mais abertos.”

Os spreads devem se ampliar para uma faixa entre 1 e 1,1 ponto percentual em 2026, ante 0,75 a 0,85 ponto percentual, à medida que o “período de excesso de demanda chega ao fim”, escreveu Hans Mikkelsen, estrategista de crédito nos EUA do TD Securities, em nota.

“Os últimos anos registraram longos períodos de condições técnicas favoráveis — basicamente excesso de demanda devido a rendimentos elevados e atraentes, o que levou a intervalos prolongados de spreads de crédito artificialmente comprimidos”, afirmou Mikkelsen.

Os spreads também devem se ampliar de forma moderada na Europa, com menos cortes de juros previstos para o próximo ano. O Deutsche Bank projeta que cheguem a 1,03 ponto percentual até o fim de 2026, ante 0,86 ponto percentual neste ano.

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