Com rali global de ações, estrategistas questionam o que pode dar errado

Mesmo aqueles que alertavam para os riscos agora se mostram menos reticentes. Mas há investidores que ainda apontam os riscos que podem fazer o cenário mudar

Investidores retomam apetite por ativos de risco e até quem estava cético agora muda de opinião
Por Elena Popina - Jessica Menton
31 de Julho, 2023 | 07:03 PM

Bloomberg — Traders americanos estão quase completamente destemidos agora, o que levou alguns estrategistas a se prepararem para uma possível onda de venda, um sell off, ainda que não esteja claro o que pode reverter uma onda de aumento de apetite ao risco que parece não ter fim.

O índice S&P 500 subiu cerca de 20% neste ano, atraindo investidores que estavam reticentes de volta para o mercado. A exposição a ações está em nível historicamente alto, de acordo com análise do Deutsche Bank. Poucos parecem preocupados o suficiente para se proteger.

A compra de proteção contra quedas no mercado de opções está “mais barata do que provavelmente você já viu”, escreveram os estrategistas do Bank of America em uma nota na terça-feira passada (25). O volume de negociação de opções de compra, utilizadas para apostar na alta do mercado, superou as opções de venda no início deste mês pelo maior montante desde dezembro de 2021.

Mas há motivos para se preocupar. O Federal Reserve busca um soft landing após um período de inflação e aumentos intensos de taxas, um esforço que raramente tem sucesso. Além disso, setembro e agosto tendem a ser os dois piores meses do ano para o S&P 500.

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“O sentimento otimista e a sazonalidade fraca acenderam um sinal de alerta em nosso radar”, disse Jeffrey Hirsch, editor do Stock Trader’s Almanac, que previu corretamente o rali após a crise financeira. “Todos os investidores bearish que saíram da posição de cautela agora perseguem o momentum e os players com FOMO [Fear of Missing Out] estão no all in, o que significa que é hora de ver o rali pausar.”

O avanço do S&P 500 desafiou as expectativas consensuais de perdas para o começo de 2023 antes de um eventual rebote, levando muitos a repensar suas previsões.

Alguns dos estrategistas cautelosos mais notórios de Wall Street, como Michael Kantrowitz, da Piper Sandler & Co., e Mike Wilson, do Morgan Stanley, ajustaram suas posições recentemente.

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Traders reagiram ao rali nas ações mostrando uma inclinação para as opções de compra, em parte impulsionadas por um boom de Inteligência Artificial que impulsionou o avanço das ações de tecnologia. Nas bolsas dos EUA, o volume de opções de compra superou as opções de venda em mais de 8 milhões de contratos em uma base móvel de 10 dias, mostram os dados da Bloomberg.

Existem razões para a extensão do rali do S&P 500, que fechou julho com sua quinta alta mensal consecutiva. A inflação vem diminuindo lentamente, enquanto a economia se mantém relativamente resiliente diante do ciclo de aperto monetário mais agressivo em décadas.

Os traders de Wall Street acabaram abandonando a proteção contra queda e levaram esse custo para patamares mínimos. Para cada US$ 100 em valor nocional - o valor que um contrato de opção cobre -, os investidores agora pagam apenas US$ 3,50 por uma opção de venda do S&P 500 que vence em um ano com preço de exercício 5% abaixo dos níveis atuais, dados do Bank of America mostram.

Essa é a menor taxa nos dados do banco desde 2008 (entre o prêmio e o preço de exercício, o contrato será lucrativo se o S&P 500 cair pelo menos 8,5% em um ano).

Se isso acontecer ainda está para ser visto, mas o momento parece estar mais distante. A relação put-call da Cboe, que acompanha o volume de opções vinculadas a ações individuais, está no nível mais baixo em mais de um ano. Historicamente, isso resultou em um desempenho estável para o mercado de ações nos próximos três meses, mostram dados compilados pelo Goldman Sachs (GS).

Além disso, padrões sazonais podem criar uma resistência adicional. Nos últimos 30 anos, setembro e agosto foram os dois piores meses para o S&P 500, com uma queda média de 0,4% no primeiro e outra de 0,2% no segundo.

Como muitos em Wall Street, Luca Paolini, estrategista-chefe da Pictet Asset Management, encerrou uma posição short - vendida - em ações dos EUA no início de julho em meio a um rali implacável. Agora neutro em ações dos EUA, Paolini disse que ainda acredita que os investidores estão subestimando os riscos potenciais para a economia.

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“O mercado nos está dando um sinal claro de que o impulso de alta tem sido construído”, disse ele. “Existe um nível incrível de confiança de que o Fed pode gerenciar um soft landing, com crescimento mais fraco e inflação menor sem uma recessão. Mas, se algo der errado, estará relacionado a isso.”

Dados preliminares da semana passada mostraram que o Produto Interno Bruto dos EUA inesperadamente acelerou no segundo trimestre, aumentando a confiança sobre o estado da economia e simultaneamente alimentando apostas de que a campanha do Fed contra a inflação pode durar mais do que o esperado.

O banco central dos EUA está adotando uma abordagem dependente de dados para futuros aumentos das taxas de juros, disse o presidente Jerome Powell após a reunião da quarta-feira passada (26).

Uma preocupação potencial é que as comparações de dados de inflação ano a ano começarão a sair do cenário favorável de base mais alta em 2022 ainda neste ano, disse Dennis Debusschere, da 22V Research. As apostas de inflação estão precificando um avanço de 3,2% na inflação em julho em relação ao ano anterior e uma variação de 3,6% em agosto.

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Uma inflação mais alta pode se traduzir em taxas de juros que não vão cair tão cedo como o mercado gostaria.

“Há um estado de espírito de ‘missão cumprida’ em relação ao CPI entre muitos investidores em relação a esse ponto, mas não é o caso”, disse Nitin Saksena, chefe de pesquisa de derivativos de ações dos EUA no Bank of America. “Existe esse risco de que o Fed mantenha as taxas de juros mais altas por mais tempo, e isso fará com que algo acabe quebrando.”

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