Risco climático não é bem precificado e Brasil está vulnerável, diz Barclays

Banco britânico aponta que rating de países emergentes deveria indicar melhor os riscos climáticos, o que, por sua vez, poderia impactar as taxas de juros

Floresta amazônica no Pará
Por Frances Schwartzkopff
04 de Setembro, 2023 | 03:36 PM

Bloomberg — Os investidores em títulos soberanos estão avaliando incorretamente um risco crescente que tem o potencial de desencadear rebaixamentos de crédito, de acordo com um estudo realizado por analistas do banco britânico Barclays.

O ponto em questão seria o fracasso de certos países em proteger adequadamente o seu capital natural, colocando em risco recursos hídricos, aéreos e do solo e impactando setores chave como a agricultura, disse uma equipe de analistas liderada por Maggie O’Neal, chefe global de ESG do Barclays Research, em um relatório publicado nesta segunda-feira (4).

Alguns dos mercados soberanos mais expostos são aqueles que já possuem classificações ruins, incluindo o Bangladesh e a Etiópia, escreveram O’Neal e os seus colegas. Outros países com baixos ratings também estão na mira, como as Filipinas, a Indonésia e a Índia, escreveram.

Argentina, Brasil e Indonésia destacam-se como os mais vulneráveis entre os países do G20 aos riscos de biodiversidade. E, quando se trata de escassez de água, nenhuma nação do G20 corre mais risco do que a Arábia Saudita, estimou a análise do Barclays.

PUBLICIDADE

Prevê-se que a perda natural “causará rebaixamentos da dívida soberana”, com juros mais elevados “aumentando o risco de crédito para os detentores de títulos”, disseram.

A preocupação de que investidores estejam negociando títulos soberanos sem ter em conta o capital natural está a moldar cada vez mais as regulamentações, entre sinais de que as perdas no mundo real representam uma ameaça cada vez maior para as sociedades em todo o mundo.

Segundo o Barclays, esses custos já começaram a se concretizar. E podem incluir desde depreciação do capital fixo de empresas e a incapacidade de recuperar ativos como reservas de petróleo até calote de dívida.

PUBLICIDADE

Os emissores também enfrentam perturbações nas cadeias de produção e de valor, bem como preços voláteis das matérias-primas, o que pode prejudicar as exportações e arrastar para baixo bancos, investidores e seguradoras expostos a tais riscos, escreveram os analistas do Barclays.

E alertaram que a chegada de regulamentações sobre biodiversidade abriu a porta para litígios, colocando os malfeitores em riscos jurídicos cada vez maiores.

É neste momento que a autoridade europeia de valores mobiliários (ESMA, na sigla em inglês) emite um aviso de que não vai tolerar alegações enganosas sobre biodiversidade por parte de fundos de investimento.

“O crescente escrutínio público e a crescente compreensão dos riscos para a biodiversidade aumentam as expectativas de que os produtos financeiros relacionados com a biodiversidade aumentem rapidamente em número e tamanho nos próximos anos”, afirmou a Barclays. Isso justifica “maiores níveis de monitoramento do mercado”.

Mais de metade do Produto Interno Bruto global depende da natureza, escreveram O’Neal e a sua equipe. “Reverter a perda de biodiversidade é imperativo para limitar os riscos físicos e evitar repercussões graves para a economia”, afirmaram.

O Barclays estima que, até 2030, será necessário quase US$ 1 bilhão em investimentos anuais para proteger a biodiversidade, em comparação com os cerca de US$ 160 milhões gastos atualmente.

Ao mesmo tempo, cerca de US$ 725 milhões são gastos naquilo que o Barclays identifica como “subsídios prejudiciais” que prejudicam a biodiversidade.

PUBLICIDADE

A maioria dos mercados de obrigações soberanas que enfrentam um impacto financeiro relacionado com a biodiversidade são classificados como junk, muitos deles particularmente expostos por meio dos mercados de exportação, de acordo com a análise do Barclays.

Avaliação de crédito

Existem preocupações de que as agências de classificação de risco não estejam a fazer o suficiente para refletir esses riscos. A inclusão de pontuações ESG nas notas de crédito revela-se particularmente sensível, dado o potencial de influenciar os juros de um emissor. Até mesmo decidir como medir e refletir tais riscos está se revelando algo controverso.

A S&P Global Ratings abandonou recentemente uma escala destinada a captar os riscos ambientais, sociais e de governança associados às notas de crédito, depois de os investidores a considerarem confusa. Enquanto isso, na Moody’s e na Fitch Ratings, essas escalas continuam sendo a norma.

Ao mesmo tempo, especialistas alertam que as agências podem não estar monitorando suficientemente os riscos ESG.

PUBLICIDADE

As alterações climáticas, por exemplo, “ainda não foram integradas na metodologia” atualmente utilizada pelas três principais agências de classificação, de acordo com Moritz Kraemer, que supervisionou as classificações da dívida soberana da S&P até 2018 e é agora o chefe de investigação do banco LBBW.

Organizações internacionais e gestoras de ativos, incluindo a Amundi, criaram uma base de dados disponível ao público sobre as ações climáticas dos emissores de títulos soberanos, que se encontra agora em uma fase de testes.

Os investidores podem reduzir a sua exposição a tais riscos através do envolvimento com os emissores, escreveram os analistas do Barclays. Ou podem optar por obrigações verdes soberanas e por trocas de dívida, embora a alocação de receitas tenda a ser mais orientada para a descarbonização do que para a natureza, disseram.

“A biodiversidade é um ativo produtivo que gera serviços ecossistêmicos cruciais”, escreveram os analistas. “No entanto, como um ativo sem preço, é sistematicamente mal administrado.”

PUBLICIDADE

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Fed e El Niño levam emergentes a rever ritmo de corte de juros; Brasil é exceção