Milei fecha acordo comercial com Trump e põe à prova economia fechada da Argentina

Governos chegaram a um esboço de um acordo comercial que as autoridades dizem que pode ser assinado em duas semanas; medida prevê que a Argentina importe gado vivo dos EUA e abra seu mercado de aves para produtores americanos

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Bloomberg — O presidente argentino Javier Milei conseguiu seu acordo comercial com Donald Trump, mas a vitória política do líder libertário também representa um desafio: abrir uma economia argentina historicamente protecionista.

Washington apresentou na quinta-feira (13) o esboço de um acordo comercial com o país sul-americano — em permanente crise — após Milei fazer mais de uma dúzia de viagens aos Estados Unidos em dois anos.

O pacto soma-se aos dezenas de bilhões de dólares em apoio financeiro que o governo Trump já destinou ao seu aliado ideológico e cumpre a promessa feita pelo presidente argentino aos eleitores de garantir um acordo desse tipo.

“Este acordo comercial mostra que os Estados Unidos continuam engajados na Argentina e interessados no sucesso de Milei, mas não resolve os desafios mais assustadores que ele enfrenta”, disse Benjamin Gedan, diretor do programa para América Latina do Stimson Center, em Washington. “A Argentina tem sido um dos mercados mais fechados do mundo por tanto tempo que muitas de suas indústrias simplesmente não conseguem competir.”

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O acordo, que autoridades dos Estados Unidos dizem que pode ser assinado em cerca de duas semanas, reforça o impulso político de Milei após seu partido obter uma vitória expressiva nas eleições legislativas de meio de mandato — o que desencadeou uma disparada nos mercados e renovou o otimismo dos investidores em relação a reformas econômicas profundas, já que ele terá mais assentos no Congresso a partir de dezembro.

No início do ano, os argentinos se mostraram favoráveis a um pacto comercial com os EUA, segundo pesquisa da AtlasIntel para a Bloomberg News. Mas os entrevistados duvidavam que as indústrias locais pudessem competir com fabricantes americanos.

Republicanos nos Estados Unidos também criticaram os esforços do governo Trump para expandir o comércio bilateral em soja e carne bovina. O arcabouço do acordo comercial prevê que a Argentina importará gado vivo dos Estados Unidos e abrirá seu mercado de aves para produtores americanos dentro de um ano.

A Argentina costuma figurar entre os países do mundo com mais barreiras comerciais: suas tarifas médias ficaram em 13% nos últimos anos, contra 3,5% nos Estados Unidos, segundo dados do Banco Mundial. A última tentativa de abertura da economia, nos anos 1990, devastou a indústria local e tornou “livre comércio” sinônimo de perda de empregos para muitos eleitores.

O que diz a Bloomberg Economics…

“O acordo é inclinado a favor de Washington. Isso faz sentido. A Argentina recebeu recentemente apoio dos EUA por meio de um swap de US$ 20 bilhões e intervenções diretas do Tesouro americano no mercado de pesos em um período mais difícil. A economia sem caixa também se beneficia do efeito de sinalização do acordo, que pode ser mais relevante para o panorama macroeconômico do que as próprias medidas comerciais.”

Jimena Zuniga, economista para Argentina

O tamanho e o escopo final do acordo ainda precisam ser definidos, mas ele tende a ser limitado pela participação da Argentina no Mercosul, que impede seus membros de firmar acordos amplos com países de fora do bloco.

No início do ano, o Mercosul permitiu que seus membros selecionassem 50 produtos para negociar com outros países sem a aplicação das tarifas do bloco.

O arcabouço do acordo também aponta para maiores benefícios econômicos aos Estados Unidos, possivelmente indicando as concessões que Milei precisou fazer para garantir a linha de swap de US$ 20 bilhões durante a corrida pré-eleitoral, quando a moeda argentina passava por forte estresse.

A Argentina se comprometeu a dar acesso preferencial ao mercado para exportações americanas de determinados carros, remédios, produtos químicos, máquinas, itens tecnológicos, dispositivos médicos e “uma ampla gama de produtos agrícolas”, afirmou a Casa Branca.

O país tem uma grande indústria automotiva e um setor de eletrônicos altamente protegido, levantando dúvidas sobre o impacto nas empresas locais.

Entre outros pontos, “os Estados Unidos removerão tarifas recíprocas sobre determinados recursos naturais indisponíveis e artigos não patenteados usados em aplicações farmacêuticas”.

Enquanto os detalhes não ficam claros, Milei celebra a conquista após fazer 14 viagens aos Estados Unidos desde que assumiu o cargo. Ele foi criticado internamente ao voltar de mãos vazias de algumas dessas visitas no início do ano, apesar das expectativas de grandes reuniões ou anúncios de investimento.

“Parece que as viagens produziram alguma coisa”, disse Milei, em tom sarcástico, durante um discurso na noite de quinta-feira. “Estamos profundamente comprometidos em fazer a Argentina grande novamente.”

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