O que Messi e Metallica têm em comum? Marketing da erva-mate eleva vendas do Brasil

Mercado global de erva-mate tem perspectiva de quase dobrar e chegar a US$ 4,3 bilhões até 2035. Argentina tenta capitalizar em divulgação por celebridades, mas são as exportações brasileiras que mais crescem no mundo

James Hetfield, vocalista do Metallica, toma mate antes de show
29 de Julho, 2025 | 12:39 PM

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Bloomberg Línea — A Argentina tem o produto e as celebridades que o bebem, mas ainda não capitalizou o impulso para fazer suas exportações de erva-mate decolarem. E o crescimento da popularidade gobal da bebida acaba beneficiando o Brasil, maior exportador do produto.

Enquanto Lionel Messi, Antoine Griezmann, James Hetfield, do Metallica, e o ator Jason Momoa são mostrados bebendo em cabaças de bombilla tradicionais diante de milhões de fãs, a Argentina exportou apenas 15% dos 302,8 mil toneladas de erva-mate que produziu em 2024. Já o Brasil vendeu 48,9 mil toneladas no mesmo ano, 41% a mais do que uma década antes.

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O crescimento das vendas externas é uma oportunidade que o governo de Javier Milei está buscando promover por meio da desregulamentação do setor da erva-mate.

“Você tem o mundo inteiro para conquistar. Você tem [Franco] Colapinto [da Fórmula 1] e Leo Messi bebendo mate, [Antoine] Griezmann. Acho que a indústria da erva-mate está muito encapsulada em sua bola de cristal”, disse o ministro da desregulamentação de Milei, Federico Sturzenegger, em uma entrevista à Bloomberg Línea.

“Estamos totalmente disponíveis para ajudar as províncias, para ajudar o setor, para liberar os obstáculos e facilitar a conquista do mundo. Acho que é um produto muito nobre e não vejo por que ele não poderia ter um futuro extraordinário”, acrescentou.

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Embora a eliminação das restrições no mercado de carne bovina tenha catapultado a Argentina para um recorde histórico de exportação em 2024, a erva-mate enfrenta um desafio mais complexo, já que historicamente tem sido uma bebida de nicho fora do Cone Sul da América do Sul.

O consumo de erva-mate fora da Argentina não está crescendo na mesma proporção que o observado no mercado interno, explicou a este jornal Juan Carlos Theas, representante da Cooperativa Yerbatera Andresito para o mercado internacional.

Atualmente, quase 80% das exportações argentinas estão concentradas no mercado árabe, especialmente em países com comunidades sírio-libanesas, que sustentam uma demanda tradicional, estável e ligeiramente crescente, disse ele.

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No entanto, nas duas últimas décadas, alguns sinais encorajadores começaram a aparecer: a marca Yerba Madre, anteriormente conhecida como Guayakí e fundada pelo argentino Alex Pryor, começou a atacar o mercado dos EUA no formato de uma bebida gelada vendida em latas. Mais tarde, a Coca-Cola lançou sua própria linha de Honest Yerba-Mate.

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Atualmente, o mercado global de erva-mate vale cerca de US$ 2,4 bilhões, de acordo com a Future Market Insights, que projeta que ele chegará a US$ 4,3 bilhões até 2035. Devido à liderança da Argentina no consumo local, o setor é dominado por marcas argentinas, incluindo Las Marías, com 20-24% do mercado global, seguida por Taragüí (12-16%), CBSe (8-12%) e Rosamonte (6-10%).

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A China será o mercado de crescimento mais rápido, com 8,2% ao ano, seguida pela Alemanha (7,1%) e pelos EUA (6,5%), de acordo com a Future Market Insights.

Brasil no topo

Apesar de ser o país com o maior consumo de erva-mate, a Argentina não lidera o ranking de exportação.

Entre 2014 e 2024, as exportações brasileiras de erva-mate cresceram 14,3 mil toneladas, passando de 34,6 mil toneladas em 2014 para 48,9 mil toneladas em 2024, segundo dados do Banco Mundial. Ou seja, um crescimento de 41%.

No mesmo período, as vendas argentinas para outros países cresceram em uma porcentagem menor, 30%, para 44 mil toneladas, de acordo com dados do Instituto Nacional da Erva-Mate (INYM).

Somente em 2024, o Brasil abriu 13 novos mercados, incluindo Rússia, Japão, Reino Unido, México e Coreia do Sul, além de fechar acordos com a União Econômica Eurasiática para exportar erva-mate em seu formato simplificado, de acordo com o Ministério da Agricultura e Pecuária do gigante sul-americano.

A história ecoa o setor de soja, onde a Argentina estagnou com o aumento das tarifas de exportação, enquanto o Brasil, sem restrições regulatórias ou tributárias, decolou. A Argentina produziu 61 milhões de toneladas em 2014 e caiu para 48 milhões de toneladas em 2023, enquanto o Brasil saltou de 97 milhões para 155 milhões de toneladas no mesmo período.

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Com a erva-mate, o padrão ameaça se repetir: enquanto a Argentina tem o produto, as marcas e o “marketing gratuito” das celebridades, o Brasil conseguiu a execução para conquistar novos mercados.

Na ausência de um mercado externo, o setor de erva-mate enfrenta atualmente uma perspectiva adversa em nível local.

A safra recorde de 2024 na Argentina, com 982 mil toneladas de folhas verdes produzidas, reduziu os preços ao produtor em 50%. “Na ausência de expectativas de inflação e sem financiamento acessível, ninguém compra erva por precaução”, como nos últimos anos, explica Darío Bruera, da Federação de Associações Rurais e Florestais de Misiones (FARM).

Impacto de redes sociais

O caso da Cachamai, uma marca do Grupo Werthein, ilustra o potencial de exportação da Argentina. “Recentemente, fizemos uma venda de erva-mate para o Vietnã graças a uma operação comercial com um tiktoker”, disse Graciela Rastelli, CEO da marca, à Bloomberg Línea.

Não se trata apenas de celebridades globais: há um fenômeno crescente de influenciadores no TikTok e no Instagram divulgando o mate como uma bebida energética natural, uma alternativa ao café e ao chá, entre o público jovem, abrindo portas que as estratégias tradicionais não conseguiram. O Vietnã se junta aos mercados da Cachamai ao lado dos Estados Unidos, Alemanha, México, Japão, França, Nova Zelândia e Costa Rica.

“O fato de celebridades como Lionel Messi, Franco Colapinto e James Hetfield, do Metallica, beberem mate em público ajuda a aumentar a conscientização sobre essa infusão em todo o mundo“, disse Rastelli. Para o executivo, o fato de atletas de alto desempenho como Griezmann e Luis Suárez beberem “é uma excelente carta de apresentação para a infusão”.

Ele também enfatizou que “há instituições médicas internacionais que começaram a falar sobre as excelentes condições naturais que o mate tem para o organismo”.

“Agora estamos analisando a possibilidade de vender para a Tailândia. Muitas dessas possibilidades são geradas pela divulgação internacional do produto na imprensa global e nas redes sociais”, acrescentou.

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Estratégias regional e global

Darío Bruera propõe uma abordagem mais conservadora para o crescimento da erva argentina: primeiro conquistar os mercados vizinhos. “O Brasil, o Chile e o Uruguai são grandes consumidores per capita, mas eles compram principalmente a erva brasileira”, diz o líder da FARM. A oportunidade é concreta: “Hoje temos uma erva mais barata do que eles em dólares”, mas isso exige “uma política bastante agressiva como país”, com instrumentos financeiros e fiscais específicos para desenvolver produtos adaptados ao paladar de cada mercado.

A desregulamentação promovida por Sturzenegger teve efeitos positivos imediatos, para Bruera. Mais de 20 novas marcas surgiram e muitos produtores descobriram que o envase de sua própria erva os deixa 30% mais lucrativos do que a venda de folhas verdes para grandes empresas. “Colocando sua própria erva em uma embalagem, produzindo sua própria erva, eles obtêm 30% ou 40% a mais de lucratividade com seu produto”, diz Bruera, que vê com bons olhos a eliminação das restrições ao plantio de erva e a liberalização dos preços.

E com um alcance global em mente, o relatório da Future Market Insights destaca que a inovação em sabores e formatos é “pronta para beber ” e “pronta para beber ”pronto para beber será fundamental para capturar o crescimento projetado, especialmente na Ásia e na Europa. As empresas argentinas têm a experiência e a qualidade; agora precisam se adaptar aos novos consumidores em outras latitudes.

“Fora da Argentina, do Paraguai, do Uruguai e do sul do Brasil, o mate não é um hábito social, mas mais individual”, observa Rastelli, um insight quando se trata de desenvolvimento de produtos. “Não temos dúvida de que o consumo de mate continuará crescendo, e até mesmo o uso da erva-mate como matéria-prima para fazer várias bebidas”, disse.

O desafio é transformar a tradição em inovação sem perder a essência. Mais de 50% do mercado global prefere a folha solta, o formato tradicional que a Argentina domina, mas o segmento de bebidas prontas para beber e produtos funcionais está crescendo mais rapidamente, de acordo com o relatório da Future Market Insights.

Para Theas, da Cooperativa Andresito Yerbatera, o verdadeiro potencial de expansão da erva-mate está no segmento de infusões em sachês, conhecido na Argentina como “mate cocido”.

“O mercado de infusões e bebidas funcionais é o que precisa ser desenvolvido”, disse ele, e alertou que hoje esse mercado é abastecido principalmente pela erva-mate brasileira, como resultado do forte crescimento do Brasil nos últimos 15 anos. Nesse sentido, ele destacou que, entre os três maiores produtores da região, o Brasil é o único que ainda tem espaço para continuar expandindo seu consumo interno.

Francisco  Aldaya

Periodista argentino con más de 10 años de experiencia. Francisco cubrió al sector financiero latinoamericano en S&P Global Market Intelligence, y trabajó en las secciones de economía y política del Buenos Aires Herald. También ha colaborado con el Buenos Aires Times.