Bloomberg Línea — Aeronaves com dois ou três anos de uso são vendidas pelo mesmo preço de modelos novos no mercado brasileiro devido às longas filas de espera para entrega.
Os prazos de entrega podem chegar a três anos, segundo disse Pedro Ferreira, head de aviação da Timbro, plataforma de negócios internacionais e maior importadora de aeronaves do país, à Bloomberg Línea.
“O mercado de aeronaves usadas cresceu muito, com aumento das importações. Não via filas enormes assim desde o final dos anos 1980″, afirmou o executivo, que tem experiência de décadas no segmento.
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Em sua avaliação, a falta de estoque de novas aeronaves complica toda a cadeia do setor, incluindo o aftermarket, pois as peças são compartilhadas entre aviões novos e usados.
“Um número maior de aviões no mercado significa a necessidade de mais peças e mais trabalho para pilotos e mecânicos - ou seja, toda a cadeia precisa acompanhar. Enfrentamos um problema estrutural há três anos: há falta de mão de obra na aviação”, disse o executivo.
O gargalo atinge modelos populares como o King Air e diversos tipos de jatos executivos. Segundo Ferreira, compradores preferem pagar o preço de uma aeronave nova para receber um avião seminovo imediatamente.
“As companhias aéreas regulares estão passando pela mesma dificuldade, bem como as aviações militares no mundo todo”, apontou o head da Timbro.
Donos de aeronaves usadas aproveitam a situação para manter preços elevados. Quem esperou até três anos na fila para receber sua aeronave não aceita vendê-lo por valores baixos, mantendo a paridade de preços entre novos e usados.
Na Timbro, que se tornou a maior importadora de aeronaves do Brasil em 2024, 60% das operações envolvem aeronaves usadas, versus 40% de novas.
Essa proporção reflete diretamente o impacto dos prazos estendidos de entrega dos fabricantes no comportamento dos compradores, segundo Ferreira.
A empresa importou 105 aeronaves em 2024, representando 25% das 400 aeronaves que entraram pelo porto de Vitória no ano passado. O volume equivale a uma média de duas aeronaves por semana, com atendimento a clientes em todo o país.
Os Estados Unidos seguem como principal origem das aeronaves importadas, mas a Timbro já trouxe aeronaves de asa fixa e rotativa de Europa, Nova Zelândia, Tailândia, América do Sul e África do Sul.
A Timbro é parceira oficial da Cirrus Aircraft, fabricante americana de aviões executivos pequenos, como os modelos monomotores a pistão SR20, SR22 e SR22T, muito populares na aviação executiva.
Os preços de aeronaves usadas subiram no período pós-pandemia e se mantêm em patamar elevado.
Ferreira disse que atualmente existe maior disponibilidade de opções no mercado de usados, com preços ligeiramente menores, mas ainda distantes dos valores pré-pandemia.
“Durante a pandemia, a situação era ainda mais crítica: praticamente qualquer aeronave colocada no mercado era vendida imediatamente”, recordou.
Demanda do agro
O agronegócio representa o principal segmento de compradores da Timbro, incluindo produtores rurais e empresas relacionadas ao setor. Segundo Ferreira, praticamente todos os segmentos mantêm alguma conexão com o agro, seja diretamente ou por meio de propriedades e investimentos rurais.
A carteira inclui também construtoras e empresas do setor financeiro e novos entrantes no mercado de aviação executiva - estes descobriram a conveniência do transporte aéreo após a pandemia, inicialmente por meio de fretamentos, e passaram a adquirir equipamentos próprios.
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A Timbro registra clientes recorrentes que realizaram entre três e quatro importações desde 2021 - e que costumam fazer upgrades em suas aeronaves. O movimento demonstra como novos usuários se familiarizam com a aviação executiva e expandem gradualmente suas operações, segundo o head.
A volatilidade cambial, por sua vez, adiciona complexidade ao cenário de preços, especialmente considerando que a Timbro possui entregas programadas até 2027. Clientes iniciam negociações com determinada cotação do dólar, mas podem enfrentar valores diferentes na data de entrega final.
O sistema de pagamento prevê entrada de aproximadamente 15% do valor total para aeronaves novas e 10% para usadas, com parcelas subsequentes até a entrega.
Quando o dólar apresenta quedas, clientes aproveitam para antecipar remessas aos fabricantes, aproveitando a variação cambial favorável.
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Concorrência no mercado
A empresa manteve operações normalizadas mesmo durante o período de incerteza sobre tarifas comerciais entre Estados Unidos e Brasil. A preocupação com possíveis tarifas de 50% levou alguns clientes a aguardar, mas a exclusão das aeronaves das sobretaxas permitiu continuidade dos negócios, segundo o head da Timbro.
Os helicópteros representam 10% do negócio da Timbro, segmento que apresenta crescimento tanto em modelos novos quanto usados. A demanda inclui aplicações em centros urbanos e atividades específicas como transporte para pedreiras no setor de rochas ornamentais, contou Ferreira.
A competição entre empresas de importação intensificou-se com a entrada de trading companies que obtiveram recentemente o Cotepe (benefício fiscal) para atuar com aeronaves com redução ou isenção de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços).
Essas empresas, distribuídas pelo território nacional, exercem impacto sobre o mercado apesar de operarem volumes menores.
A Sertrading, adquirida pelo BTG Pactual (BPAC11) no ano passado, é uma das empresas que possuem todas as licenças necessárias para a importação e a exportação de aeronaves com o benefício do Cotepe.
Geograficamente, a Timbro concentra operações em cidades como Goiânia e Belo Horizonte, com crescimento regional que ocorre de forma orgânica por meio de indicações de clientes. O processo expande naturalmente a presença da empresa em novas praças.
Para 2025, a projeção indica volume próximo ao recorde do ano anterior, mas provavelmente sem superá-lo. Ferreira disse atribuir essa expectativa ao que descreveu como natureza cíclica do mercado - mas também a possíveis atrasos em oficinas para modelos usados ou fábricas para aeronaves novas.
Mercado de eVTOLs
A Timbro acompanha o desenvolvimento de aeronaves elétricas por meio de conversas com fabricantes, incluindo a brasileira Eve, subsidiária da Embraer.
Ferreira disse considerar o mercado de aeronaves elétricas como “um caminho sem volta”, mas destacou a necessidade de regulamentação, certificação e adequação da infraestrutura aérea antes da viabilização comercial.
A estratégia da Timbro é pensada para que tenha condições de “entrar facilmente” assim que as aeronaves elétricas se tornarem uma realidade comercial, em um mercado que promete transformar a aviação executiva nos próximos anos.
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