Expansão da soja brasileira ameaça preços no mercado global

Colheita recorde de 177,1 milhões de toneladas de soja deve ser alcançada na safra que começa no início de 2026, o que aumenta a possibilidade de um excesso de oferta

Maquinário de colheita de soja no campo
Por Dayanne Sousa - Meg Lopes
11 de Dezembro, 2025 | 12:29 PM

Bloomberg — Agricultores brasileiros acostumados a perseguir safras recordes de soja passaram a ser confrontados com uma nova preocupação: a ameaça de produzir mais do que o mundo pode absorver num momento em que o presidente dos EUA, Donald Trump, reformula o comércio global.

Uma safra recorde de 177,1 milhões de toneladas de soja deve ser colhida na temporada que começa no início de 2026, disse a Conab nesta quinta-feira (11) — um pequeno corte ante estimativas anteriores a ainda um aumento de 3,3% em relação ao ano anterior. Isso aumenta a possibilidade de um excesso de oferta que pode derrubar os preços.

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“Estamos crescendo em uma escala maior do que a demanda”, afirmou Thiago Facco, vice-presidente do grupo de produtores Aprosoja Tocantins. Ele disse que, embora a produção deste ano atenda bem às necessidades do mercado, “em um futuro muito próximo teremos um excedente”.

O superávit iminente ameaça pressionar os preços globais para baixo em um momento de geopolítica frágil, enquanto Trump pressiona Pequim a comprar mais soja.

A nação asiática vem há anos se deslocando em direção à América do Sul, e uma onda de oferta ainda mais barata do Brasil intensificaria ainda mais a competição para os agricultores dos EUA.

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Por outro lado, se a China realizar grandes compras de soja americana pouco antes da colheita brasileira, corre o risco de ver estoques se acumularem na América do Sul exatamente como aconteceu na América do Norte mais cedo neste ano, enquanto agricultores aguardavam um acordo entre Trump e o líder chinês Xi Jinping. Isso pode reduzir ainda mais a rentabilidade dos produtores brasileiros, que já enfrentam custos crescentes e juros elevados.

“Em 2025, o Brasil teve uma safra excepcional, mas exportou muito bem porque havia uma guerra comercial”, disse a analista da AgRural, Daniele Siqueira. “Para 2026, não há essa garantia”, acrescentou. “O Brasil pode ter um excesso de oferta que poderá pressionar os preços.”

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Os futuros negociados em Chicago subiram cerca de 8% neste ano, mas recentemente reduziram ganhos, já que as compras chinesas de remessas dos EUA ficaram muito aquém dos 12 milhões de toneladas prometidos até o fim da temporada. Os EUA dizem que a nação asiática também se comprometeu a comprar ao menos 25 milhões de toneladas por ano pelos próximos três anos.

“Se o potencial para uma safra recorde na América do Sul for confirmado, podemos ver algum tipo de realização de preços em Chicago”, disse Francisco Queiroz, analista do banco Itaú BBA.

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A maioria dos analistas concorda que o Brasil caminha para uma safra abundante, com a consultoria Agroconsult estimando recentemente a produção em 178 milhões de toneladas. Isso é mais do que as 175 milhões de toneladas estimados pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).

Se os números mais altos se confirmarem, o Brasil pode ajudar a compensar um declínio esperado na produção global em comparação com a temporada anterior, que foi recorde segundo o USDA.

O clima continua sendo um fator imprevisível. Chuvas irregulares ligadas ao fenômeno La Niña podem prejudicar o desenvolvimento das lavouras no sul do Brasil e na Argentina.

Se não ocorrer uma quebra significativa de safra antes do avanço da colheita na maior parte do Brasil, em fevereiro, o país provavelmente terá de lidar com estoques crescentes.

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Segundo a associação de indústrias esmagadoras de soja Abiove, os estoques finais de soja do Brasil em 2026 devem atingir o maior nível em nove anos. Isso mesmo com a expectativa de que a indústria local processe mais grãos para atender ao aumento do mandato de mistura de biodiesel no país.

As exportações brasileiras de soja dispararam em 2025, já que compradores chineses ampliaram aquisições da safra nacional em meio às tensões comerciais com os EUA. O país embarcou um recorde de 104,8 milhões de toneladas de soja neste ano até novembro, e 79% desse volume teve como destino a China.

O Brasil continuou ampliando a área plantada de soja, mesmo com o aumento dos custos de produção decorrente de preços mais altos de fertilizantes e com os juros elevados levando a níveis de endividamento maiores entre os produtores. O país deve colher 48,9 milhões de hectares de soja, 3,4% a mais que na temporada anterior, segundo a Conab.

Ao contrário dos EUA, onde agricultores alternam área entre soja ou milho, no Brasil a oleaginosa enfrenta pouca concorrência de outras culturas. Em vez disso, o sol durante praticamente todo o ano permite que a maioria dos produtores colha duas safras anuais: uma de soja e outra de milho.

“As margens estão muito apertadas, às vezes até negativas para a soja”, disse o agricultor Lucas Beber, presidente do grupo de produtores no maior estado produtor, Mato Grosso. “A esperança está no milho.”

Embora agricultores que planejaram expandir sua área recentemente dificilmente desistam, margens fracas provavelmente forçarão os produtores brasileiros a desacelerar o ritmo de expansão, disse Felipe Jordy, gerente de consultoria de mercado e inteligência da Biond Agro.

“Quem já está trabalhando na abertura de novas áreas não vai parar, mas vai desacelerar, e vai reavaliar algumas áreas”, afirmou Jordy.

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