Bloomberg Opinion — Jair Bolsonaro está enfrentando seu acerto de contas.
O processo final contra o controverso ex-presidente, que começou na terça-feira (2), deve ser concluído em 12 de setembro, mas o veredicto já parece estar escrito: Bolsonaro provavelmente será considerado culpado de conspirar para dar um golpe após perder as eleições de 2022 para o rival Luiz Inácio Lula da Silva.
Ele certamente insistirá que sua condenação é obra de uma conspiração das poderosas elites brasileiras. E, para ser justo, o Supremo Tribunal Federal já excedeu seus limites, tomando várias decisões controversas nos últimos anos que violaram o devido processo legal ou equivaleram a uma censura flagrante – tudo em nome da defesa da democracia.
Mas mesmo que essa crítica seja válida, ela não responde a uma questão prática incômoda para Bolsonaro, que negou qualquer irregularidade: como um líder que conquistou mais de 58 milhões de votos e perdeu a eleição por uma margem mínima acabou enfrentando a possibilidade de prisão em vez de saborear a perspectiva de um retorno político?
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A verdade está em suas próprias escolhas paranóicas: se Bolsonaro tivesse governado com moderação – em vez de minar as instituições a cada passo, incluindo a estratégia de vacinação de seu próprio governo durante a pandemia –, ele poderia ter superado Lula na disputa acirrada de 2022.
Se ele tivesse simplesmente aceitado a derrota em 2022, em vez de se entregar à negação e a excêntricas conspirações, ele estaria em posição privilegiada para um retorno triunfante nas eleições presidenciais de 2026, principalmente após o desempenho sem brilho de Lula em seu terceiro mandato.
Em vez disso, o líder conservador de 70 anos está proibido de concorrer a cargos públicos até 2030 por espalhar desinformação sobre o sistema eleitoral e agora pode passar décadas preso.
Visto desta forma, a situação de Bolsonaro decorre menos de seus poderosos inimigos do que de suas próprias decisões estratégicas equivocadas. Ele jamais admitirá, mas só pode culpar a si mesmo pelo destino que o aguarda.
É claro que alguns argumentarão que, se ele não atacasse a democracia, não seria Bolsonaro. Ele há muito tempo rejeita os valores republicanos; essa rebeldia contra o establishment é precisamente o que atraiu eleitores desconfiados da autoridade, encantados com sua autenticidade simples.
Como disse Christopher Garman, managing director para as Américas do Eurasia Group: “o ingrediente secreto que o elegeu é o que o está levando à prisão. Ele tem esse DNA anti-establishment – e isso deu no que deu”.
Mesmo assim, a magnitude de seus erros é impressionante para alguém que continua surpreendentemente popular: uma pesquisa recente da AtlasIntel para a Bloomberg News mostra que, em um hipotético segundo turno em 2026, Bolsonaro empataria com Lula se ele pudesse concorrer no próximo ano. Mas ele não pode.

Considere o último erro de Bolsonaro: recrutar a Casa Branca de Donald Trump, por meio de seu filho Eduardo, para punir o Brasil e o ministro do Supremo Alexandre de Moraes, que é o relator de seu caso.
Quem quer que tenha pensado que essa era uma boa ideia só agravou seus problemas. A medida deu vida ao governo combalido de Lula, afastou eleitores indecisos ao colocar vinganças pessoais acima do interesse nacional e até mesmo arriscou dividir a direita antes de 2026.
Certamente, isso não ajudou em nada a melhorar suas próprias perspectivas jurídicas. Mesmo levando em conta o desespero, a pergunta permanece: por que ele continua cavando quando já está no fundo do poço?
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Bolsonaro e Trump têm muito em comum: ambos sobreviveram a tentativas de assassinato, ambos afirmam ser vítimas de caça às bruxas judiciais, ambos fizeram campanha como outsiders e tentaram subverter o sistema quando estavam no poder, e ambos se recusaram a aceitar as derrotas eleitorais, tolerando tentativas de insurreição por parte de seus seguidores.
No entanto também existem algumas diferenças importantes: Trump continua sendo um ímã de mídia carismático, capaz de atrair a atenção global devido à sua gigantesca megalomania; Bolsonaro, não.
E embora as ações de Trump frequentemente revelem cálculos políticos cínicos, o desprezo de Bolsonaro por qualquer coisa fora de seus dogmas é sincero, quase inevitável.
Crucialmente, os presidentes brasileiros não são tão poderosos quanto seus pares americanos, nem o país protege a liberdade de expressão com o mesmo absolutismo garantido pela Primeira Emenda da Constituição dos EUA.
Bolsonaro pode ter sonhos selvagens de ser um imperador brasileiro, mas, como demonstra sua tentativa fracassada de permanecer no poder, as instituições têm a capacidade de contê-lo. Ele pode ter tentado tomar à força o que não conseguiu conquistar com habilidade política — mas, mais uma vez, calculou mal até onde os tribunais iriam para detê-lo.

Dito isso, Bolsonaro ainda tem uma poderosa carta na manga: influenciar as eleições. Com apenas 13 meses até a votação, ele precisa decidir se apoia o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, o candidato mais forte da direita e favorito dos investidores, ou se indica um membro da família — sua esposa Michelle ou um de seus filhos.
A primeira opção dá ao seu movimento conservador um concorrente confiável, mas corre o risco de diluir a influência de Bolsonaro no próximo governo; a segunda garante lealdade, mas provavelmente enfraquece a chapa contra um Lula ressurgente no que se espera ser mais uma disputa acirrada.
“Está empatado, e Bolsonaro vai decidir. Ele ainda tem muito capital político”, me disse Garman, da Eurasia, observando que o índice atual de aprovação de Lula, acima de 40%, lhe dá uma ligeira vantagem para 2026.
Se a história servir de guia, não espere que Bolsonaro tome uma decisão pragmática. Estratégia racional nunca foi seu ponto forte.
Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Juan Pablo Spinetto é colunista da Bloomberg Opinion e cobre negócios, assuntos econômicos e política da América Latina. Foi editor-chefe da Bloomberg News para economia e governo na região.
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