Demanda justifica investimento de R$ 100 mi no Brasil, diz CEO global de saúde da Merck

Peter Guenter, que comanda a divisão de Healthcare da empresa alemã, diz à Bloomberg Línea que o país e a América Latina vão continuar a crescer de forma estrutural

Grupo alemão vai investir na fábrica de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, para elevar a produtividade. Foto: Merck/Divulgação
20 de Junho, 2023 | 01:23 PM

Bloomberg Línea — Em um ambiente de inflação e custos elevados, a farmacêutica alemã Merck se prepara para capturar o aumento de demanda esperado para o mercado brasileiro. O grupo vai investir R$ 100 milhões de 2023 a 2025 em sua fábrica em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, para buscar crescimento, afirma o CEO global de Healthcare da Merck, Peter Guenter, em entrevista exclusiva à Bloomberg Línea.

“Nos últimos dois anos, a América Latina apresentou o crescimento mais acelerado dentro do grupo e a razão é muito clara, há mais diagnósticos e tratamentos disponíveis. Estruturalmente, o setor farmacêutico, de healthcare, vai continuar crescendo na região e no Brasil”, disse o executivo.

Globalmente, a receita líquida do grupo aumentou 12,9% em 2022, para 22,2 bilhões de euros. O Brasil representa 33% do negócio healthcare da Merck na América Latina.

Segundo Guenter, o cenário global tem afetado toda a indústria. “Como uma empresa global, estamos monitorando de perto questões geopolíticas, como a relação entre Estados Unidos, Europa e China. A inflação e os juros também são uma preocupação para nós, impactam nosso custo, por isso é importante que a empresa permaneça disciplinada para adaptar os preços.”

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No Brasil, onde o grupo completou 100 anos de atividades, o executivo demonstra otimismo diante da expectativa de crescimento da demanda dos chamados medicamentos “estabelecidos”, que são usados para tratamento de doenças como diabetes e problemas cardiovasculares, por exemplo.

“A demanda para esses produtos é alta, temos que garantir que poderemos sustentar os volumes do mercado. Por isso estamos fazendo esse investimento”, explicou.

Guenter disse que a fábrica do Rio, que opera desde a década de 1970, é de grande relevância para o grupo. Entre 2020 e 2022, a empresa investiu cerca de R$ 180 milhões na unidade fabril principalmente na renovação da infraestrutura e no aumento da eficiência, reduzindo o consumo de energia e de água.

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O plano para este ano é produzir quatro bilhões de comprimidos do medicamento para diabetes (165 milhões de embalagens) na unidade industrial no Rio. “Nosso remédio para diabetes é líder no Brasil, vendemos tanto para o mercado privado quanto para o público, através do programa Farmácia Popular”, disse.

Segundo o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma), a venda de medicamentos para tratamento de diabetes das fabricantes para as farmácias somou 448,3 milhões de caixas nos 12 meses encerrados em abril deste ano. A venda total da indústria para as farmácias, em 2022, somou R$ 106,78 bilhões, conforme dados da consultoria IQVIA.

Guenter afirmou que a maior fatia da receita de healthcare na região vem de medicamentos estabelecidos, cuja demanda deve continuar crescendo. Já o segmento de remédios especiais, usados no tratamento de doenças como câncer e esclerose múltipla, também deve contribuir para o crescimento no Brasil e na América Latina.

“Estamos muito felizes com o desempenho na região. O Brasil é relevante não só por causa das vendas mas porque temos a cadeia de valor completa no país”, disse Guenter, referindo-se à fábrica, à atividade comercial e à investigação clínica (área de P&D).

Ele disse que o portfólio da Merck é sistematicamente exposto à investigação clínica na região por meio de aproximadamente 160 pontos que contribuem com os testes da companhia. São hospitais-escola, universidades, entre outros, onde as pesquisas são realizadas por meio de parcerias. “Se o país participa dos testes clínicos, é criado todo um sistema para apoiar os pacientes e a academia.”

Patentes

Guenter afirmou que na área de novos produtos a Merck está em fase avançada de desenvolvimento (fase III) de um medicamento para esclerose múltipla, que deve chegar ao mercado em meados de 2025. Segundo o executivo, o remédio tem obtido bons resultados para tratar o progresso silencioso da doença. “Se aprovado, esse medicamento pode ser um game changer”, disse.

Outro medicamento que está avançado (fase III) é destinado ao tratamento de câncer de cabeça e pescoço, que potencializa a ação da radioterapia e da quimioterapia. “Também esperamos que chegue ao mercado em 2025, o medicamento vai renovar nosso negócio de oncologia”, disse o executivo, ressaltando que a expectativa de chegada ao mercado depende de aprovações regulatórias de cada país.

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Guenter observou que os medicamentos cujas patentes já expiraram são de suma importância para o negócio da companhia, uma vez que continuam gerando receita para financiar a pesquisa e o desenvolvimento de novos remédios.

“Quando olhamos para o nosso portfólio de produtos estabelecidos, a patente da maioria já expirou. Tipicamente, nesses casos, vem a competição com genéricos, os preços caem e a companhia perde algum market share. Posteriormente, o mercado se estabiliza e temos um crescimento sobre uma nova base”, explicou.

“Alguns de nossos produtos de oncologia e esclerose múltipla ainda estão protegidos, mas estão no fim [da propriedade intelectual]. Por isso é importante que façamos investimentos em novos produtos”, acrescentou.

O executivo diz, contudo, que sem propriedade intelectual não haveria inovação. “Se queremos inovação no futuro, temos que garantir que haja um ambiente em que estejamos protegidos, pelo menos por um tempo, para realizar os investimentos”, avalia.

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O CEO da Merck Healthcare ponderou que não é possível garantir que um medicamento que está sendo desenvolvido chegará ao mercado. “Esse é um risco inerente ao nosso negócio.”

Em sua avaliação, outro risco para o setor é a instabilidade política. “A indústria farmacêutica trabalha com ciclos muito longos. Quando decidimos pelo investimento na pesquisa de uma nova molécula, levará mais de 10 anos para esse produto atingir o mercado”, disse. “Estabilidade política e previsibilidade são importantes, não podemos ter mudanças draconianas nas políticas do setor. Também é essencial dar continuidade a bons programas, como o Farmácia Popular.”

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.