Apoiadores de Bolsonaro invadiram o Congresso, o Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto
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Bloomberg Opinion — Enquanto o Brasil amargava os prejuízos dos danos causados pelos apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, foi difícil não fazer paralelos com a insurreição no Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021 – até porque ambos os incidentes foram fomentados pela atividade nas mídias sociais.

Os usuários brasileiros do WhatsApp, da Meta (META), assim como do Telegram e do TikTok, viram um aumento nas chamadas para assistir a uma “festa de gritos de guerra” na capital nos dias que antecederam a violência de domingo (8) em Brasília, de acordo com o Washington Post.

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Mesmo antes disso, antes das eleições presidenciais de outubro, o Twitter, o Facebook e o WhatsApp haviam sido inundados de desinformação sobre a integridade do sistema eleitoral do Brasil, que viu a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva sobre Bolsonaro por uma margem muito pequena.

Mas não é só a Meta.

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Uma pesquisa pela hashtag #bolsonaro no TikTok na manhã da segunda-feira (9) manhã trazia pelo menos dois vídeos populares elogiando os invasores como “patriotas” ou “guerreiros pela liberdade”. Os canais do YouTube que divulgam as alegações de Bolsonaro sobre fraude eleitoral conquistaram dezenas de milhões de visualizações antes da eleição.

E os negacionistas das eleições receberam uma onda de seguidores no Twitter, de acordo com uma análise do Rest Of World, uma organização jornalística sem fins lucrativos.

Tudo isso destaca o maior problema: as empresas de mídia social ainda não estão investindo o suficiente no controle da desinformação que pode viralizar, confiando em métodos mais baratos como software e funcionários para eliminar conteúdo prejudicial e subfinanciando criticamente esses esforços fora dos EUA.

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A denunciante Francis Haugen, que expôs uma série de danos negligenciados pelo Facebook em 2021, focou nos esforços inadequados da empresa para combater a desinformação em países como a Índia. Ela fez advertência sobre as próximas eleições pelo mundo e disse que o site “abafa o problema e fornece defesas desiguais e inadequadas”.

No caso do Twitter (TWTR), o novo proprietário, Elon Musk, demitiu os funcionários brasileiros depois que assumiu o controle da mesma.

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Ironicamente, Facebook e Twitter deram passos impressionantes para evitar que grandes campanhas de desinformação perturbassem as eleições de meio de mandato dos EUA em 2022, de acordo com várias pesquisas. Mas, em outros lugares, essas plataformas deixam muito a desejar.

“Às vezes vemos o mesmo conteúdo em espanhol e português, mesmo quando seu homólogo em inglês já foi derrubado”, diz Roberta Braga, uma pesquisadora da Equis Research, um grupo de pesquisa de opinião com foco em latinos.

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“O foco não é tão intenso como nos EUA”, diz Jiore Craig, que faz pesquisas eleitorais para o Institute for Strategic Dialogue, um think tank de Londres que rastreia desinformação online.

Ele afirma que as narrativas online que levaram aos tumultos no Brasil pareciam semelhantes àquelas usadas antes da invasão de 6 de janeiro e também apareceram antes das eleições na França e na Austrália, onde os cartazes usam linguagem como “traidores” e “fraude” e hashtags em inglês como #StopTheSteal (#ParemDeRoubar, em tradução livre).

Uma grande diferença com os EUA é que o WhatsApp se tornou uma das plataformas mais populares para divulgar desinformação sobre as eleições, de acordo com Braga.

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Embora os brasileiros mais radicais tenham migrado para o Telegram, um aplicativo de transmissão de mensagens e informações menos restritivo, para se envolverem com grupos de pessoas com ideias semelhantes, a grande maioria usa o WhatsApp para se comunicar com amigos e familiares e conduzir negócios, e no qual muitas narrativas negacionistas ganharam posição de destaque.

Braga, cuja própria família e amigos no Brasil se tornaram apoiadores radicalizados do Bolsonaro, diz que o WhatsApp poderia fazer mais para reduzir o alcance de suas ferramentas de transmissão, o que “exacerba a circulação da desinformação”.

Desde 2018, o WhatsApp vem tentando impor limites mais rígidos ao envio de mensagens para dificultar a disseminação de desinformação sobre o sistema eleitoral ou as vacinas contra covid-19. O aplicativo também traz um alerta quando o conteúdo é “encaminhado com frequência” para ajudar a frear a disseminação de boatos e notícias falsas.

A empresa deveria fazer mais, mas isso significaria perturbar os defensores da liberdade de expressão e privacidade: muito do conteúdo radicalizado está sendo disseminado em grupos privados que o WhatsApp não pode ver nem interferir, uma vez que todas as comunicações são criptografadas.

O que complica a situação é que o conteúdo viral no WhatsApp ou Telegrama muitas vezes começa em outro lugar, como o YouTube ou o TikTok. “A maior parte da atividade cruza as plataformas”, diz Craig. “Num lugar você pode ver a narrativa e no outro você amplia a narrativa. Derrubar uma não derruba a outra.”

Para enfrentar o problema, as empresas de mídia social precisarão intensificar os esforços para se comunicarem umas com as outras sobre as próximas eleições e as alegações de fraude eleitoral. Os pesquisadores também dizem que as empresas de mídia social precisam ser mais transparentes sobre como o conteúdo flui e ganha tração em seus sites, para ajudá-las a encontrar novas maneiras de impedir que isso se torne fora de controle.

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Mas uma grande parte do problema também está fora de suas mãos. Bolsonaro – assim como Donald Trump – lançou grande parte das bases para a narrativa da eleição fraudada, tendo passado meses reclamando tratamento injusto às mãos da autoridade eleitoral do Brasil.

“O que estamos vendo no Brasil é muito semelhante ao que vimos nos EUA”, diz Braga: “a trajetória de como a narrativa da fraude eleitoral penetrou na sociedade, e os tipos de influenciadores que a difundiram”.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Parmy Olson é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre tecnologia. Já escreveu para o Wall Street Journal e a Forbes e é autora de “We Are Anonymous”.

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