Fortunas, cripto e dividendos: os planos do BB às vésperas do governo do PT

Executivos do banco estatal apresentam temas prioritários para o próximo ano dentro do plano estratégico de crescimento da gestão atual

Banco do Brasil alcança rentabilidade de 21,80%, atrás apenas do BTG Pactual, que teve 22% e tem perfil de banco de investimento, e não de varejo
10 de Novembro, 2022 | 03:22 PM

Bloomberg Línea — Os principais executivos do Banco do Brasil apresentaram nesta manhã de quinta-feira (10) alguns planos para o banco estatal, controlado pela União, às vésperas do início do novo governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do PT.

Investimentos na gestão de grandes fortunas, projetos envolvendo criptoativos, segmento ainda carente de regulamentação no Brasil, e a manutenção de uma política de pagamento de dividendos elevados aos acionistas foram tópicos abordados pelo atual CEO do BB, Fausto Ribeiro, e sua equipe durante a teleconferência com investidores e analistas sobre o resultado do 3º trimestre.

O BB já está envolvido no processo de transição de poder no governo federal, que toma posse no próximo dia 1º de janeiro. O CEO disse que o prédio do Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, foi cedido para a equipe do presidente eleito, a pedido da Casa Civil do governo Bolsonaro.

Ribeiro afirmou ainda que vai centralizar o fluxo de informações solicitadas pelo comitê de transição, mas que até o momento não houve nenhum pedido sobre dados específicos relativos ao BB. “Não tivemos ainda interação, mas acredito que isso ocorra nas próximas semanas”, previu.

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O banco público de capital misto (com quase 1 milhão de acionistas privados, entre pessoas físicas e grandes investidores estrangeiros) trabalha com o cenário-base de manutenção de um “payout” (percentual de lucro distribuído aos acionistas) de 40%.

Neste ano, o BB já distribuiu R$ 8,5 bilhões em remuneração. Até o início do próximo ano, esse “payout” poderá ser revisado, mas a administração do BB disse hoje que o cenário-base é de manutenção desse patamar.

Na semana passada, a divulgação do pagamento de dividendos da Petrobras (PETR4), estatal de capital misto como o BB, foi criticada publicamente pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann, que classificou a distribuição dos proventos como “sangria”. O assunto virou um pedido de suspensão do pagamento no TCU (Tribunal de Contas da União). Durante a campanha, o partido do presidente eleito defendeu a taxação de dividendos e grandes fortunas.

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Sem mencionar o debate público sobre o risco de taxação de dividendos, a administração do BB explicou que a política de remuneração segue uma avaliação técnica sobre as exigências de capital e o nível de apetite ao risco da instituição, sendo revisada uma vez por ano pelo conselho de administração no contexto de elaboração do orçamento do banco.

Essa discussão é importante porque o BB divulgou, ontem, um lucro de R$ 8,4 bilhões, aumento de 62,7%, com uma rentabilidade medida pelo ROE (retorno sobre patrimônio) de 21,8%, o segundo melhor do setor, atrás apenas dos 22% divulgados ontem pelo BTG Pactual, que é bem menos exposto ao varejo por seu perfil de banco de investimentos.

Hoje, Lula descartou que o BB será privatizado em seu governo, durante discurso em encontro com aliados no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil), em Brasília, em sua primeira visita ao local.

“Quero dizer para vocês que as empresas públicas brasileiras serão respeitadas. A Petrobras não vai ser fatiada, quero dizer que o Banco do Brasil não vai ser privatizado, assim como a Caixa Econômica e o BNDES, o BNB e o Basa voltarão ser bancos de investimento, inclusive para pequenos e médios empreendedores”, disse o presidente eleito.

Grandes fortunas

Outro ponto destacado pelo CEO do BB é a parceria com o banco suíço UBS, que está em seu segundo ano, acumulando 345 mil transações, com atuação na área de private banking. Essa joint venture com o UBS pode evoluir para uma oferta de produtos e serviços no mercado norte-americano, segundo o CEO, com foco em atender clientes com grandes fortunas no exterior.

Segundo Ribeiro, a ideia é buscar outras parcerias estratégicas, além do UBS, para captar mais clientes pessoas físicas e jurídicas em segmentos para o público de maior poder aquisitivo principalmente nos EUA.

Durante a campanha eleitoral de Lula, o papel dos bancos públicos foi um dos pontos explorados pela agenda econômica do candidato, com reforço ao discurso de um foco prioritário em outro perfil de clientela, mais voltado para a baixa renda e pequenos e médios produtores rurais.

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No terceiro trimestre, a carteira de crédito do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) teve um menor ritmo de crescimento (+13,4% em 12 meses), na comparação com operações de custeio (+53,7%) e de investimento (+59,3%). A carteira ampliada de agronegócios cresceu 26,7% em 12 meses, o que é visto pelo mercado como uma linha defensiva do banco diante do momento positivo do setor agrícola.

“A carteira do BB é diferente dos seus pares privados, principalmente porque há uma concentração do agronegócio, que é defensivo. Por outro lado, bancos como Santander e Bradesco têm uma exposição maior em pequenas e médias empresas e pessoas físicas, que em momentos de adversidade econômica são mais afetados”, apontou o analista José Eduardo Daronco, da Suno Research.

Criptoativos

Na apresentação do balando do 3º trimestre, o CEO do BB também destacou, sem revelar o valor, o investimento estratégico na Bitfy, startup brasileira especializada em infraestrutura para operações com blockchain e criação de aplicações utilizando a tecnologia blockchain. Segundo o CEO, o investimento na Bitfy “abre possibilidades para atuar com criptoativos”.

O aporte foi o primeiro realizado através do BB Impacto ASG, fundo de Corporate Venture Capital do BB que, tem a gestão da VOX Capital.

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Indagado na teleconferência por Bloomberg Línea se este era o melhor momento para o investimento diante da falta de regulamentação dos criptoativos no país e a atual crise das exchanges do segmento no exterior, o CEO respondeu que o programa de venture capital do banco ainda é o “mais acanhado”, de R$ 260 milhões como orçamento.

“Estamos buscando parcerias para colocar o banco no futuro, investir em agentes de inovação, ganhar know-how em tecnologias de blockchain e tokenização de ativos”, afirmou Ribeiro.

O BB Impacto ASG prioriza empresas nos estágios Seed e Série A, e a previsão é ter até 15 empresas no portfólio, segundo comunicado do BB.

Fundada em 2017 por Lucas Schoch, a Bitfy possui entre os investidores a Borderless Capital, Algorand Capital e Dash Investment Foundation, especializados no mercado blockchain. A startup informa que facilita a relação de empresas com esse ecossistema de inovação em blockchain, permitindo o desenvolvimento de soluções para troca de valor ou informação.

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Durante a campanha, Lula declarou que “o governo, especialmente o Banco Central autônomo, deveria criar normas alinhadas ao padrão internacional para evitar práticas ilegais que podem fazer uso dos criptoativos, como lavagem de dinheiro e evasão de divisas, além de evitar práticas de negociação frauduletas” e que o papel do governo seria de “monitorar o impacto do mercado de criptoativos na saúde do sistema financeiro”.

A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) publicou, no mês passado, o Parecer de Orientação 40, que traz o entendimento da autarquia sobre as normas que incidem sobre os criptoativos considerados valores imobiliários, além de apresentar regras sobre a fiscalização e disciplina dos agentes de mercado. Advogados que acompanham o tema explicam, porém, que ela não representa uma nova regulamentação ou um marco regulatório da indústria de criptoativos, ainda pendente de aprovação no Congresso.

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(Atualiza às 16h25 com declarações de Lula)

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.