Lula vs. Bolsonaro: saiba como foi o primeiro debate no 2º turno

Programa transmitido pela Band foi marcado por ataques sobre governos passados em detrimento de propostas concretas, especialmente na área econômica

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Bloomberg Línea — O primeiro debate do segundo turno das eleições deste ano entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Lula (PT), realizado na noite deste domingo (16), foi marcado por embates entre os dois candidatos, em detrimento da discussão de propostas.

Entraram em pauta temas como combate à pandemia, corrupção, política de preços da Petrobras (PETR3, PETR4), meio ambiente e educação, mas questões econômicas acabaram deixadas de lado.

O debate, organizado por um pool de veículos de comunicação, foi o primeiro entre os presidentes com o novo formato criado pela Band: em vez de apenas responder perguntas, os candidatos têm 15 minutos livres no primeiro e no último blocos e podem se movimentar pelo estúdio.

O novo modelo, proposto pelo jornalista Fernando Mitre, diretor de redação da Band, já havia sido testada nos debates entre candidatos a governador. O pool é formado pelas TVs Band, CNN e Cultura, pelo jornal Folha de S.Paulo e pelo portal UOL. A transmissão foi feita pela Band.

Veja a seguir os destaques do debate por temas:

Declaração de Bolsonaro sobre venezuelanas

A disputa entre os dois candidatos começou já antes do início do debate. Bolsonaro disse a jornalistas, antes de entrar no estúdio, que tinha passado as “piores 24 horas” de sua vida.

Durante o fim de semana, circulou nas redes sociais trecho de uma entrevista em que o presidente diz que “pintou um clima” entre ele e duas “meninas bonitinhas de 14, 15 anos” em uma comunidade no entorno de Brasília. A campanha do PT, então, divulgou o trecho em sua propaganda e chamou o presidente de pedófilo. “Uma acusação infâmia, sórdida, de pedofilia”, disse Bolsonaro aos jornalistas.

Lula foi ao debate com um broche da Faça Bonito, uma campanha de combate ao abuso sexual de crianças e adolescentes, na lapela do paletó. No debate, Bolsonaro leu decisão do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, deste domingo que determinou que as plataformas de redes sociais tirarem o vídeo do ar.

Vacinação e combate à pandemia

O petista conduziu o primeiro bloco do debate, que costuma ter mais audiência que os demais. E elegeu como tema a pandemia. Lula disse que Bolsonaro atrasou a compra das vacinas contra a Covid-19, o que acabou postergando o início das vacinações e evitou que houvesse menos mortes, como de fato passou a acontecer no país depois que as doses passaram a ser aplicadas na população.

Segundo levantamento do infectologista Pedro Hallal, da Universidade Federal de Pelotas, cerca de 400 mil mortes por covid poderiam ter sido evitadas se o governo federal tivesse seguido as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para combater a pandemia.

Lula disse: “O senhor debochou, riu, disse que quem tomasse vacina virava jacaré, homossexual, deixou as pessoas morrerem afogadas sem oxigênio em Manaus. Virou vendedor de remédio que não servia para nada. Não respeitou o Butantã e a Fiocruz, que são laboratórios de excelência”.

Bolsonaro respondeu dizendo que comprou “mais de 500 milhões de doses” de vacina e que o Brasil foi “um dos países que vacinaram mais rapidamente” - quando o Brasil começou a aplicar as vacinas, em 17 de janeiro de 2021, 57 países já haviam começado suas campanhas de vacinação. “Todas as vacinas foram compradas pelo governo federal. Nos orgulhamos desse trabalho. Salvamos milhões de vida.”

Auxílio Brasil e política fiscal

Um dos poucos momentos em que se discutiu economia no debate foi em resposta a uma pergunta do jornalista Eduardo Oinegue, que apresentou o primeiro bloco. Ele quis saber como os candidatos fariam para tirar suas propostas do papel, especialmente os programas sociais, dado que apenas 4% do Orçamento da União é livre para gastos pelo governo, sem ter um direcionamento prévio.

Bolsonaro disse que pretendia trabalhar pela aprovação de uma reforma tributária que viabilize a continuidade do pagamento do Auxílio Brasil, versão bolsonarista do Bolsa Família.

O auxílio era de R$ 400, mas foi aumentado em agosto para R$ 600 pelo Congresso, depois da aprovação de uma alteração na Constituição. Para 2023, o Orçamento da União prevê a volta do auxílio para R$ 400, mas o presidente já disse em outras ocasiões que o valor será o que está sendo pago hoje.

No debate deste domingo, Bolsonaro disse que “a origem desse dinheiro virá de uma proposta que já passou na Câmara visando a reforma tributária e que está no Senado Federal. Vamos manter essa despesa extra de forma permanente e vitalícia”.

Lula também falou em reforma tributária: “O dado importante é que se você [o governo] souber trabalhar, planejar, você vai ter o dinheiro pra fazer as coisas”.

“Ao mesmo tempo, nós temos certeza de que o Congresso vai aprovar uma reforma tributária para que a gente possa taxar menos os mais pobres, os trabalhadores - por isso que nós propomos uma isenção até R$ 5 mil reais do pagamento do Imposto de Renda -, e cobrar dos mais ricos que muitas vezes não pagam sobre o lucro, sobre o dividendo. Aí nós vamos ter dinheiro pra as políticas que nós fizemos”.

Criminalidade

O presidente também procurou atacar o petista. Em um momento, perguntou a Lula por que Marcola, um dos líderes do PCC, não foi transferido para um presídio federal em 2006, depois do assassinato de 59 policiais em São Paulo. Na época, Geraldo Alckmin (PSB), candidato a vice de Lula, era governador de São Paulo.

Lula respondeu que, durante o seu governo, construiu cinco presídios federais e disse que, se Alckmin não pediu a transferência de Marcola, “teve razão para não pedir”. A legislação que trata do tema diz que presos só podem ser transferidos de presídios estaduais para federais por decisão judicial a pedido do governador do estado ou da defesa do próprio preso.

Corrupção

Bolsonaro também procurou atacar Lula ao falar de corrupção. Disse que os acusados de corrupção na Operação Lava Jato teriam devolvido R$ 30 bilhões e que a obra de transposição do Rio São Francisco, entregue pelo seu governo, ficou parada mais de dez anos. “Foi muito dinheiro para corrupção, tudo tinha corrupção no seu governo”, disse.

Lula respondeu que o combate à corrupção não deveria destruir empresas, algo que, segundo ele, acabou sendo um dos efeito das investigações da Operação Lava Jato. Ele disse ainda que o governo dele executou cerca de 88% das obras de transposição do São Francisco, e o de Bolsonaro, 3,5%.

Orçamento secreto

Em outro momento, o jornalista Josias de Souza, do UOL, perguntou aos candidatos como eles fariam para governar “sem comprar apoio do Congresso”. Citou o esquema descoberto pela Operação Lava Jato e o chamado orçamento secreto, mecanismo por meio do qual parlamentares determinam a destinação de uma parte do dinheiro reservado pelo Executivo para emendas parlamentares. O esquema tem esse nome porque o autor do pedido de envio de dinheiro não é identificado.

Lula disse que nunca um presidente da República havia gastado tanto dinheiro para comprar apoio parlamentar. De 2021 ao fim deste ano, o orçamento secreto deve movimentar R$ 30 bilhões.

“Eu não tenho nada a ver com isso”, respondeu Bolsonaro. Segundo ele, o orçamento secreto foi criado por deputados, aprovado pelo Congresso, vetado por ele, e o veto foi derrubado por parlamentares. Depois de vetar o projeto, no entanto, o governo enviou um projeto de autoria própria para recriação do mecanismo. O texto foi assinado por Bolsonaro e pelo general Luiz Ramos, então ministro da Secretaria de Governo.

O presidente disse também que 13 deputados do PT usaram dinheiro do orçamento secreto, o que seria a prova de que ele não tem relação com o mecanismo. “Eu jamais daria dinheiro para essa turma toda aqui, se não estivesse votando comigo”, disse.

Preços dos combustíveis

A Petrobras também foi alvo de disputa entre os dois candidatos.

O atual presidente criticou a gestão de Lula na Petrobras dizendo que o petista distribuiu as diretorias entre os partidos. O ex-presidente se defendeu dizendo que “o diretor do seu partido”, em referência a Paulo Roberto Costa, indicado pelo PP, antigo partido de Bolsonaro, tinha 33 anos de Petrobras. “Foi nomeado pelo currículo”, disse Lula.

Bolsonaro disse que o Brasil estava no terceiro mês consecutivo de deflação, o que, segundo ele, foi conseguido graças à política do governo de redução de preços dos combustíveis, com a redução do teto da alíquota do ICMS para 17% - o que obedece a uma decisão do STF. Em outro momento, disse que o endividamento da Petrobras, nos governos do PT, chegou a R$ 900 bilhões.

Lula respondeu que Bolsonaro não conhece a realidade do país. “Este país hoje só refina 80% da gasolina que usa. A gente refinava 100%, a gente refinava tudo o que a gente consumia.”

Número de ministros do STF

A jornalista Vera Magalhães perguntou aos candidatos o que fariam diante da proposta de alguns congressistas, como o deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara, de aumentar o número de ministros do Supremo Tribunal Federal, de 11 para 16 ou mais.

A ideia é vista por analistas como uma manobra para aumentar o controle do governo sobre o Supremo, já que o presidente que estiver no cargo poderia indicar mais cinco ministros.

“Da minha parte, está feito o compromisso: não terá nenhuma proposta [para aumentar o número de ministros], como nunca estudei isso com profundidade”, disse Bolsonaro. Ele lembrou que a PEC em tramitação no Congresso é de 2013, de autoria da deputada Luiza Erundina (PSOL-SP).

Lula disse que “tentar mexer na Suprema Corte para colocar amigo é retrocesso que a República brasileira já conhece e eu sou contra”.

Em 1965, a ditadura militar aprovou o Ato Institucional 2 (AI-2) para aumentar o número de ministros de 11 para 16. Dois anos depois, cinco ministros considerados opositores pelos militares foram cassados e a corte voltou a ter 11 ministros, com proporção maior de integrantes nomeados pelo regime.

Quem ganhou?

Nas análises feitas no domingo após o debate, Lula se saiu melhor que Bolsonaro.

O instituto AtlasIntel realizou uma pesquisa qualitativa com 100 eleitores que não votaram em nenhum dos dois candidatos no primeiro turno, divididos em nove grupos focais. Para 54% deles, Lula venceu o debate. Bolsonaro se saiu melhor para 32% dos participantes da pesquisa.

Depois do debate, 59% dos participantes disseram que tendem a votar em Lula, enquanto 32% disseram que tendem a votar em Bolsonaro.

O estudo é uma pesquisa qualitativa, ou seja, não tem pretende ser uma estimativa sobre a opinião da população. O objetivo, diz o Atlas, é “avaliar tendências e informar análises”. Os números foram divulgados pelo site Pollster, em parceria com o AtlasIntel.

Nas redes sociais, os resultados foram parecidos. Durante o debate, a Quaest monitorou o Twitter, o Facebook e o Instagram, além de sites e blogs que mencionaram o debate da Band.

Bolsonaro teve mais menções: 54% dos comentários nos perfis e endereços monitorados pela Quaest foram relacionados ao presidente, contra 46% de Lula. Mas Lula teve um pouco mais de menções positivas: em média, 43% das menções ao petista foram positivas, contra 41% de Bolsonaro.

O melhor bloco de Lula foi o primeiro, momento em que o debate ficou concentrado no tema da pandemia. Bolsonaro teve mais menções no primeiro bloco (59% contra 41% de Lula), mas o petista teve 43% de menções positivas, contra 39% do presidente.

O terceiro bloco foi o melhor para o presidente: teve 54% das menções nos perfis e endereços monitorados pela Quaest e 51% delas foram positivas. Já Lula teve o pior bloco, com apenas 39% de menções positivas.

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