Por que o Bradesco dobrou a aposta no México e comprou uma financeira?

Banco vê oportunidades para avançar como banco digital na segunda maior economia da América Latina e passa a ter uma licença para oferecer mais produtos

Octavio de Lazari, CEO do Bradesco, diz que a compra da Ictineo Plataforma abrirá uma nova frente de negócios financeiros de alto potencial de crescimento no México, o segundo maior PIB da América Latina
25 de Agosto, 2022 | 01:49 PM

São Paulo — O México, segunda maior economia da América Latina, atrás do Brasil, tornou-se o principal alvo para o plano de expansão do Bradesco (BBDC4) como banco digital no exterior. Nesta quinta-feira (25), o segundo maior banco privado brasileiro anunciou a compra da financeira Ictineo por valor não divulgado.

Mais importante do que ter acesso à base de até 3 mil clientes é “ganhar” a licença regulatória local que permitirá ao Bradesco distribuir aos mexicanos novos produtos, como conta digital, empréstimo consignado, conta de investimento, cartão de débito, seguros e linhas de empréstimo como crédito imobiliário. Isso deve, no entanto, ocorrer apenas em 2023, após o negócio ser aprovado pelas autoridades dos dois países.

“Esperamos as aprovações para o primeiro semestre de 2023. Voilà no primeiro trimestre”, disse Alexandre Monteiro, diretor da subsidiária Bradescard México, à Bloomberg Línea.

A conclusão da aquisição da Ictineo está sujeita à aprovação das autoridades no México (CNBV - Comisión Nacional Bancária y de Valores) e no Brasil (Banco Central).

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Desde 2010, o Bradesco atua no país da América do Norte, após a aquisição do Ibi México, em um acordo de 20 anos que lhe dá o direito de comercializar produtos financeiros, como cartão de crédito, nas lojas da rede varejista C&A México, com acesso na época a 1,3 milhão de clientes.

“Em 12 anos, já temos cinco parceiros comerciais e 3 milhões de clientes no México. Com a compra da Ictineo, estamos buscando mais a licença para ser um neobanco relevante nesse país”, revela Monteiro, sediado em Guadalajara, em um escritório próximo da sede da C&A México.

Walmart

Depois de entrar no mercado mexicano oferecendo cartões para os clientes da C&A, o banco brasileiro conquistou acesso também aos consumidores de outras varejistas atuantes no país, como da Bodega Aurrerá - ”eles respondem por 45% das vendas do Walmart no México” - e de lojas da DelSol e da Woolworth, do Grupo Comercial Control, entre outras.

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“Estamos buscando mais varejistas. O plano é crescer no México, que representa uma grande oportunidade de crescimento no mundo digital. Vamos investir mais em tecnologia e oferecer uma maior gama de produtos. Para pagar essa aquisição, estamos usando o caixa acumulado pela nossa operação no México”, afirma o executivo.

Segundo Monteiro, atualmente a Bradescard México é uma das principais financeiras de crédito ao consumo no segmento de cadeias de varejo, mas não possui uma licença para atuar em outras frentes de negócios financeiros, pois opera como uma sociedade de responsabilidade limitada no México.

A Ictineo Plataforma S.A. é considerada uma “instituição financeira popular”, identificada localmente como uma “Sofipo”, que atua com pessoas físicas naquele país. “Como Sofipo, a autorização permite fazer quase tudo, mas não pode entrar no segmento de derivativos”, explica o executivo.

Desemprego e juros

Indicadores importantes sugerem um cenário macroeconômico melhor no México do que no Brasil. O diretor da Bradescard México compara, por exemplo, últimos dados de taxas de desemprego (3,3% x 9,3%) e e juros básicos (8,50% x 13,75%) entre os dois países. Entretanto, a realidade da digitalização do sistema financeiro é bem diferente.

“O México é o Brasil de cinco anos atrás. A parcela de contas digitais de neobancos representa só 0,8% da população. No Brasil, já é 13,2%. A participação do crédito sobre o PIB é de 41% no México, abaixo dos 81% no Brasil”, menciona Monteiro.

O anúncio da aquisição da financeira mexicana ocorre um dia após o Bradesco comunicar ao mercado a criação de uma nova asset em parceria com o BV (Banco Votorantim) no Brasil. “Não há ligação entre os fatos. Foi só uma coincidência”, diz o diretor dc.

Análise

Para João Daronco, analista da Suno Research, o negócio anunciado no México pode ser entendido como uma aquisição interessante.

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“O México é um dos principais países da América Latina quando se trata de PIB e de outros aspectos. É um mercado muito interessante. O Bradesco já tinha uma certa exposição, mas não como uma atuação similar a um banco digital”, comenta o especialista à Bloomberg Línea.

Na sua avaliação, ao adquirir a plataforma da Ictineo, abre-se uma nova frente para o banco brasileiro capturar mais clientes pessoas físicas no país latino-americano. “Isso mostra o Bradesco querendo ganhar relevância, aumentando sua presença e sua cobertura”, observa.

O analista da Suno faz também referência à influência do ecossistema digital das fintechs nos movimentos de bancos incumbentes. “São os grandes bancos se mexendo por conta de toda essa mudança de dinâmica vinda dos neobancos. É mais uma atitude de um bancão em direção a isso”.

Entre os grandes bancos brasileiros, o Itaú (ITUB4) é o que tem a maior operação fora do país. Os neobancos Nubank (NU) e Inter (INTR) têm se destacado na internacionalização. Esse último fala até em ter uma operação maior nos EUA do que no Brasil. Na maior economia do mundo, o Bradesco está presente após ter comprado o BAC, na Flórida, em 2019.

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CEO

A expansão do Bradesco no mercado de neobancos do México não chega a ser uma surpresa para o mercado. No fim de 2021, o CEO da instituição, Octavio de Lazari Junior, já comentava o assunto com analistas em encontros sobre os resultados financeiros.

“A aquisição da instituição Ictineo Plataforma nos abrirá uma nova frente de negócios financeiros de alto potencial de crescimento no México, um país de vários predicados, como o fato de ser o segundo maior PIB da América Latina”, declarou o CEO, em nota.

“Essa compra nos interessa particularmente pelo conhecimento adquirido daquele mercado com a Bradescard, que está no México há 12 anos. Administramos cerca de 3 milhões de clientes de cartões de grandes redes varejistas. Vamos ter a possibilidade de ampliar nossa atuação passando a ser similar a um banco digital com o objetivo de ganharmos uma presença mais robusta num mercado relevante como o mexicano”, destacou Lazari.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.