Inter enfrenta Nasdaq em queda e mira ser maior nos EUA do que no Brasil

CEO João Vitor Menin minimiza risco de recessão na maior economia do mundo e ressalta acesso a grandes investidores; imigrantes são um dos principais alvos

Ações da Inter&Co, holding controladora do Banco Inter, começaram a ser negociadas na Nasdaq
23 de Junho, 2022 | 08:31 PM
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São Paulo — A holding do banco digital Inter (INTR) fez sua estreia na Nasdaq nesta quinta-feira (23). Em um dia de ganhos de 1,62% do índice que concentra as ações de tecnologia, as ações desabaram 12,56%, com fechamento na mínima de US$ 3,48. A chegada de um dos maiores bancos digitais do país à bolsa americana ocorre em um momento desafiador com a onda vendedora de investidores em razão do aumento dos juros e da desaceleração da economia - a Nasdaq recua 28% neste ano.

O tombo no dia da estreia foi atribuído por analistas a uma pressão vendedora de grandes fundos que replicam o Ibovespa e são obrigados a se desfazer dos papéis, uma vez que o Inter deixou o principal índice acionário da B3 ao migrar para a bolsa nova-iorquina de tecnologia.

Para o CEO João Vitor Menin, a visão de longo prazo prevalece sobre o momento adverso. Ele disse que o “timing” da listagem no mercado americano foi “apropriado” mesmo com as previsões pessimistas sobre o risco de recessão nos Estados Unidos - as probabilidades chegam a superar 80%.

Segundo ele, o banco terá acesso direto a grandes investidores globais e poderá tirar do papel seu plano de expansão na maior economia do mundo.

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O CEO do Inter disse esperar que, até 2025, o Inter tenha mais clientes americanos do que brasileiros. O banco encerrou o primeiro trimestre com 18,6 milhões de clientes, dos quais 98% no Brasil. Os próximos passos incluem o lançamento de um aplicativo global e o aumento da oferta de produtos financeiros aos clientes americanos, incluindo uma plataforma de seguros.

A chegada do Inter à Nasdaq ocorre no momento em que a companhia concluiu a integração com a fintech americana Usend, cujo anúncio do negócio foi feito em agosto do ano passado e marcou a entrada do banco no mercado local. Essa fintech, com atuação em boa parte do território dos EUA, tem como foco o nicho de remessas internacionais feitas por imigrantes residentes.

“Não pensamos em engavetar [o plano de listagem neste momento] Esperar o timing perfeito não funciona. Temos sempre de fazer o melhor, independentemente do momento em que estamos”, disse Menin durante videoconferência com jornalistas, em resposta a uma pergunta de Bloomberg Línea sobre se o cenário macroeconômico adverso levou a companhia a cogitar o adiamento da listagem.

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O executivo acrescentou que, mesmo com desconto no preço em razão do momento adverso, a ação do Inter oferece um “entry point” [ponto de entrada] interessante para atrair novos investidores. “Não estamos emitindo novas ações para capitalizar a companhia e o preço mais baixo não diluiu nossos acionistas. Já estamos capitalizados com as quatro ofertas de ações nos últimos quatro anos”, comentou.

O analista da Nord Research Victor Bueno disse à Bloomberg Línea que o movimento de queda da ação do Inter na estreia na Nasdaq não chegou a ser uma surpresa, citando a venda por parte de fundos com a saída do Inter do Ibovespa. “São fundos que não podem mais ter o Inter na carteira. Vale ressaltar ainda que a liquidez hoje foi baixa, o que acentuou o movimento”, afirmou.

Na última sexta-feira (17), as ações (BIDI3, BIDI4) e os units (BIDI11) do Inter deixaram de ser negociados na B3 e foram substituídas por BDRs (Brazilian Depositary Receipts, ou certificados de ações negociadas em bolsas no exterior). O ticker do BDR é INBR31. O Inter era listado na B3 desde 2018 e, no ano passado, anunciou uma reestruturação societária para viabilizar a listagem nos EUA.

Para Bueno, a estreia do banco mineiro em Nova York representa mais um movimento do Inter se tornar uma empresa global, com a ambição de ampliar a base de clientes dos atuais 200 mil para 1 milhão de residentes nos EUA até 2025. “Desde junho do ano passado, a ação do Inter caiu perto de 90%. O papel está entrando na Nasdaq muito ‘amassado’. Agora eles terão que arrumar a casa e aproveitar a maior visibilidade para oferecer seu ecossistema de serviços financeiros e tentar monetizar sua base de clientes no mercado americano, aumentando o alcance”, diz o analista da Nord.

De olho em imigrantes

Segundo o CEO, a listagem em NY não significa que o Inter perderá o foco nos clientes nacionais. “Temos cerca de 4.000 funcionários, sendo que 3.950 estão no Brasil e 50 nos EUA.

Ele disse que o Inter não está em conversas com nenhuma instituição estrangeira sobre uma possível operação de M&A (fusão e aquisição). “Não almejamos isso, mas, se aparecer um banco americano ou europeu, vamos avaliar se o negócio faz sentido. Mas sou cético quanto a isso: temos caminho próprio e acho prematuro trazer um investidor estrangeiro para nosso capital”, respondeu à Bloomberg Línea.

João Vitor Menin expressou ainda uma preferência pelo mercado europeu, e não pelo da América Latina, como um possível próximo alvo de incursão do banco em sua jornada internacional, mas considera que a prioridade no momento é a expansão no mercado americano.

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“Antes do fim do ano, vamos ter um app global. Queremos avançar no nicho de imigrantes, oferecendo nossa conta global, com quatro produtos - conta corrente, débito, investimento e marketplace - que ainda não estão tão evoluídos como estão no Brasil. Vamos lançar uma plataforma de seguros, mas isso não significa que vamos comprar uma seguradora”, disse o executivo.

Presença de techs em NY

A chegada do Inter à Nasdaq dá continuidade a um movimento de maior presença de players brasileiros do setor de tecnologia no mercado acionário americano. Antes, o Nubank (NU) tinha iniciado a negociações de suas ações na NYSE (Bolsa de Nova York), em dezembro do ano passado. Stone (STNE), XP (XP), Afya (AFYA), Arco (ARCE) já são listadas na Nasdaq, e a PagSeguro, também na Bolsa de Nova York.

E vem mais pela frente, segundo Thiago Giantomassi, sócio das áreas de fusões e aquisições e mercado de capitais do escritório Demarest, que assessorou o Inter nas operações de reestruturação societária e migração das ações para a Nasdaq. Sem citar os nomes dos clientes, ele revelou que outras duas companhias listadas na B3 também estudam seguir o exemplo do Inter.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.