Da escassez à fartura: o que a demanda por chips diz sobre a economia global

Estoques sobem e servem como sinal de alerta sobre contração da economia, dado que o produto é utilizado em diferentes setores

Estoques de semicondutores na Coreia do Sul, um dos maiores fabricantes globais, voltam a crescer em ritmo não visto desde 2018
Por Jessica Menton - Ryan Vlastelica - Elena Popina
02 de Julho, 2022 | 12:13 PM

Bloomberg — As ações das principais fabricantes de semicondutores (chips) caíram na sexta-feira (1), depois que um aviso sobre a expectativa de lucros mais baixos da Micron Technology provocou novas preocupações sobre a capacidade de expansão de ganhos ded empresas na maior economia do mundo, que caminha potencialmente para uma recessão.

Apesar do rali mais amplo do mercado de ações no primeiro pregão do segundo semestre, o Índice de Semicondutores da Bolsa de Valores da Filadélfia caiu 3,8% depois que a Micron, maior fabricante de semicondutores de memória nos Estados Unidos, sinalizou que a demanda por chips usados em computadores e smartphones está esfriando. O índice, que abriga as ações de gigantes de chips como Advanced Micro Devices (AMD) e Nvidia, além da Micron, acumula queda de 38% em 2022.

Na Coreia do Sul, um dos maiores fabricantes globais de chips, os estoques do produto estão subindo a um ritmo acima de 50% na comparação anual, algo não visto desde 2018.

Historicamente, as ações de semicondutores têm sido um termômetro fundamental para o mercado de ações e a economia de maneira mais ampla. A razão é que os chips são usados em uma ampla variedade de setores importantes: eletrodomésticos, data centers, games e inteligência artificial.

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Se as condições de mercado se enfraquecerem para os chips, isso levanta questões sobre a demanda em outros cantos da economia, o que é um prenúncio preocupante para o mercado de ações, de acordo com Matt Maley, estrategista sênior da Miller Tabak + Co.

“Não tínhamos chips suficientes e agora a demanda está caindo”, disse Maley. “Que sinal o mercado envia? Isso destaca uma preocupação crescente de que a desaceleração pela qual estamos passando se transforme em uma recessão mais adiante”, disse o estrategista.

Sinais de contraste

A escassez global de semicondutores, impulsionada pela volta abrupta da demanda e pela interrupção da oferta nos momentos mais agudos de lockdown e restrições à circulação de pessoas, diminuiu um pouco, mas ainda há produção limitada de certos chips usados em carros e eletrodomésticos. Relatórios preocupantes de empresas de semicondutores antes da divulgação de seus números do segundo trimestre estão alimentando temores de que a demanda excederá a oferta por ainda mais tempo.

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“O que essa fraqueza indica é que a economia está desacelerando e há potencial para uma recessão”, disse Tim Ghriskey, estrategista sênior de portfólio da Ingalls & Snyder. “Os semicondutores são uma bandeira vermelha porque estão realmente em tudo. Eles são tão essenciais para tudo o que é vendido hoje. Eles são os equipamentos mais primários, e portanto isso é um destaque negativo para a economia.”

Estoques de chips crescem na Coreia do Sul em ritmo anual não visto desde 2018dfd

Mesmo assim, estão surgindo sinais de que as empresas podem ser capazes de combater os problemas contínuos da cadeia de suprimentos.

Na sexta-feira (1), a General Motors (GM) disse que espera que as vendas e o lucro do segundo trimestre sejam impactados pelos problemas no fornecimento de chips, mas a gigante global de carros reforçou que pode compensar o atraso na produção ainda neste ano e reafirmou sua previsão de ganhos (guidance) para o ano inteiro. Com as ações da montadora saltando até 3,5% na sexta, isso pode sinalizar que o pior momento já passou para os produtores de semicondutores.

Na verdade, as avaliações do mercado para ações de empresas de chips como a Micron parecem indicar que elas estão “incrivelmente baratas”, de acordo com Siddharth Singhai, diretor de investimentos da IronHold Capital, um fundo hedge baseado em valor.

“Produtos estão sendo vendidos irracionalmente devido ao investimento passivo e ao fato de que as taxas são altas e a inflação é elavada”, disse Singhai. “Tudo é impulsionado pelo medo, e não por uma compreensão real dos fundamentos.”

Dito isso, apostar contra fabricantes de chips foi uma escolha vencedora no último trimestre, já que o mercado enfraqueceu e as ações despencaram. E os agentes do bear market (expressão que designa um mercado baixista) estão aumentando as apostas de que a derrocada ainda tem chão pela frente.

As vendas a descoberto do ETF iShares Semiconductor, com patrimônio de US$ 6,2 bilhões, saltaram para o equivalente a 10% do free float no fim de junho, o nível mais alto desde dezembro de 2020, mostram dados compilados pela S3 Partners. O ETF caiu cerca de 4% na sexta e já perdeu 38% neste ano.

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