Vale e BHP testam nova lei de recuperação judicial no Brasil

Empresas argumentam que não há conflito de interesses na votação para decidir sobre um plano proposto pelos credores

A joint-venture de Vale e BHP não conseguiu pagar suas dívidas depois que sua barragem de rejeitos se rompeu em 2015
Por Mariana Durao e Cristiane Lucchesi
11 de Maio, 2022 | 08:28 AM

Bloomberg — As gigantes da mineração Vale (VALE3) e BHP preparam o que pode ser a maior batalha judicial até agora na reestruturação da dívida de sua joint-venture no Brasil: pedem à Justiça o direito de voto na assembleia de credores da Samarco, em um teste da nova lei de falências.

Em documentos separados obtidos pela Bloomberg News, as empresas argumentam que não há conflito de interesses na votação para decidir sobre um plano proposto pelos credores, apesar de cada uma possuir 50% da Samarco. Elas citam a visão de dois importantes advogados especialistas em reestruturação de dívidas, Eduardo Secchi Munhoz e Marcelo von Adamek.

A nova lei de falências, que entrou em vigor no ano passado, permite pela primeira vez que credores apresentem seus próprios planos de reestruturação em uma recuperação judicial. A lei anterior permitia apenas que a própria empresa oferecesse uma proposta, e os acionistas com participação superior a 10% não podiam votar por causa de conflito de interesses.

A BHP disse em petição que a influência que exerce sobre a Samarco não tem efeito sobre um plano alternativo apresentado por terceiros. “O acionista que é credor passa a ser um credor como qualquer outro”, disse a empresa à Justiça.

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A Vale afirmou em comunicado enviado por e-mail que “a alteração legal que permitiu a apresentação de planos por credores não vedou que acionistas credores exerçam o seu direito de voto”.

Os detentores de títulos de dívida membros do comitê ad hoc contra-atacaram. Em petição à Justiça, argumentam que a nova lei é clara ao proibir o voto dos acionistas controladores, acrescentando que o artigo que existia na antiga lei permanece intacto na nova lei. Eles dizem que a Vale e a BHP querem com “essa inventada polêmica jurídica” votar em um plano de sua preferência, que poderia vir a ser proposto por um credor menor.

A Samarco pediu no mês passado que a Justiça cancele uma votação anterior na qual os credores rejeitaram o plano de reestruturação de dívida proposto pela empresa. Enquanto isso, os detentores de títulos do comitê ad hoc, que possuem cerca de R$ 20,6 bilhões da dívida da companhia, se preparam para apresentar sua própria proposta de reestruturação.

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A joint-venture de Vale e BHP não conseguiu pagar suas dívidas depois que sua barragem de rejeitos se rompeu em 2015, despejando milhões de toneladas de lama e água em Minas Gerais, matando 19 pessoas e quase destruindo duas vilas em Mariana. A Samarco interrompeu a produção e só voltou a operar parcialmente em dezembro de 2020.

Em seu pedido de recuperação judicial de abril de 2021, a Samarco listou R$ 24 bilhões que deve à Vale e à BHP pelas linhas de crédito que as duas empresas estenderam para a joint-venture pagar os reparos do desastre e financiar a retomada das operações.

Isso representa quase metade dos mais de R$ 50 bilhões em dívidas inadimplentes da Samarco. Os credores pediram ao tribunal que excluísse esses créditos do processo de recuperação judicial. Se o juiz permitir a inclusão desses créditos e a Vale e a BHP puderem votar, as duas empresas terão maioria na assembleia de credores. Caso contrário, os detentores de títulos do comitê ad hoc terão a maioria dos votos.

Uma mediação judicial pode ser a única opção para evitar uma batalha na Justiça que pode se arrastar por anos.

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