Elon Musk riu da ideia da Tesla usar muita água; agora o problema é real

Empresário zombou abertamente ao ser questionado sobre o consumo de água na fábrica nos arredores de Berlim

Placa diz "Area de Proteção Hídrica" no canteiro de obras da Tesla em Gruenheide, na Alemanha
Por Monica Raymunt - William Wilkes
22 de Fevereiro, 2022 | 12:26 PM

Bloomberg — Quando perguntaram a Elon Musk no ano passado se a fábrica que a Tesla estava construindo na Alemanha esgotaria o abastecimento de água da região, ele caiu na gargalhada e chamou a ideia de “completamente errada”.

Seis meses depois, a água é uma das principais razões pelas quais a fábrica ainda não está produzindo veículos.

Embora em agosto Musk tenha apontado em tom irreverente para a água “em todos os lugares” ao redor de Berlim, a região está sofrendo com a queda dos níveis das águas subterrâneas e secas prolongadas devido às mudanças climáticas. Isso desencadeou um embate jurídico que será levado ao tribunal na próxima semana e um reconhecimento das autoridades locais de que o fornecimento será insuficiente assim que a Tesla expandir a fábrica. A questão tem o potencial de atrasar ainda mais ou até mesmo interromper o projeto de 5 bilhões de euros (US$ 5,7 bilhões), no que pode se transformar em um revés caro para a expansão da montadora.

“Com certeza a Tesla intensificará o problema “, disse Irina Engelhardt, que dirige o departamento de hidrogeologia da Universidade Técnica de Berlim. “Pode não haver água suficiente para todos.”

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Ampliar a fábrica no estado oriental de Brandemburgo é fundamental para as ambições globais da Tesla. A montadora precisa de uma base de fabricação na Europa para abastecer o mercado de veículos elétricos em rápido crescimento da região, que deve continuar muito maior e mais competitivo do que nos Estados Unidos nos próximos anos. Embora a Tesla tenha construído a fábrica em uma velocidade vertiginosa, ela ainda aguarda a aprovação final das autoridades locais, enquanto a Volkswagen, a Mercedes-Benz e a Stellantis também ampliam suas próprias linhas de veículos elétricos.

“O atual abastecimento de água é suficiente para a primeira fase da fábrica”, disse o ministro da Economia de Brandemburgo, Joerg Steinbach, em entrevista. Assim que a Tesla expandir o projeto, “precisaremos de mais”.

Musk, 50 anos, tem usado seu charme para promover a fábrica que, segundo a Tesla, produzirá baterias no futuro e até 500.000 carros por ano. Ele tuitou em alemão, se apresentou a políticos locais e promoveu uma feira municipal no estilo da Oktoberfest no canteiro de obras em outubro. Mas ele também frustrou as autoridades com várias mudanças de última hora na fábrica e provocou indignação na Alemanha, na semana passada, por postar um meme evocando Adolf Hitler. A agência reguladora de veículos do país disse esta semana que está investigando um dos atributos de assistência ao motorista nos carros da Tesla.

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Muito do otimismo sobre as perspectivas de crescimento da Tesla este ano está na capacidade da empresa de colocar em funcionamento as fábricas que está construindo perto de Berlim e em Austin, no Texas. Quando os analistas do Credit Suisse elevaram sua meta de preço das ações de US$ 830 para US$ 1.025 no mês passado, o primeiro fator citado foi a expansão da capacidade. A fábrica de Berlim “sem dúvida representa a fonte mais crítica para a expansão da capacidade da Tesla”, escreveram os analistas liderados por Dan Levy no relatório de 18 de janeiro. Acelerar sua ampliação deve reforçar a oferta em um mercado que tem sido o “marco zero para a virada global rumo aos VEs”.

As ações da Tesla caíram 3,1%, para US$ 830, às 5h, horário de Nova York, na terça-feira (22). As ações caíram 19% este ano.

Políticos alemães apoiaram o investimento porque ele promete milhares de novos empregos em uma região com pouca indústria pesada. No entanto, o progresso no canteiro de obras, na pequena cidade de Gruenheide, foi mais lento do que o esperado, com a pandemia, a burocracia e a reação dos moradores sobre o uso da água atrasando o início da produção em vários meses.

Os grupos Nabu e Gruene Liga processaram a regional de meio ambiente de Brandenburgo no ano passado, dizendo que não levou em conta o impacto das mudanças climáticas ao aprovar uma licença de 30 anos para bombear mais águas subterrâneas para a fábrica da Tesla. As autoridades dizem que o problema é administrável e que já estão procurando suprimentos adicionais. Uma decisão a favor dos ambientalistas provavelmente atrasaria a abertura da fábrica e poderia inviabilizá-la completamente. Uma primeira audiência no tribunal está marcada para 4 de março.

A Tesla e o Ministério do Meio Ambiente de Brandenburgo, responsável pela regional, não responderam aos pedidos de comentários.

Especialistas dizem que algumas das preocupações dos ambientalistas são válidas. O nível do lençol freático de Brandemburgo vem caindo nas últimas três décadas. As secas em cada um dos últimos quatro anos resultaram em incêndios florestais e quebras de safra. Os meteorologistas estão prevendo ondas de calor mais frequentes, enfraquecendo ainda mais a capacidade do solo local de armazenar chuvas.

A fábrica de Tesla praticamente dobraria a quantidade de água consumida na área de Gruenheide, de acordo com Axel Bronstert, professor de hidrologia da Universidade de Potsdam. Ele disse que é “ingênuo” pensar que as reservas seriam suficientes tanto para a fábrica quanto para os moradores, e chamou a situação das águas subterrâneas em Brandenburg de “séria”.

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Independentemente de como os juízes julgarão o caso, a empresa que faz a gestão da água na região terá que investir em novas infraestruturas, incluindo uma estação de tratamento de águas residuais para garantir o abastecimento adequado – grandes projetos de engenharia que as autoridades admitem que podem levar anos.

“Há atrasos consideráveis no processamento das medidas necessárias”, disse Andre Baehler, chefe das instalações de água da WSE local, no início deste mês, durante uma audiência do comitê de meio ambiente parlamentar de Brandenburgo.

A Tesla sinalizou em seu relatório de impacto no ano passado que a água está se tornando cada vez mais escassa devido às mudanças climáticas. A empresa disse que retira menos água por veículo produzido do que a maioria das montadoras estabelecidas e que está tomando medidas na fábrica alemã para reduzir ainda mais o uso.

De acordo com um contrato com as autoridades locais, a fábrica de Gruenheide receberia 1,4 milhão de metros cúbicos de água anualmente – o suficiente para uma cidade de cerca de 40.000 pessoas. Steinbach disse que, embora esteja levando as preocupações ambientais muito a sério, a grande maioria da população local é a favor da fábrica. As autoridades de Brandemburgo estão apoiando os esforços para novas perfurações na área em busca de mais água, e o abastecimento também pode ser obtido de áreas mais distantes, se necessário, segundo ele.

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Mas cavar novos poços provavelmente não fará com que as preocupações desapareçam. Manuela Hoyer, que mora a poucos quilômetros da fábrica, diz que a Tesla está recebendo tratamento preferencial dos políticos locais, embora isso exacerbe um problema ambiental que já é sério.

“Há anos nos dizem que não devemos regar nossos gramados”, disse Hoyer, que participa de uma iniciativa cidadã que monitora o projeto, em entrevista. “Então o homem mais rico do mundo aparece e consegue tudo o que quer.”

– Com a colaboração de Craig Trudell.

– Esta notícia foi traduzida por Marcelle Castro, Localization Specialist da Bloomberg Línea.

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