Bolsonaro deve se encontrar com Putin, e Ucrânia não está na agenda

Governo busca aliviar restrições impostas pelo Kremlin a exportações de produtos agrícolas que o Brasil precisa desesperadamente

O presidente conservador também está tentando mostrar a seus apoiadores locais que ele mantém algum prestígio internacional
Por Simone Preissler Iglesias
15 de Fevereiro, 2022 | 03:56 PM

Bloomberg — O presidente brasileiro Jair Bolsonaro desembarcou no meio de um turbilhão diplomático em Moscou para conversar com seu colega russo, Vladimir Putin. Mas, em vez de adicionar sua voz àqueles que buscam acabar com o impasse sobre a Ucrânia, Bolsonaro está tentando dar um show para seu público doméstico.

A visita de Bolsonaro, que se reunirá com Putin na quarta-feira (16), faz parte de uma tentativa de melhorar o comércio com um parceiro estratégico. O governo brasileiro diz que está buscando aliviar as restrições impostas pelo Kremlin às exportações de produtos que a potência agrícola latino-americana precisa desesperadamente: 85% de todos os fertilizantes usados no Brasil são importados e 22% deles vêm da Rússia.

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Bolsonaro, que busca a reeleição em outubro, tem interesse em evitar o aumento dos custos dos alimentos que ajudaram a elevar a inflação acima de 10% ao ano no Brasil. O aumento dos preços, juntamente com uma recessão econômica e sua gestão da pandemia estão arrastando sua popularidade, com as últimas pesquisas de opinião mostrando que ele perdeu a corrida para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

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No entanto, o presidente conservador também está tentando mostrar a seus apoiadores locais que ele mantém algum prestígio internacional, de acordo com Guilherme Casarões, cientista político radicado no Rio de Janeiro.

“Depois de colocar o Brasil em um isolamento global sem precedentes, Bolsonaro está tentando mudar essa percepção antes da eleição porque sabe que será criticado por isso durante a campanha”, disse Casarões, que também é professor da Fundação Getulio Vargas. “Bolsonaro é visto como um líder tóxico por muitos países.”

Questionado sobre o momento da visita, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil disse que a viagem estava planejada há muito tempo, mas teve que ser remarcada devido à pandemia.

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Bolsonaro não é o único líder latino-americano que se aproxima da Rússia: o argentino Alberto Fernandez visitou Moscou no início deste mês e Putin ligou para Daniel Ortega, da Nicarágua, no mês passado, parabenizando-o por sua controversa reeleição.

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Ignorando avisos

Bolsonaro perdeu seu mais importante aliado internacional quando o mandato de Donald Trump terminou no ano passado. Embora os EUA tenham manifestado preocupação com seu plano de visitar a Rússia durante a crise na Ucrânia, o presidente Joe Biden não ligou para seu colega brasileiro nem uma vez desde que assumiu o cargo.

Bolsonaro também foi avisado por sua equipe diplomática de que a viagem à Rússia viria em um momento inoportuno, mas se recusou a remarcá-la, segundo dois funcionários familiarizados com as discussões. Ele foi então solicitado a evitar mencionar a situação na Ucrânia, acrescentaram as pessoas, pedindo anonimato porque a discussão não é pública.

Depois da Rússia, Bolsonaro viaja para a Hungria para conhecer o primeiro-ministro Viktor Orban, líder de direita com quem compartilha uma formação ideológica semelhante.

Em casa, os mais fervorosos apoiadores de Bolsonaro estão fazendo sua viagem como uma missão de paz, com o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles postando no Twitter, antes mesmo do encontro entre os dois líderes, que “Biden e o mundo ocidental estão agradecendo a Bolsonaro por ter convencido Putin a desistir sobre a invasão” da Ucrânia.

Bolsonaro disse que não mencionará a Ucrânia em conversas com Putin, mas se concentrará nas relações comerciais.

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“O mundo tem seus problemas”, disse ele aos apoiadores antes de embarcar para a Rússia. “Nós queremos paz.”

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