Intel vê benefício em concorrência e aposta em PC ‘pronto para IA’, diz VP global

Christoph Schell, vice-presidente executivo e Chief Commercial Officer, diz em entrevista à Bloomberg Línea que a empresa tende a receber pedidos de novos fabricantes de processadores

Intel headquarters in Santa Clara, California. Photographer: David Paul Morris/Bloomberg
21 de Dezembro, 2023 | 05:10 AM

Bloomberg Línea — A entrada de novos competidores no mercado de processadores para PCs pode beneficiar a Intel (INTC) e a sua estratégia de produzir chips para outras empresas, de acordo com Christoph Schell, vice-presidente executivo e Chief Commercial Officer, em entrevista à Bloomberg Línea.

Líder em vendas de CPUs (sigla para unidade de processamento central, em inglês), como são chamados os processadores para PCs, com a AMD (AMD) em segundo lugar, a Intel tem visto a sua dominância no mercado em risco com a entrada de novos concorrentes recentemente.

Segundo Schell, embora o movimento deixe a concorrência mais acirrada no negócio principal da Intel, os novos competidores não têm fábricas próprias. Dessa forma, terão de contratar uma empresa terceirizada para produzir os seus próprios chips – e, de preferência, vão escolher a Intel, segundo o executivo.

“Este é um jogo no qual a Intel não tem o que perder. Essas são empresas que não têm fábricas. Elas precisam de foundries. E ficaríamos muito felizes de fabricar os produtos para elas nas nossas fábricas. É uma boa oportunidade para nós”, afirmou Schell em entrevista realizada no mês passado no escritório da Intel em São Paulo, durante uma visita ao Brasil.

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O termo foundry (fundição em inglês) é usado no mercado de semicondutores para se referir às empresas que fabricam chips sob encomenda para companhias que apenas fazem o design dos chips, como a Apple, e não têm fábricas próprias. A empresa líder nesse mercado de terceirização é a taiwanesa TSMC (TSM).

Uma das empresas que buscam entrar no mercado de chips para PC é a americana Qualcomm (QCOM), tradicional fabricante de chips para dispositivos móveis, liderada pelo CEO brasileiro Cristiano Amon. Recentemente, a empresa anunciou um novo processador voltado para laptops.

Além da companhia, a Nvidia (NVDA) estaria trabalhando no desenvolvimento de um chip para PCs baseado na arquitetura ARM (ARM), de acordo com reportagem recente da Bloomberg News.

A Nvidia, líder em vendas de processadores gráficos, esteve no centro das atenções de investidores em 2023 por causa do crescimento da demanda por equipamentos de alta capacidade voltados para sistemas de inteligência artificial.

A própria Intel também tem se movimentado para competir em outros mercados. No último dia 14 de dezembro, a companhia revelou novos processadores voltados para data centers que concorrem com produtos da Nvidia destinados a aplicações de inteligência artificial.

A Intel também fez o lançamento de novos chips para laptops e desktops da linha Ultra Core com funcionalidades para processar recursos de inteligência artificial diretamente.

Os lançamentos fizeram as ações da Intel subirem 5,6% no dia do anúncio. Os papéis da empresa acumulavam alta de 71% em 2023 até o dia 14 de dezembro.

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Expansão do negócio de foundry

Em 2021, a Intel anunciou que faria uma mudança na estratégia para entrar no negócio de foundry, produzindo chips sob encomenda para outras empresas. Desde então, a empresa tem investido para construir novas fábricas ao redor do mundo, incluindo nos Estados Unidos, na Alemanha e na Irlanda.

Em entrevista à Bloomberg Línea, Christoph Schell afirmou que parte da sua missão no cargo tem sido buscar clientes para o negócio de foundry. Sem mencionar o nome ou a quantidade de clientes, o executivo afirma que a empresa já tem fechado contrato com empresas do ramo para produzir os chips a elas.

“Estamos preenchendo a lista de clientes neste momento. É o nosso trabalho encontrar consumidores que vão usar a capacidade de todas as fábricas que estamos construindo”, disse.

Christoph Schell, da Intel

O diretor comercial da Intel disse que vê três categorias de clientes do negócio de foundry: empresas concorrentes da Intel, empresas de semicondutores que atuam em verticais (como o setor automotivo), e governos que precisam de soluções específicas.

Segundo ele, ao atrair um novo cliente para o negócio de produção sob encomenda, a Intel pode abrir caminho para oferecer outras soluções e serviços, em outras frentes de negócio.

Um desafio, segundo Schell, é convencer concorrentes da Intel de que informações sensíveis da estratégia das empresas serão mantidas sob sigilo e separadas de outras frentes de negócios da Intel.

“Obviamente um assunto muito delicado, porque precisamos proteger as informações dos clientes para que essas empresas se sintam seguras de se abrir e compartilhar quais são as suas ideias”, afirmou.

Sobre a possibilidade de trazer parte da produção para a América Latina ou abrir novas fábricas, o executivo evitou entrar em detalhes sobre os planos da Intel, mas disse que a empresa tem uma estratégia contínua, o que, eventualmente, pode fazer a região ser considerada no futuro.

“A instalação dessas fábricas segue o ecossistema. É preciso ter um ecossistema de fornecedores. A América Latina com o tempo vai se tornar cada vez mais importante para a indústria. Não só para a América Latina mas para todo o mercado nas Américas, incluindo a América do Norte”, disse.

“Não estou aqui para anunciar nada nesse sentido. Mas também não quero deixar a mensagem de que não estamos interessados na América Latina para expansões no futuro”, completou.

PC ‘pronto para IA’

Sobre o mercado de computadores, o executivo da Intel afirmou que espera uma recuperação depois de um ano de retração nas vendas. O volume global de vendas de PCs vem caindo, refletindo uma acomodação depois da alta demanda impulsionada pela pandemia de covid-19. Dados da consultoria IDC, apontam uma queda de 7,6% nas vendas totais no terceiro trimestre em relação ao ano passado.

Schell afirma que, olhando para frente, há espaço para crescimento novamente desse mercado. Além disso, o surgimento de novos serviços de inteligência artificial (IA) tendem a aumentar a demanda por computadores, à medida que pessoas e empresas buscam máquinas com maior capacidade de processamento para lidar com essas novas tecnologias.

“A IA vai trazer um crescimento interessante, não apenas em número de unidades mas também no preço-médio dos produtos vendidos. Para ter um PC voltado para IA, é preciso comprar um computador mais poderoso. PCs com CPU e GPUs integradas podem subir de valor”, disse o executivo.

A Intel tem apostado em um novo mercado de PCs “prontos para a IA” (AI-ready), o que pode levar a um novo ciclo de upgrade da base instalada de computadores.

Schell disse que há a possibilidade de a Intel ter um novo momento “Centrino” outra vez, referindo-se à antiga plataforma de chips da Intel lançada pela primeira vez em 2003, que coincidiu com um período de forte expansão do mercado.

“O Intel Centrino trouxe um grande crescimento para o mercado de PCs. Acho que estamos no começo de algo assim novamente. A IA, à medida que evolui, vai trazer muito crescimento para o negócio de PCs. Em particular no Brasil, muitas pessoas ainda não têm acesso a um PC ou tem um PC muito desatualizado. O novo consumidor e o ciclo de upgrade vão trazer crescimento para o mercado de PCs.”

O Brasil é o sétimo maior mercado de computadores do mundo e, portanto, está na lista das prioridades da Intel, segundo Schell. Além da expansão desse mercado, o executivo afirmou que um dos objetivos para crescer no país é trabalhar com clientes para oferecer mais serviços de software e de engenharia, para ampliar as receitas para além dos ganhos com as vendas tradicionais.

“O Brasil é um mercado muito interessante para serviços de valor agregado. E é exatamente o que eu desejo acrescentar para a estratégia da Intel. Não quero sair do modelo de vendas transacional mas quero acrescentar serviços de software a isso”, afirmou.

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Filipe Serrano

É editor da Bloomberg Línea Brasil e jornalista especializado na cobertura de macroeconomia, negócios, internacional e tecnologia. Foi editor de economia no jornal O Estado de S. Paulo, e editor na Exame e na revista INFO, da Editora Abril. Tem pós-graduação em Relações Internacionais pela FGV-SP, e graduação em Jornalismo pela PUC-SP.