Vinhos de entrada e assinatura: a estratégia da Wine para superar R$ 1 bi em vendas

Desde que chegou ao comando da empresa, o CEO Alexandre Magno direcionou o foco para a rentabilidade, mas plano ainda prevê espaço para crescimento com a força do mercado de vinhos de baixo custo e a formação de novos consumidores

Com novo CEO, Wine duplica lucro e aposta em rentabilidade para manter liderança no varejo de vinhos
Por Daniel Buarque
22 de Agosto, 2025 | 02:51 PM

Bloomberg Línea — Maior varejista de vinhos do Brasil, o Grupo Wine teve um faturamento de R$ 987 milhões em 2024 e se encaminha para um resultado semelhante neste ano.

Enquanto o novo CEO, Alexandre Magno, reajusta as prioridades da empresa para focar na rentabilidade, a empresa não deixa de lado totalmente os planos de expansão, inclusive no exterior, que podem impulsionar a receita para além de R$ 1 bilhão. E o motor disso tudo está muito ligado aos vinhos baratos, aos rótulos da própria marca e ao clube de assinatura da Wine.

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Criado em 2010, o clube se consolidou como um dos principais canais de aquisição e retenção de clientes. Segundo Magno, trata-se de “uma porta de entrada formidável para esse consumidor emergente, que muitas vezes se sente intimidado pela variedade de rótulos e preços no varejo”, disse em entrevista à Bloomberg Línea.

O clube tira dos consumidores a necessidade de escolher os vinhos e envia aos assinantes mensalmente garrafas selecionadas pelos chamados “wine hunters”, profissionais que buscam rótulos em diferentes países e ajudam os clientes a experimentar vinhos variados, de diferentes uvas, países e estilos.

As assinaturas incluem duas garrafas por mês, e ajudam a formar o público que quer conhecer mais sobre vinho.

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Segundo Magno, esse formato tem um caráter educativo e ajuda o consumidor a adquirir experiência. “Para você se tornar um consumidor melhor de vinho, tem que ter litragem”, disse. O termo é usado no mercado como referência a um volume de consumo suficiente para desenvolver o paladar e o conhecimento sobre a bebida.

Leia também: Como o Grupo Wine consolidou sua liderança nacional com novo foco em rentabilidade

Apesar de ver o clube como parte de um trabalho educativo, o executivo diz acreditar que o fator mais decisivo para ampliar o consumo é o preço acessível. “Quando a gente coloca produtos de bom custo-benefício e a um preço acessível, acho que as pessoas estão mais dispostas a testar e errar e descobrirem o que que elas gostam”, afirma.

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O mercado de vinhos no Brasil movimenta cerca de R$ 20 bilhões anuais e conta com 44 milhões de consumidores regulares, segundo dados da Ideal Consulting citados por Magno.

Foco em vinhos de ‘entrada’

O consumo per capita no país evoluiu de 1,6 litros em 2015 para 2,5 litros atualmente (depois de um pequeno recuo após forte crescimento durante a pandemia). Nesse contexto, o posicionamento central do Grupo Wine está no segmento de vinhos de entrada, que domina o consumo nacional.

Esta estratégia vai ser mantida, segundo Magno, que explicou que 80% dos vinhos importados vendidos no Brasil custam até US$ 35 a caixa (cerca de R$ 50 a R$ 60 por garrafa na gôndola). “É um mercado muito de entrada, e a gente está super bem posicionado nisso”, disse.

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Parte importante da estratégia de vinhos baratos e com alta rentabilidade vem das marcas próprias e autorais como Metropolitano, Kaipu, Maravi e Dínamo. Esses rótulos são desenvolvidos pelo Grupo Wine em parceria com vinícolas no Brasil e no Chile e criados para encaixar no gosto do consumidor brasileiro. Esse perfil é desenvolvido com base em dados do clube de assinatura e da operação de e-commerce da Wine.

O modelo reduz custos porque aproveita capacidade ociosa de parceiros produtores. “As marcas autorais têm um custo menor para nós, e aí conseguimos ter uma margem melhor do que as marcas de vinícolas tradicionais”, explicou. Além de rentáveis, essas marcas ajudam a criar familiaridade com o público e aumentar a recompra.

O gosto do consumidor brasileiro de vinhos finos ainda é fortemente influenciado por rótulos chilenos e argentinos, com preferência por estilos levemente amadeirados. No entanto, Magno identifica uma mudança em andamento: vinhos mais leves, com menor teor alcoólico, e um crescimento no interesse por brancos.

Dados da consultoria Ideal mostram que os vinhos brancos representavam 20% do valor importado em 2021, e chegaram a 28% em 2025.

Apesar do foco no mercado de vinhos mais baratos, a empresa também vê espaço para crescer no segmento de rótulos de alta gama, com preços a partir de R$ 150. Ela ampliou seu portfólio nos últimos 12 meses com marcas como Frescobaldi, Fontanafredda e Escudo Rojo para tentar ganhar este mercado premium.

A lógica é ampliar opções sem perder o foco na base, segundo o executivo. “Não vamos reinventar a roda”, disse.

Concorrência e desafios

O contexto global de desaceleração do consumo de vinhos e de guerra comercial tem influência no mercado brasileiro e deixa o Grupo Wine atento a desafios e oportunidades. Enquanto do ponto de vista externo há a possibilidade atrair mais grupos estrangeiros ao mercado brasileiro, diante das tarifas aplicadas pelos EUA e de acordos comerciais com o Mercosul, as mudanças no âmbito doméstico também são fatores importantes para a Wine.

A reforma tributária, por exemplo, é acompanhada de perto. Pelas contas da empresa, a mudança para um IVA de 26% deve ter efeito neutro sobre o resultado, compensando o fim dos benefícios fiscais estaduais com a possibilidade de tomar crédito de novos insumos. “Mais ou menos deve se equivaler”, avalia Magno.

A reforma pode alterar a estratégia de estocagem e distribuição. Atualmente, a empresa mantém centros de distribuição no Espírito Santo e em Itajaí (SC), escolhidos por razões fiscais e logísticas. Com as mudanças tributárias, a empresa pode reavaliar esse modelo e considerar unidades mais próximas dos grandes mercados consumidores.

O ponto de atenção mais preocupante é o chamado imposto seletivo, ainda sem definição sobre alíquota e base de cálculo, que pode aumentar o preço de bebidas alcoólicas.

O cenário também inclui a reorganização dos principais players no setor de vinhos no país. O crescimento acelerado do consumo de vinhos durante a pandemia atraiu novos competidores para o setor. “A gente viveu um boom de concorrência muito ali na época da pandemia, com o aparecimento de muitos novos importadores”, disse.

Segundo ele, esse movimento foi cíclico. Após dificuldades com estoque e capital de giro, parte desses players voltou a trabalhar com importadores como a Wine. “Esse ano a gente está vendo alguns parceiros importantes, que estavam bastante focados em importação própria, começarem a trabalhar mais com a gente”, afirma.

Mais grave do que essa concorrência, segundo o executivo, é o chamado descaminho (importação ilegal de vinhos). De acordo com Magno, apesar de ele afetar todo o setor, o problema acaba sendo menor para a empresa por atuar principalmente com produtos de entrada, menos atraentes para contrabandistas. “Quem vai contrabandear, vai priorizar o vinho premium, porque é onde tem margem muito maior”, disse.

Para o futuro, Magno quer consolidar a Wine como referência imediata para o consumidor final brasileiro e reforçar a relevância no mercado B2B. Isso inclui melhorar a experiência do clube de assinatura e incentivar a migração de assinantes para categorias superiores, com rótulos de maior valor agregado.

Mesmo com a expansão internacional no radar, o CEO reforça que a rentabilidade continua no centro da estratégia. A disciplina operacional, que marcou a mudança de gestão iniciada em novembro de 2024, deve continuar guiando as decisões. “O foco é na execução e também extrair ainda mais valor da posição de liderança que consolidamos nos últimos anos”, disse em recente comunicado.

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Daniel Buarque

Daniel Buarque

É doutor em relações internacionais pelo King’s College London. Tem mais de 20 anos de experiência em veículos como Folha de S.Paulo e G1 e é autor de oito livros, incluindo 'Brazil’s international status and recognition as an emerging power', 'Brazil, um país do presente', 'O Brazil é um país sério?' e 'O Brasil voltou?'