Bloomberg Línea — Diante do avanço agressivo de montadoras chinesas ao redor do mundo, a Stellantis, gigante automotiva dona de marcas como Fiat, Jeep e Peugeot, decidiu se aliar à indústria chinesa.
O grupo apontou que a aliança global com a chinesa Leapmotor é uma de suas grandes apostas para manter market share no Brasil, um dos maiores mercados do mundo.
“Boa parte da transformação do mercado se deve a tecnologias que estão chegando agora, muitas delas de maneira intensa por meio de marcas chinesas. A chegada dessas montadoras muda a geografia das vendas de forma intensa”, disse o novo presidente da Stellantis para a América do Sul, Herlander Zola.
O executivo, que concedeu sua primeira entrevista coletiva no cargo na segunda-feira (3) em São Paulo, reforçou que algumas dessas marcas já estão estabelecidas há algum tempo no Brasil, como a GWM, a BYD e a Chery, e muitas outras chegaram ao país mais recentemente, como a GAC.
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Zola destacou que, em 2019, no pré-pandemia, a participação das montadoras chinesas nas vendas totais do mercado brasileiro era inferior a 1%. “Hoje, está chegando a 9%. Nos últimos meses, ultrapassou 10%. É claro que alguém perdeu [market share]."
Zola disse que a Stellantis busca uma estratégia para manter sua participação nas vendas, especialmente em um mercado altamente disputado.
“Temos estabelecido dentro da nossa empresa, de forma muito clara, o que precisa ser feito para que continuemos a ganhar espaço no mercado, sem correr o risco de perder [share] a partir da chegada de novos produtos, tecnologias e não apenas de marcas chinesas mas de todas as outras, que, assim como nós, estão fazendo movimentos para ganhar espaço", disse.
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Fundada em 2015, a Leapmotor é uma marca de veículos elétricos com sede em Hangzhou, na província de Zhejiang, na China.
Em 2023, a Stellantis investiu na “jovem” montadora (fundada em 2015) e, em maio do ano seguinte, as duas empresas formaram uma joint venture chamada Leapmotor International para explorar o mercado global.
“A Leapmotor é basicamente uma startup que nasceu eletrificada. Do ponto de vista tecnológico, com a parceria podemos trazer algo inovador e cair no gosto do brasileiro”, avaliou Zola.

Segundo o executivo, a Leapmotor torna-se a sexta marca dentro do portfólio da Stellantis no Brasil, agregando principalmente novas tecnologias às vendas do grupo.
“Neste início, vamos dar passos gradativos. Não temos a ambição que outras marcas chinesas têm de chegar aqui e, em seis meses, vender volumes ‘astronômicos’ e contar com uma rede gigantesca. Mas posso afirmar que a importância que a marca terá dentro do nosso portfólio é muito grande”, disse.
A BYD, por exemplo, caminha para encerrar o ano com 250 pontos de venda no Brasil, após ter desembarcado no país em 2022.
Em entrevista à Bloomberg Línea no fim de outubro, o Vice-Presidente Sênior e Head de Marketing e Comercial da BYD no Brasil, Alexandre Baldy, afirmou que o objetivo da empresa é “claro”: não apenas liderar o segmento de elétricos e híbridos mas se tornar a marca número 1 no ranking geral de automóveis do Brasil.
Ainda nesta segunda-feira, a chinesa Geely anunciou a compra de uma participação de 26,4% na unidade brasileira da Renault, o que permitirá à empresa produzir veículos na fábrica da parceira francesa em São José dos Pinhais (Paraná).
Autonomia local
O presidente da Stellantis para a região afirmou que a agilidade é um dos principais trunfos do grupo na disputa pelo mercado brasileiro. Em sua visão, a autonomia da operação local também é crucial na briga por market share.
“A possibilidade de buscarmos soluções que funcionem para nós é fruto de uma conquista da nossa região”, afirmou Zola, que é brasileiro e foi nomeado para o cargo em agosto deste ano, sucedendo o italiano Emanuele Cappellano, que agora comanda a operação da Europa.
Antes dele, o cargo foi ocupado pelo também italiano Antonio Filosa, atual CEO global da Stellantis.
A Leapmotor inicia suas operações no Brasil com as vendas de dois modelos: B10 e C10 (100% elétricos) e uma versão híbrida do C10. Ambos são SUVs.
Zola afirmou que o grupo trabalha para que o portfólio cresça de maneira rápida. A rede começa suas atividades com 36 lojas em 29 cidades, cobrindo as principais capitais e cidades do país.
“Do ponto de vista de cobertura, trabalhamos de forma muito adequada. É uma marca chinesa que chega com 50 anos de conhecimento do público brasileiro”, disse o executivo, referindo-se ao tempo de operação de marcas da Stellantis no Brasil, em particular a Fiat.
Ele ressaltou que o grupo reconhece a importância da nacionalização futura dos produtos da Leapmotor, mas que por enquanto não há nada decidido nesse sentido.
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“Não podemos afirmar que teremos produtos localizados da Leapmotor porque isso ainda não foi aprovado, não está decidido. Mas posso dizer que estou empenhado para que isso aconteça”, afirmou Zola.
Segundo o executivo, a Stellantis tem uma posição de protagonismo na América do Sul, com 23% de market share na região. No Brasil, sua participação é de 29%; na Argentina (segundo maior mercado regional), a fatia do grupo ultrapassa 30%.
“Claramente temos uma posição importante a defender na região”, disse.
No acumulado de 2025, o grupo emplacou mais de 800 mil carros na América do Sul. “Caminhamos de forma consistente para encerrar o ano com um milhão em vendas na região, estamos confiantes disso.”
Para o próximo ano, contudo, ele classificou o cenário como sendo de “difícil leitura”. “No Brasil, o crescimento [do mercado automotivo] vai ser tímido, entre 2% e 3%. Em ano eleitoral, sempre podemos ter oscilações grandes, mas temos procurado nos defender disso.”
O maior risco no curto prazo, segundo Zola, é uma possível nova crise de semicondutores. “Estamos em uma iminência de parada das fábricas se não houver uma solução para o problema”, afirmou.
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