Próximo Neymar? Plataforma identifica talentos no Brasil com uso de IA em vídeos

Com aporte de € 5 milhões de investidores como Boris Collardi, ex-CEO global do Julius Baer, Footbao aposta no país como celeiro para mapear promessas do futebol e conectá-las a clubes locais e ao redor do mundo, contam os sócios à Bloomberg Línea

O atacante Neymar foi uma das grandes revelações do futebol brasileiro neste século XXI: plano de nova plataforma é encontrar novos talentos 'escondidos'
20 de Julho, 2025 | 09:13 AM

Bloomberg Línea — Uma nova plataforma pretende ajudar a transformar o Brasil em um celeiro digital de talentos do futebol — com ajuda de inteligência artificial, dados e conexões com clubes.

Batizada de Footbao, a empresa nasceu nas mãos de empresários ítalo-suiços, mas é do Brasil que pretende avançar para o mundo.

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De acordo com dados da FIFA, o país mantém nos últimos anos a liderança como o maior exportador de talentos do futebol para o mundo.

Ao usar tecnolologia e IA, a nova empresa, estruturada a partir de 2023, pretende facilitar os matches entre jovens jogadores, incluindo aqueles que vivem longe dos grandes centros, e os clubes.

“O Brasil parece o lugar perfeito para fazer isso, tanto pelo número de talentos quanto pelo tamanho geográfico do país. Há jogadores talentosos espalhados por todo canto, e é muito difícil para um clube ter tantos olheiros cobrindo uma área tão vasta para encontrar esses atletas”, disse Nick Rappolt, CEO da plataforma e com passagens por techs como Facebook, Instagram e Snapchat, em entrevista à Bloomberg Línea.

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O objetivo é mapear talentos com uso de IA para processar os milhares de vídeos enviados por jovens atletas à plataforma. A tecnologia reconhece lances como passes, dribles e finalizações dos aspirantes a boleiros, e permite criar rankings e perfis para que clubes filtrem por idade, posição ou nacionalidade.

A Footbao começou como uma rede social inspirada no TikTok, evoluiu para um marketplace de atletas e tem alguns números concretos no país: 44 jogadores em processo de negociação com clubes, 100 mil usuários registrados e jogadores assinados com times como Corinthians e Flamengo.

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O projeto nasceu da observação do italiano Francesco Ciringione, da butique de investimentos First Consulenza e ex-jogador, que percebeu os filhos compartilhando vídeos de futebol em grupos do WhatsApp.

“Eles mandavam o vídeo, faziam print screen. Era um processo complicado. Pensei: por que não criar uma rede social focada nisso?”, contou na mesma entrevista.

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De início, a Footbao funcionava como uma vitrine gamificada, mas a baixa atratividade visual dos vídeos e a vontade de monetizar mudaram o rumo do negócio.

Hoje, o negócio se posiciona como uma plataforma de talentos, que conecta jogadores a clubes e começa a introduzir serviços pagos, como edição de vídeos, análises personalizadas e dicas para melhorar as habilidades.

Do outro lado da mesa, os times podem acessar o banco de dados e receber sugestões de atletas com base em seus critérios técnicos. “É uma seleção em escala”, resumiu Rappolt.

O banqueiro que virou sócio-fundador

A monetização é realizada tanto por meio do uso da plataforma pelos atletas, à medida que recorrem a serviços mais personalizados, quanto pelos clubes na varredura e na indicação de talentos.

Um dos nomes por trás do negócio é Boris Collardi, que atuou como CEO do banco suíco Julius Baer entre 2009 e 2017. “Já vi de perto como encontrar um talento pode mudar a vida de uma pessoa e de todo um clube”, afirmou o executivo e investidor também à Bloomberg Línea.

O executivo, nascido no sul da Itália, é também acionista há cerca de 10 anos do Lecce, clube que disputa a primeira divisão do campeonato italiano e é controlado por cinco famílias.

“Eu não estou na governança, mas sou bastante ativo no sentido de que eu converso com o CEO toda semana e estou envolvido na vida do clube”, disse Collardi. “Por isso tive sensibilidade e consegui entender o que o Francesco estava dizendo.”

Além de entrar como sócio-fundador, Collardi trouxe Rappolt para liderar a operação e um clube de investidores. Juntos, aportaram € 5 milhões no ano passado para investir no desenvolvimento tecnológico da plataforma.

Boris Collardi, ex-CEO do banco suíco  Julius Baer e sócio-fundador da Footbao: ter um investidor institucional que possa nos trazer sinergias seria excelente

Além do Brasil, a Footbao opera em países como Itália e Inglaterra. A escolha pelo país como o primeiro mercado foi resultado também de coincidências, incluindo o fato de o líder do projeto ter um relacionamento próximo com uma agência de desenvolvedores em Sorocaba, no interior de São Paulo.

Brasil como campo de testes

“Ele me perguntou: por que não começar pelo Brasil? E eu pensei que seria perfeito. É um país grande e os melhores jogadores do mundo estão vindo do Brasil”, disse Ciringione.

Segundo os executivos, mais de 50.000 jovens atletas estão ativos mensalmente na plataforma, que soma mais de 200 projetos com escolinhas e 16 clubes parceiros — incluindo nomes conhecidos como como Goiás e Avaí, além de Laguna e Araçatuba - com a meta de chegar a 45 até setembro.

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No período, dois atletas assinaram com clubes locais.

A primeira contratação intermediada com o auxílio da plataforma foi da jovem zagueira Glória Gasparini, contratada pelo Corinthians aos 16 anos e convocada para a Seleção Brasileira Sub-17.

“Eu diria que tem sido uma atleta foi um golpe de sorte, considerando que teremos a Copa do Mundo de futebol feminino no Brasil em 2027”, afirmou Rappolt. O segundo atleta assinou com o Flamengo.

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Uma próxima etapa da plataforma é a criação de uma espécie de fábrica de talentos no Brasil, com estrutura própria para atletas sub-15, sub-17 e sub-20.

Os executivos preveem a realização de torneios periódicos com os talentos descobertos na plataforma e planejam usar as suas conexões para atrair olheiros de grandes clubes, entre nacionais e internacionais. A Footbao também pretende ter o seu próprio pipeline de jovens atletas.

Ainda neste ano, a plataforma deve expandir a operação e começar entrar em outros países da América do Sul, como a Argentina, outro celeiro de craques, e ainda a Europa. O ritmo vai depender do avanço no Brasil.

Para a entrada em novos destinos, os executivos trabalham o plano de uma captação de recursos para além dos investidores atuais.

“Seria ótimo para nós contarmos com um investidor institucional — não apenas um fundo de private equity ou um VC [venture capital]. Contar com um investidor institucional que possa trazer sinergias também seria excelente”, afirmou Collardi, que estimou o breakeven operacional ao longo dos próximos meses.

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Marcos Bonfim

Jornalista brasileiro especializado na cobertura de startups, inovação e tecnologia. Formado em jornalismo pela PUC-SP e com pós em Política e Relações Internacionais pela FESPSP, acumula passagens por veículos como Exame, UOL, Meio & Mensagem e Propmark