Bloomberg Línea — O americano Richard Thaler foi premiado com o Nobel de Economia em 2017 pelo conjunto da obra de suas pesquisas na economia comportamental, que incluiu o conceito conhecido como nudge. Ele se refere a um “empurrão” para desfechos desejáveis na tomada de decisão, sem que isso represente uma obrigação.
Um dos exemplos mais consagrados e comprovados de forma empírica é de oferecer a trabalhadores a proposta de planos de aposentadoria em empresas com a adesão (o opt-in) como default, em vez de exigir que ele tenha que assinalar essa escolha no formulário. Os exemplos são incontáveis no mundo econômico.
O mais novo exemplo de uso do nudge vem do Nubank em sua estratégia para não só ganhar relevância no crescente segmento de adolescentes com vida financeira própria mas para estimular um uso consciente do dinheiro.
O banco digital fundado e liderado por David Vélez e Cristina Junqueira decidiu colocar no mercado um novo cartão de crédito voltado exclusivo para jovens com 16 e 17 anos, cujo limite de gastos mensal está atrelado ao valor disponível em “caixinhas” com recursos anteriormente poupados pelos mesmos.
“Tanto a decisão de começar a atender esse público lá atrás quanto a do lançamento do produto agora se relacionam com o movimento do Nubank de buscar identificar as necessidades que os clientes manifestam”, disse Felipe Sotto-Maior, gerente sênior para o segmento, em entrevista à Bloomberg Línea.
O banco já atende esse público desde 2022, mas em geral não havia comentado publicamente até então sobre o seu racional e a estratégia no segmento.
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Segundo o executivo, em manifestações via canais de atendimento do banco, o cartão de crédito se mostrou - e se mostra - o produto mais solicitado pelos adolescentes; ao mesmo tempo, a concessão de crédito é um dos principais pontos de preocupação dos pais ou do responsável pelo menor de idade, dado o seu potencial de prejuízo não só financeiro, como conhecido na sociedade.
“Qual o nosso racional? Quando completar 18 anos, esse jovem passará a ter acesso no mercado a um cartão de crédito, sem um ambiente em que os pais consigam acompanhar ou proteger, mesmo que seu nível de maturidade financeira não seja muito diferente do que quando tinha 16 ou 17 anos”, disse o executivo.
“Oferecer um cartão de crédito que permita que esse jovem de 16 ou 17 anos comece a entender como o produto funcional, com acompanhamento dos pais, é algo em que enxergamos muito valor”, completou Sotto-Maior.
Segundo ele, os jovens podem gerenciar o próprio cartão com autonomia, sem precisar de dados ou senhas dos pais.
Além disso, em breve, missões educativas “gamificadas” pretendem estimular e ensinar como economizar e usar o crédito com inteligência.
Caso a fatura não seja paga no vencimento pelo adolescente, o valor é debitado automaticamente do saldo disponível nas “caixinhas”, que rendem o equivalente a 100% do CDI. Não há cobrança de juros do rotativo nem negativação do nome em bureaus de crédito, como se pratica no mercado mais amplo.
O objetivo, portanto, destacou Sotto-Maior, é que esse jovem tenha condições mais apropriadas para aprender como se faz a gestão das finanças com o uso do cartão de crédito na prática.
“A escolha das ‘caixinhas’ para definir o limite de crédito reflete um comportamento já consolidado entre os jovens clientes do Nubank. Hoje, 47% desse público têm o produto ativo”, disse o executivo.
Segundo ele, o controle parental, que permite o acompanhamento do comportamento financeiro, é uma das funcionalidades mais demandadas pelos pais ou os responsáveis pela abertura da conta e posterior manutenção.
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O banco, que encerrou o segundo trimestre com 122,7 milhões de clientes globalmente, dos quais 107,3 milhões no Brasil, não divulga o tamanho da base de adolescentes e crianças - a sua conta com movimentações para menores está disponível para aqueles que possuem a partir de 6 anos de idade.
O gerente sênior para o segmento disse que essa base tem crescido desde que o produto financeiro passou a ser oferecido.
“É uma geração que já nasce digitalizada. Pegar o celular e começar a usar é algo natural. A digitalização do dinheiro para tomar um lanche ou ir ao shopping e gastar é uma realidade. E o nosso produto tem se tornado cada vez mais relevante”, disse o executivo sobre a aderência do público à conta do Nubank.
‘Crescimento consistente’
“Temos visto um crescimento bastante consistente no tamanho dessa base e também de adolescentes que se tornaram clientes do Nubank quando completaram 18 anos e entraram na vida adulta”, afirmou em referência a uma jornada de certa forma esperada no relacionamento com uma instituição.
No recorte por idade, a maior parcela dos clientes está na faixa entre 13 e 15 anos, que responde por 43% do total abaixo de 18 anos; o intervalo de 16 e 17 anos tem 40% dos clientes, e os demais 17% possuem entre 6 e 12 anos.
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Não é de hoje que o segmento que atende adolescentes recebe atenção de bancos e fintechs. Mas o avanço da tecnologia e de novos hábitos digitais, que permitem um acompanhamento e um controle mais próximo, potencializou a expansão do segmento.
Hoje existem fintechs integralmente dedicadas a esse público, como a NG.Cash, cofundada e liderada pelo CEO Mario Augusto Sá.
A startup já captou mais de R$ 300 milhões de fundos renomados do Vale do Silício, como a a16z (Andreessen Horowitz), desde a sua fundação, com o modelo de negócios de ser um banco digital voltado para novas gerações.
Sotto-Maior, por sua vez, fala com conhecimento de causa. O estudo e a adoção de ferramentas que ajudem o cliente a poupar e a investir fazem parte de seu escopo de trabalho desde pelo menos sua iniciativa pregressa como sócio fundador da Vérios, uma fintech especializada em investimento automatizado via robô advisors.
A Vérios foi adquirida pela Easynvest no começo de 2021, momento em que a corretora digital já estava, por sua vez, em processo de análise de sua compra pelo Nubank. O executivo acabou posteriormente integrando o banco digital.
-- Em atualização.
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