Na Dotz, tese do IPO ganha tração e frente de crédito ‘escala’ e gera resultado

Em entrevista à Bloomberg Línea, o CEO Otávio Araujo conta como a empresa de tecnologia que nasceu com programa de fidelidade chegou ao lucro e acelera o Ebitda positivo com impulso da vertical de ‘techfin’ e do recém-lançado Dotz Pay

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Bloomberg Línea — Engajamento do cliente, “principalidade” e share of wallet se tornaram nos últimos anos termos frequentes citados por empresas de diferentes áreas de atuação, da financeira à de bens de consumo, para falar de alvos perseguidos.

Em comum, o objetivo de rentabilizar o relacionamento com o cliente. E também um foco no público socioeconômico das classes A e B, de maior renda e, em consequência, com maior capacidade de geração de receitas.

Mas isso não significa que não haja oportunidades para avançar na busca por objetivos semelhantes no público de renda mais baixa, das classes B-, C e D.

Essa tem sido a tese da Dotz, uma das empresas pioneiras no mercado brasileiro em buscar o engajamento do cliente por meio de um programa de fidelidade - em que, mais do que gerar resgates pontuais, há um racional de recorrência.

Os números trimestrais mais recentes da companhia, relativos ao segundo trimestre e divulgados na noite de quarta-feira, revelaram um novo estágio da operação.

“Tudo aquilo que projetamos na época do IPO [em maio de 2021] nós conseguimos mostrar no último trimestre em diferentes métricas de resultado”, disse Otávio Araujo, CEO da Dotz, em entrevista à Bloomberg Línea.

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O executivo fez referência a dados como o Ebitda (métrica de geração de caixa operacional) de R$ 15,8 milhões, com alta de 151% na base anual, à originação de R$ 134,2 milhões em crédito (+20%) na sua vertical de techfin, e ao lucro de R$ 2 milhões, em reversão a um prejuízo de R$ 6,1 milhões um ano antes.

A vertical chamada de Techfin gerou faturamento de R$ 27,7 milhões, com expansão de 22% ante o mesmo período de 2024.

Os números refletem a construção - apresentada na época do IPO, restrita a investidores profissionais - de uma plataforma de crédito que acelera e ganha tração, integrada à vertical de fidelidade, com uso de dados para entender o comportamento do usuário; e tudo isso em uma jornada digital por meio de um super app, conectado ao varejo físico para facilitar o uso dos serviços no momento de compra.

A principal alavanca continua a ser a vertical de fidelidade (loyalty), com uma base de mais de 50 milhões de clientes que podem ser ativados por meio de uma oferta assertiva de produtos e, principalmente, soluções financeiras - em particular, crédito, tão fundamental mas menos acessível no mercado para seu público-alvo.

Mas a análise dos hábitos do consumidor mostra que há diferentes jornadas, e não uma única. Isso significa a Dotz tem conseguido gerar engajamento a partir de diferentes frentes. “Já vemos muitas sinergias e a tendência é aumentar.”

Segundo ele, ao exemplificar, o cliente típico da Dotz vai muito ao supermercado: “buscamos desenvolver um produto que combinasse programa de fidelidade com a experiência de pagamento no caixa e a oferta de crédito”.

No fim de 2024, a empresa lançou o Dotz Pay, que o CEO descreveu como “uma evolução do produto de crédito da Dotz para o cliente e para o varejista”, na modalidade conhecida como Buy Now Pay Later (BNPL).

Segundo explicou, esse cliente, ao informar o CPF no ponto de venda, é informado do saldo que possui na Dotz e das alternativas de pagamento, que incluem de parcelamento pelo BNPL ao uso de crédito na modalidade tradicional.

O uso do BNPL gerou aumento de recorrência de 40% no segundo trimestre versus o primeiro, com avanço de 41% no número de contratos, dados que, na avaliação da empresa, “refletem a aderência do produto à realidade do ponto de venda”.

No fim do dia - ou do mês -, a companhia busca ampliar o poder aquisitivo do cliente, o que potencialmente amplia a conversão da base em usuários ativos.

“Hoje estamos com dois parceiros [varejistas] com o BNPL e vamos acelerar nos próximos meses”, disse o executivo, que acrescentou que há também novos produtos no roadmap.

Os investimentos em tecnologia e no desenvolvimento de produto ganharam força com a aquisição da fintech NoVerde em 2022, com sua expertise na área.

“Na medida em que aumentamos o uso do Dotz Pay, levamos esses clientes para dentro do aplicativo, em que ele descobre que tem acesso a crédito e a outras funcionalidades. E isso aumenta o engajamento”, disse Araujo.

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Para suportar a execução dessa estratégia, a Dotz levantou R$ 60,2 milhões em debêntures no segundo trimestre, o que ampliou a sua capacidade de funding, junto com a constituição de um novo FIDC (Fundo de Investimento em Direito Creditório), em que a própria empresa entrou com R$ 12,5 milhões.

Desde a oferta pública inicial da Dotz (DOTZ3), o mercado evoluiu para um ponto em que a competição deixou de acontecer necessariamente dentro das diferentes verticais - bancos digitais, loyalty, wallets, marketplaces etc. - e se tornou uma disputa mais ampla e transversal pelo aumento do engajamento do cliente.

De um lado estão grandes bancos, em que alguns, como o Itaú (ITUB4), avançam nessa competição mais ampla; de outro, players digitais que se descolaram dos demais em escala e alcance, caso de Nubank (NU) e Mercado Livre (MELI). Outro concorrente mais à frente nessa disputa é o Inter (INTR).

E há competidores que apresentam um ou mais ativos para se diferenciar.

Na visão de Araujo e do fundador e acionista controlador, Roberto Chade, a Dotz construiu ao longo de anos competências - e “massa crítica” - nas três verticais citadas, em loyalty, dados e, mais recentemente, serviços financeiros, com sua moeda que gera recorrência ao ser utilizada em consumo do dia a dia.

Araujo está no comando da Dotz há pouco mais de um ano, desde maio de 2024, em substituição justamente a Chade, que hoje participa da estratégia como acionista de referência.

Outros acionistas relevantes e que ancoraram a oferta pública inicial são o Ant Group, gigante chinês de tecnologia, o SoftBank e a Farallon Capital - os três continuam comprometidos com a tese como investidores de longo prazo, segundo o CEO.

As ações da Dotz negociadas na B3 sobem cerca de 120% no acumulado deste ano e perto de 20% em 12 meses.

-- Em atualização.

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