Mudanças em doenças demandam investimentos, diz líder da Roche para LatAm

Rolf Hoenger, head da Roche Pharma para a região, diz à Bloomberg Línea que a adaptação dos sistemas de saúde é uma necessidade e uma oportunidade ao setor

Roche mira crescimento em seus negócios também na América Latina
13 de Dezembro, 2023 | 05:05 AM

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Bloomberg Línea — Uma mudança de paradigma preocupa a indústria farmacêutica e coloca à prova as empresas que operam na América Latina: tanto o volume de doenças quanto a demanda por tratamentos têm mudado e a estrutura dos sistemas de saúde ainda não é capaz de lidar com essa evolução. Esse ambiente de transformação destaca a necessidade de adaptação dos países da região, de acordo com Rolf Hoenger, diretor da Roche Pharma para a América Latina, em entrevista à Bloomberg Línea.

Para Hoenger, a América Latina está em um ponto de inflexão em que a adaptação dos sistemas de saúde às doenças não transmissíveis (DNTs) não é apenas uma necessidade médica, mas também uma oportunidade estratégica para impulsionar o desenvolvimento e o crescimento econômico da região.

Como executivo da Roche Pharma, Hoenger mora no Brasil há dez anos e viveu outros 23 anos em países como Argentina, Peru, Colômbia, Equador e outros da América Central. Ele também esteve à frente da criação da divisão asiática da Roche.

Em 2022, a Roche respondeu por 6% do mercado farmacêutico global, com um valor estimado de US$ 1,48 bilhão, de acordo com estimativas da Statista, atrás apenas da Pfizer (PFE), com uma fatia de 9%.

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Desde que chegou à América Latina, o executivo testemunhou como as doenças classificadas como não transmissíveis (DNTs), como as cardiovasculares, o câncer e os transtornos de saúde mental, têm remodelado os cuidados de saúde na região.

As DNTs representam um desafio maior do que o setor e os governos estão acostumados, disse o executivo. “Elas exigem uma perspectiva de gerenciamento de longo prazo e uma infraestrutura que hoje não está desenvolvida em muitos países da América Latina.”

Hoenger enfatizou a urgência de os sistemas de saúde se adaptarem para gerenciar essas condições crônicas, que exigem uma abordagem sustentada e de longo prazo para o atendimento, muito diferente daquela exigida para as doenças infecciosas que tradicionalmente dominam o volume de doenças na região.

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Rolf Hoenger, Head de Roche Pharma para Latinoaméricadfd

Além dos medicamentos

Porém, para resolver essa situação, não basta investir em novos medicamentos. “Não é apenas uma questão de medicamentos mas de como os sistemas de saúde integram a prevenção, a detecção precoce e o tratamento contínuo dessas condições”, explicou.

Para Hoenger, o investimento em inovação é essencial para melhorar a eficiência e a sustentabilidade dos sistemas de saúde. “Os governos precisam ser convencidos de que a saúde não é uma despesa mas um investimento com um retorno econômico e social tangível.”

O executivo comentou, citando um relatório da McKinsey, que cada dólar investido em saúde pode dobrar o retorno na economia, gerando um impacto econômico positivo que transcende os benefícios imediatos para a saúde.

Nesse sentido, ele destacou a importância de políticas públicas inclusivas que garantam a equidade no acesso à saúde. Ele deu um exemplo para medir as perdas “de dois gumes” de uma política de saúde pública ineficaz.

“Imagine uma criança com hemofilia grave. Ela provavelmente não poderá ir à escola devido à falta de infraestrutura da instituição de ensino para lidar com uma emergência.”

“E, se ela estiver em casa, especialmente em realidades como as da América Latina, sua mãe não poderá trabalhar porque terá de cuidar da criança. Portanto, estamos diante de dois problemas: uma criança que não é educada e uma mãe que está fora do mercado de trabalho.”

Tratamentos antecipados

De acordo com o executivo, é necessária uma visão holística da saúde, em que a prevenção, a detecção precoce e o tratamento, juntamente com políticas públicas eficazes e a participação de agentes privados, possam criar um ecossistema de saúde mais resiliente e preparado para enfrentar as doenças não transmissíveis.

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A abordagem não é apenas médica mas também tecnológica e organizacional, disse Hoenger. A implementação de tecnologias emergentes, como a inteligência artificial (IA), para detecção precoce de doenças, e a colaboração entre setores podem oferecer soluções inovadoras que melhoram a qualidade e a acessibilidade do atendimento. “Estamos falando de um salto quântico no atendimento por meio da inteligência artificial, da telemedicina e da digitalização dos dados de saúde”, afirmou.

Em um contexto em que 1,67 milhão de casos de câncer de mama é diagnosticado anualmente em todo o mundo, a aplicação de técnicas avançadas de sequenciamento genético e análise de dados, apoiadas pela inteligência artificial, “permitiu que a Roche identificasse marcadores genéticos exclusivos e antecipasse as respostas ao tratamento”, segundo Hoenger.

Nesse sentido, explicou, a Roche integrou soluções como a Flatiron Health, líder em dados oncológicos, e a Foundation Medicine, especializada em perfis genômicos abrangentes de tumores, para identificar terapias direcionadas, imunoterapias e ensaios clínicos personalizados para os pacientes.

Além do uso da tecnologia, o grupo também considera fundamentais as estratégias de investimento e as aquisições de empresas inovadoras. Um exemplo foi o recente acordo para adquirir a Telavant, destacando seu foco no desenvolvimento de medicamentos experimentais.

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A Roche comprometeu-se inicialmente com US$ 7,1 bilhões nessa transação com a Roivant Sciences e a Pfizer, consolidando sua posição no campo da doença inflamatória intestinal, uma condição que afeta cerca de 8 milhões de pessoas em todo o mundo.

Mais recentemente, a Roche aceitou pagar US$ 3,1 bilhões pela Carmot Therapeutics, que desenvolve um novo tipo de tratamento para perda de peso que tem provocado uma espécie de “corrida do ouro” na indústria farmacêutica.

O acordo pode levar a suíça a competir com a rival europeia Novo Nordisk, cujos medicamentos Wegovy e Ozempic ajudaram a tornar a empresa dinamarquesa a mais valiosa do continente.

Avanço das big techs

Grandes empresas de tecnologia como Apple (AAPL), Amazon (AMZN), Google e Microsoft (MSFT) estão mais envolvidas no setor de saúde, lançando serviços inovadores que antes eram de domínio das empresas farmacêuticas.

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Os laboratórios, por sua vez, mudam seus modelos de negócios para serviços inovadores, com algumas empresas deixando de ser fabricantes de medicamentos para se tornarem fornecedores de tecnologia e dados.

Questionado sobre o avanço crescente das big techs no setor de saúde, o executivo disse acreditar que a incursão dessas companhias em saúde pode representar tanto um desafio quanto uma oportunidade.

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O segredo, segundo ele, é “colaborar” com as novas forças do mercado. “Há espaço para todos. Para alguns, a essência é desenvolver novos medicamentos, enquanto para outros é trabalhar com dados e diagnósticos. Quando há uma espécie de ‘consórcio’ para trabalhar na solução de problemas, isso é o ideal”, disse.

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Michelly Teixeira

Jornalista com mais de 20 anos como editora e repórter. Em seus 13 anos de Espanha, trabalhou na Radio Nacional de España/RNE e colaborou com a agência REDD Intelligence. No Brasil, passou pelas redações do Valor, Agência Estado e Gazeta Mercantil. Tem um MBA em Finanças, é pós-graduada em Marketing e fez um mestrado em Digital Business na ESADE.