Investigação da Reag pesou para BC reprovar compra do Master pelo BRB, dizem fontes

As ligações do Master com a Reag e a Trustee, alvos de uma operação da PF que revelou R$ 52 bilhões em transações suspeitas, foram decisivas para o BC barrar a fusão com o BRB, segundo fontes que falaram à Bloomberg News

Sede do Banco Master, em São Paulo
Por Cristiane Lucchesi - Rachel Gamarski - Matheus Piovesana - Martha Beck
09 de Setembro, 2025 | 10:02 AM

Bloomberg — Acusações de que o negócio seria um socorro público disfarçado, ativos de baixa qualidade e um presidente de banco sob severo criticismo que viajou de férias. Tudo isso já pesava na mente dos reguladores quanto eles ponderavam se deviam ou não aprovar a compra do Banco Master pelo Banco de Brasília.

Daí surgiu outro sinal de alerta: os vínculos do Master com empresas envolvidas em uma grande investigação de lavagem de dinheiro que abalou o setor financeiro brasileiro.

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O Banco Central do Brasil rejeitou a aquisição na semana passada sem fornecer uma explicação pública, o que pode ter contribuído para que as ações do BRB, como é conhecido o Banco de Brasília, despencassem e deixasse o Master com poucas opções em sua busca por capital.

Leia também: Banco Central reprova compra do Master, de Daniel Vorcaro, pelo BRB

Embora houvesse muitas razões para a decisão, de acordo com pessoas familiarizadas com o assunto que falaram à Bloomberg News, o golpe final foi a revelação de que a Reag Investimentos e a Trustee — que forneciam serviços de gestão de recursos para o Master — estão sendo investigadas como parte de uma operação multiestadual para desmantelar esquemas criminosos de lavagem de dinheiro vinculados à distribuição de combustível.

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Embora o Master e seus executivos não tenham sido acusados ​​de qualquer má conduta, a associação com a Reag e a Trustee aumentou a inquietação do Banco Central em relação ao negócio, disseram as pessoas, que pediram para não serem identificadas ao discutirem informações que não são públicas.

A Reag e a Trustee negaram qualquer irregularidade e disseram que tem cooperado com a investigação.

O veto do BC é o mais recente revés para o Master, um banco de capital fechado que se expandiu excessivamente ao comprar ativos opacos e de risco com recursos garantidos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC) do sistema financeiro.

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Os negócios – que turbinaram a carteira do banco – atraíram a atenção do Banco Central quando uma mudança de regra colocou as finanças do banco em dúvida.

Uma aquisição pelo BRB, que é controlado pelo governo de Brasília, foi apresentada como uma transação que uniria dois bancos com uma “complementaridade de negócios, solidez, liquidez e capital”.

Leia também: Reag diz que negocia venda de controle após operação sobre possível elo com PCC

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Mas os críticos foram rápidos em rotular a medida como um resgate governamental de um negócio arriscado, o que deixou o sistema bancário brasileiro encarregado de juntar os pedaços.

Em determinado momento, o Master tinha cerca de R$ 60 bilhões em depósitos e títulos segurados, o que significa que os maiores bancos do país, que são os principais financiadores do FGC, seriam responsáveis ​​por repor o fundo caso o Master quebrasse. O FGC tinha cerca de R$ 152 bilhões em ativos em maio.

Nesse contexto, os reguladores brasileiros começaram a analisar o negócio.

O chamado risco moral — a ideia de que o acordo funcionava como um socorro financeiro e encorajaria outros a assumir riscos sem sofrer as consequências — era uma preocupação fundamental para os supervisores do Banco Central, segundo três pessoas familiarizadas com o processo.

Eles também se concentraram em como o negócio foi estruturado, com um pacote de ativos de melhor qualidade sendo transferido para o balanço do BRB, enquanto ativos menos desejáveis ​​— como pré-precatórios e ações de pequenas empresas em dificuldades — permaneceriam em uma empresa remanescente.

Os reguladores previram uma situação potencial em que a empresa remanescente precisaria ser resgatada pelo FGC, que ficaria com os ativos de risco. Sem a fusão, pelo menos, o FGC também receberia os ativos bons do Master caso precisasse intervir, disseram as pessoas.

Uma carteira de ativos que o BRB comprou do Master em 2024 também está sob revisão, assim como o risco de o banco controlado pelo governo de Brasília ser contaminado com ativos ruins devido ao acordo, o que poderia representar um risco mais amplo para o sistema financeiro.

Em seguida, em 28 de agosto, ocorreu a operação contra o crime organizado na cadeia de suprimentos de combustíveis e na indústria de fintechs do Brasil, que, segundo a Polícia Federal, expôs transações ilícitas que totalizaram R$ 52 bilhões.

Embora os principais alvos da operação sejam membros de grupos do crime organizado, ela também capturou pelo menos 350 pessoas e empresas citadas nas investigações, sem deixar de fora diversas instituições financeiras.

A Reag e os fundos administrados pela Trustee estão entre os alvos, de acordo com documentos vistos pela Bloomberg News.

Dois fundos operados pela Reag forneceram pelo menos R$ 1,2 bilhão em financiamento ao Master no ano passado, informou O Estado de S. Paulo, na semana passada. 

Leia também: Polícia Federal e Receita investigam Reag e 40 fundos suspeitos de ocultar criminosos

Maurício Quadrado, dono da Trustee, foi sócio do Master até o ano passado; e o fundador da Reag, João Carlos Mansur, é amigo do presidente e acionista controlador do Banco Master, Daniel Vorcaro, e já fez vários negócios com ele.

O Master é um dos centenas de clientes do Reag, afirmou o banco em um comunicado. Reag, Trustee, Quadrado e Mansur não responderam a pedidos de comentários.

O desdobramento colocou o negócio sob nova análise, disseram as pessoas. Os reguladores já estavam incomodados com o comportamento pessoal de Vorcaro, após ele viajar para o balneário francês de Saint-Tropez em julho.

Eles consideraram que as férias eram inconsistentes com as funções de um presidente de uma empresa em dificuldades e em fase de negociação. 

Vorcaro disse que ele tirou férias para passar um pouco de tempo com suas crianças e não quis comentar sobre questões relacionadas ao veto do negócio pelo regulador.

Em um comunicado apresentado na sexta-feira, o BRB afirmou que não tinha acesso aos documentos do BC sobre a rejeição da transação e que só poderia avaliar suas opções se tivesse acesso a mais informações.

O Banco Central não quis comentar.

Enquanto isso, parlamentares da Câmara dos Deputados pressionavam os reguladores.

Na semana passada, um grupo de partidos do chamado centrão na Câmara aprovou um pedido de urgência para acelerar um projeto de lei que permitiria ao Congresso destituir diretores do Banco Central caso tomassem decisões consideradas contrárias ao interesse nacional.

O projeto é anterior ao caso Banco Master, mas foi criticado por ex-presidentes do Banco Central como uma ameaça à autonomia da instituição.

A rejeição ao negócio, quando finalmente veio, foi divulgada ao mercado em um comunicado do BRB. As ações do banco chegaram a cair 17% em São Paulo no dia seguinte.

Tanto o BRB quanto o Master disseram que tem revisado a decisão enquanto tentam determinar uma maneira de prosseguir.

Os bancos poderiam tentar elaborar uma nova transação com um escopo menor, de acordo com uma das pessoas familiarizadas com o assunto, embora já tenham reduzido o valor dos ativos que o BRB adquiriria na tentativa de apaziguar os reguladores.

Gabriel Galípolo, que assumiu a presidência do Banco Central este ano, deve se reunir com Vorcaro nesta terça-feira, de acordo com sua agenda oficial.

O presidente do Master apresentará um novo plano para o banco na reunião, disse uma pessoa familiarizada com o assunto. Executivos do BRB também se reúnem com diretores do BC para discutir a rejeição, disse outra pessoa.

Galípolo afirmou na sexta-feira que as votações sobre o acordo do Master são confidenciais para proteger informações sensíveis de ambas as instituições.

Ele elogiou a importância da autonomia do Banco Central e disse que o caso do Master não representa riscos para o sistema financeiro brasileiro.

“O sistema brasileiro é completamente sólido do ponto de vista da estabilidade”, disse ele. “Não há qualquer ameaça.”

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