Herdeiro de concessionárias aposta alto na China para crescer em vendas no Brasil

Grupo Amazonas projeta chegar a R$ 2 bilhões em receitas em 2025 com força de vendas das marcas GAC, Geely, Leapmotor e Omoda & Jaecoo em momento de transformação do setor automotivo, conta o COO Victor Viana à Bloomberg Línea

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Bloomberg Línea — Quando o então estudante Victor Viana desembarcou pela primeira vez em uma estação de metrô de Xangai em 2012, ele não tinha ideia de que precisaria não só aprender o idioma mas também alguns dos conceitos mais importantes do mundo corporativo da China: o conhecimento seria valioso para, alguns anos mais tarde, assumir o negócio de concessionárias fundado pelo pai no Brasil, o Grupo Amazonas.

À época com 22 anos, ele se mudou para a metrópole chinesa depois de ganhar uma bolsa de estudos pela USP (Universidade de São Paulo). “Eu não entendia nada do que eles falavam”, disse em entrevista à Bloomberg Línea.

Além do mandarim, ele precisou desenvolver habilidades de conquista da confiança no mundo dos negócios, o Guanxi, e ter em mente que os chineses são metódicos na rotina corporativa, adotando o famoso mantra “996” (que há muitos anos significava trabalhar das 9 da manhã às 9 da noite, seis dias por semana).

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Em 2018, Viana voltou à China para fazer uma visita, dessa vez já como executivo do grupo Amazonas. “Na primeira vez que fui a Xangai, o Brasil era muito mais avançado em termos de carros. Quando voltei anos mais tarde, tudo tinha se transformado. Já havia uma tendência de eletrificação dos veículos”, relatou.

O herdeiro de um dos maiores grupos de concessionárias do país assumiu a missão de tocar o negócio em um momento de transição do segmento.

O avanço das vendas online e dos conteúdos sobre carros na internet mudou a forma como os consumidores chegam à loja: com a decisão de compra já praticamente tomada.

Neste cenário, as concessionárias vêm se transformando para continuar a atrair o consumidor.

Viana afirmou que há uma tendência crescente de fusões e aquisições no segmento, de modo que restam poucas empresas familiares.

O exemplo mais emblemático disso foi a abertura de capital do grupo de concessionárias Automob (AMOB3), controlado pela gigante Simpar (SIMH3), em dezembro de 2024, após sucessivas aquisições.

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“É difícil a sucessão no negócio de concessionárias. Não tem ‘glamour’ e existe uma imagem de que muitas empresas não prestam um serviço idôneo”, disse Viana, que hoje é COO (Chief Operating Officer) do grupo.

Manter uma loja de carros com estoques e serviços já é caro por si só. Em localizações estratégicas de grandes capitais, como São Paulo, por exemplo, o capital de giro mínimo exigido pode alcançar a cifra de R$ 10 milhões, segundo apurou a reportagem da Bloomberg Línea.

Isso não deve impedir que o grupo Amazonas passe de 24 para cerca de 40 lojas até o fim do ano, com destaque para marcas recém-chegadas da China, o país que Viana tanto passou a conhecer: GAC, Geely, Leapmotor e Omoda & Jaecoo.

A projeção de faturamento para 2025 é de R$ 2 bilhões.

Entre as montadoras já representadas, a empresa trabalha com Fiat, Peugeot, Citroën, Jeep, Ford e Renault.

Viana afirmou que a estratégia inclui entender profundamente a estrutura das marcas chinesas escolhidas, tanto no país asiático quanto na possibilidade de abertura de fábricas no Brasil.

“Escolhemos as marcas que sabíamos que teriam esses requisitos. Fomos visitar todas essas montadoras na China”, disse.

Em sua avaliação, a tendência é que haja uma redistribuição das participações de mercado das montadoras no Brasil nos próximos anos.

“Existem marcas consolidadas no país. A Fiat, por exemplo, conseguiu manter seu market share. Mas acredito que haverá uma ‘dança das cadeiras’ nos próximos anos e por isso estamos apostando nas marcas chinesas”, acrescentou.

Terceira onda chinesa

Viana lembrou que, na primeira onda de carros chineses que chegaram ao Brasil, em meados de 2010, o produto era acessível em preço e tinha muito conteúdo sobre, mas com uma qualidade não tão boa quanto no mercado nacional.

Já a segunda onda, alguns anos depois, trouxe a parceria da Chery com a Caoa, com preço inferior às montadoras locais e qualidade próxima.

“Agora, na terceira onda, o carro chinês é tão bom quanto o nacional e tem um preço muito competitivo, além de ter tecnologias mais avançadas”, afirmou.

Nesse contexto, Viana viaja para a China uma vez por ano para visitar as fábricas e conhecer os produtos. “A China encurtou muito o lançamento de produtos. Lá, um carro demorava de três a cinco anos para ser lançado e agora os chineses estão conseguindo lançar em até um ano e meio.”

O executivo estimou que as marcas chinesas devam representar cerca de 20% do faturamento do grupo nos próximos dois anos.

‘Condomínios’

Enquanto o varejo de automóveis registra queda no Brasil, Viana disse que o Grupo Amazonas cresceu 10% nas vendas diretas ao consumidor final.

“Conseguimos crescer com eficiência e estrutura.”

As lojas do grupo também têm uma forte atuação no mercado de pessoas jurídicas, conhecido como “venda direta” no setor automotivo.

Além da aposta em marcas chinesas, o grupo também acredita na expansão do modelo de “condomínios” de concessionárias: em um mesmo endereço, a Amazonas mantém showrooms de mais de uma marca.

Embora as lojas estejam em espaços físicos separados, todo o administrativo (back office), as peças e serviços estão concentrados em um só lugar.

“Isso não só facilita a logística para nós mas também dá mais alternativas ao cliente, caso ele não possa comprar o modelo que originalmente gostaria. Oferecemos opções de outras marcas de novos e também de seminovos”, disse Viana. Ele acredita que a oferta de seminovos é crucial para ampliar o público-alvo.

Os preços dos seminovos (com até quatro anos de uso) no período de janeiro de 2024 até junho deste ano têm se mantido estáveis, segundo levantamento da Autorola do Brasil, multinacional dinamarquesa com foco no gerenciamento de veículos usados.

“Isso demonstra um mercado aquecido, com seminovos mantendo seu valor. Acreditamos que o preço do zero quilômetro e a alta taxa de juros estejam estimulando a procura pelos veículos usados”, afirmou o diretor-geral da Autorola do Brasil, Marcelo Barros.

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Nesse contexto, o Grupo Amazonas tem quatro lojas dedicadas a seminovos e o plano é expandir para dez unidades no total. “Estamos terminando o desenho dessa estratégia”, disse Viana.

Receita em expansão

Há cerca de cinco anos, o grupo passou a vender peças também no ambiente online, nos grandes marketplaces, como Magazine Luiza (MGLU3) e Mercado Livre (MELI).

Somente no Mercado Livre, a Amazonas possui mais de 25.000 “SKUs” (número de produtos em suas mais variadas especificações).

Hoje, a venda online já representa 10% do total da receita de peças do grupo, e a tendência é que essa fatia aumente no futuro. “Também temos um projeto piloto com a Shopee”, disse Viana em referência ao player asiático.

A diversificação faz parte da estratégia para perpetuar a empresa. Viana lembrou que seu pai começou a atuar no setor automotivo em 1979, com uma loja de motos usadas.

Hoje, ele comanda o negócio com suas duas irmãs, que trabalham como diretoras administrativa e financeira. “A sucessão foi algo natural, nunca teve uma conversa. Foi o resultado do trabalho nas diferentes áreas da empresa”, disse.

Ele acrescentou que as concessionárias caminham para se tornar centros de experiência. “No futuro, queremos tornar o grupo líder em mobilidade, oferecendo diversas opções para o cliente”, afirmou o herdeiro.

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