‘Febre Labubu’ se torna fenômeno também de pirataria e vai de Lafufu a Tribufu em SP

Comércio popular aproveita o fenômeno da cultura pop de bonecos colecionáveis de pelúcia para ‘despejar’ versões falsificadas e até defeituosas a preços mais baixos, como verificou a Bloomberg Línea em ‘camelódromos’

Tribufu, versão pirata e com defeito da Labubu
10 de Julho, 2025 | 05:12 PM

Bloomberg Línea — Um brinquedo de pelúcia em diversas cores que funciona como pingente de bolsas ganhou o mundo - e o Brasil - nos últimos meses.

A “febre Labubu” mostra que a indústria chinesa também é capaz de criar fenômenos globais de design e, ironia, também alimentar inadvertidamente a pirataria de um típico produto made in China.

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O varejo global oficial lucra com o boneco colecionável da Pop Mart, mas também vendedores informais que exibem versões falsificadas do “monstrinho”.

A reportagem da Bloomberg Línea visitou dois camelódromos, como são chamadas as ruas dedicadas ao comércio de falsificações de marcas globais, na região central de São Paulo, maior mercado consumidor do Brasil.

Em uma loja no Brás, a reportagem encontrou as Lafufus, como os brasileiros batizaram as pelúcias falsas de Labubu, também importadas da China. Cada boneco custa R$ 40, metade do valor pago por um original adquirido em marketplace.

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No varejo oficial, que paga impostos, os tempos também são de ganhos crescentes com o fenômeno da cultura pop.

Para o setor formal, contar com um canal de distribuição especializado no comércio com a China é fundamental para conseguir “surfar a onda” dos elfos peludos de sorriso travesso, que cativam consumidores em parte com o seu efeito surpresa, já que são embalados em sacola fechada, de cores vibrantes.

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É o caso da Magazine Luiza (MGLU3), que opera um dos maiores marketplaces do Brasil: a parceria estratégica com o Alibaba - e o AliExpress -, do bilionário chinês Jack Ma, anunciada em junho de 2024, ajudou a multiplicar as vendas da categoria.

O Magalu registrou aumento nas vendas de itens relacionados à linha de brinquedos Labubu em maio e junho quando comparados ao mês de abril, informou a varejista controlada pela família Trajano em e-mail enviado à Bloomberg Línea.

Em maio, as vendas desses produtos no Magalu cresceram 15 vezes e, no mês seguinte, aumentaram 10 vezes em relação a abril, detalhou a companhia, sem revelar os dados absolutos de vendas em volume ou receitas.

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Lafufus, versão falsificada da Labubu, no Brás, em São Paulo

Peso dos impostos

A coleção de Labubu, encontrada no Magalu, era vendida e entregue pelo AliExpress. Por se tratar de uma compra internacional, o consumidor paga impostos de importação. O marketplace brasileiro tem exibido anúncios do produto em redes sociais como Instagram e Facebook.

O item original da série The Monsters teve o preço fixado em R$ 54,45 no dia 1º de junho. A compra era finalizada a R$ 81,68 com a incidência do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) de R$ 16,34 e do imposto de importação de R$ 10,89.

O Magalu adotou a estratégia de frete grátis para a entrega do Labubu - ainda que o produto tenha levado três semanas para chegar ao destino.

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No Brás, as Lafufus começaram a invadir as lojas de importados da China no primeiro trimestre.

Na mesma época, influenciadores digitais começaram a promover o produto com vídeos de unboxing, ou seja, do registro do momento de abertura da embalagem de um produto novo, geralmente acompanhado de comentários e análises sobre ele.

Nos camelódromos na maior capital do país, as Lafufus são exibidas fora das sacolas falsificadas, o que permite ao consumidor escolher sua cor.

Nas lojas visitadas, a reportagem da Bloomberg Línea encontrou também as Tribufus, como são chamadas versões falsificadas de Labubus mais baratas e descaracterizadas, com defeitos de fabricação, como a cabeça invertida ou algum acabamento malfeito.

Gerações Z e Alfa como alvos

As pelúcias da Pop Mart começaram a se popularizar nos Estados Unidos no quarto trimestre do ano passado, quando começaram a ser destacadas como tendência em relatórios de comportamento das novas gerações - adquiridos por agências de publicidade.

Em novembro do ano passado, por exemplo, a moda de usar Labubu como “acessório descolado” de bolsa foi destacada pela newsletter After School, no Substack, assinada por Casey Lewis, especialista em hábitos de consumo de estudantes das gerações Z e Alfa nos EUA, segundo reportagem publicada pelo jornal The Washington Post no último dia 29 de maio.

No TikTok, entusiastas da estética de toy art gravam vídeos em que mostram as diferenças entre o original e o modelo falsificado, como a presença ou não de material de qualidade de confecção e acabamento do produto, além de selo de autenticidade, em um QR Code presente no verso da caixa.

Lafufus, versão falsificada da Labubu, no Brás, em São Paulo

Custo da pirataria no Brasil

O fenômeno Labubu é mais um capítulo no histórico de avanço da pirataria no comércio popular do Brasil, tomado por cópias de marcas globais de vestuário, calçados, acessórios, eletrônicos, perfumes e cosméticos.

Os prejuízos com falsificação e comercialização de marcas e produtos somaram cerca de R$ 100 bilhões em 2024, segundo estimativa da ABCF (Associação Brasileira de Combate à Falsificação).

No Brasil, além de crime para quem falsifica, a compra de produtos ilegais também pode resultar em penalidades cíveis e criminais.

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Ainda assim, os esforços de combate a pirataria, contrabando e sonegação pelas autoridades são considerados insuficientes por especialistas.

“A concorrência desleal causa danos materiais e morais para as empresas que investem em pesquisas, desenvolvimento de produtos, marketing e até em registros de marcas e patentes”, disse Marcelo Brandão, sócio-diretor do escritório de proteção de propriedade intelectual Vilage Marcas e Patentes.

Líderes de mercado são os principais alvos de pirataria ou da concorrência desleal, afirmou. A imitação se dá de diferentes formas, como uso indevido de desenhos, cores, rotulagens parecidas, letras, nomes semelhantes.

Como a pirataria não é exatamente um fenômeno novo no Brasil e costuma ser justificada popularmente como um meio de acesso a bens mais caros por uma parcela de consumidores de baixa renda, adquirir uma versão falsificada não tem gerado constrangimento nos camelódromos.

“A compra de produtos falsificados contribui para um mercado ilegal que prejudica a economia, a inovação e os direitos de propriedade intelectual”, disse a advogada Sônia Carlos Antonio, do escritório Vilage Marcas e Patentes.

A advogada alertou ainda que esses produtos pirateados podem estar associados a riscos, como a falta de garantias e a baixa qualidade dos produtos, o que coloca ameaçar a segurança do consumidor.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.