Bloomberg Línea — Nos últimos meses, diferentes empresas globais recuaram de suas políticas de promoção de diversidade, equidade e inclusão, em particular nos Estados Unidos, diante da pressão do governo de Donald Trump.
Mas há companhias que reafirmaram os seus planos, como a Coca-Cola. Tem sido o caso também da L’Oréal, para a qual parte de sua estratégia de crescimento passa pela diversidade de suas equipes no mercado de consumo.
Foi o que disse o executivo Alexis Perakis-Valat, presidente global da Consumer Products Division - Divisão de Produtos de Grande Público, em português - da L’Oréal, na segunda parte da entrevista à Bloomberg Línea em passagem pelo Brasil.
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“Se você pensa no sucesso da L’Oréal e em como construir uma empresa bem-sucedida — e se você quer ter sucesso com bens de consumo —, você precisa ter equipes que reflitam a diversidade dos seus consumidores", disse o executivo de origem franco-grega, que lidera uma divisão que teve cerca de 16 bilhões de euros em vendas em 2024, com a maior contribuição para o grupo.
Ele destacou que, no Brasil, o Grupo L’Oréal, que inclui outras divisões, tem diferentes programas ESG (de caráter ambiental, social e de governança), como um denominado “Beleza Mais Diversa”, de apoio a criadores negros de conteúdo - dois terços dos creators apoiados foram contratados para campanhas da marca.
Há também sete projetos em parceria com ONGs locais que visam impactar cerca de 13.000 mulheres em condição vulnerável, entre as quais 850 indígenas, como parte de um fundo global da empresa criado em 2020 de apoio a essa população.
Segundo o executivo, tais programas estão preservados na estratégia da companhia.
Perakis-Valat comentou também sobre os efeitos das tarifas comerciais de Trump e ressaltou que elas não afetam a estratégia de negócios da gigante francesa de investir em mercados emergentes - como Brasil e México -, que responderam por metade do crescimento da divisão de consumo no ano passado.
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Veja a seguir a segunda parte da entrevista com Alexis Perakis-Valat, editada para fins de clareza e compreensão:
A L’Oréal é reconhecida há muitos anos por suas iniciativas em sustentabilidade, diversidade e inclusão. E temos visto, desde o início do ano, especialmente nos EUA, um recuo por parte de muitas empresas em tais políticas por causa da pressão do governo Trump. O que muda para a L’Oréal?
Nós permanecemos fiéis aos nossos valores. A diversidade está no centro dos nossos valores. E valor não é algo que você muda. É como uma pessoa: se você tem valores, esses valores são para a vida toda.
Primeiro, mantemos nossos valores — isso é algo muito, muito caro para nós. Em segundo lugar, se você pensa no sucesso da L’Oréal e em como construir uma empresa bem-sucedida — e se você quer ter sucesso com bens de consumo —, você precisa ter equipes que reflitam a diversidade dos seus consumidores.
Como se aplica essa decisão para o Brasil?
No Brasil, que é um país incrivelmente diverso, onde todos os tons de pele do mundo estão representados, isso é importante: primeiro pelos valores mas também para ter sucesso no país. É importante ter equipes incrivelmente diversas.
Na minha equipe global, por exemplo, tenho coreanos, três americanos, um alemão... tenho pessoas de todo o mundo. E isso muda totalmente a conversa ao redor da mesa quando você coloca pessoas que compartilham a paixão pela beleza, mas que têm pontos de vista, histórias e passados muito diversos.
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Houve recentemente o anúncio das tarifas por Trump. A empresa já tem uma perspectiva sobre como isso pode afetar as estratégias comerciais?
Estamos tentando entender. É simples assim. Segundo, acho que há muitos anos vivemos em um mundo muito volátil, incerto, complexo e ambíguo e aprendemos a operar nesse mundo.
Vivemos em um mundo em que algumas coisas podem ser planejadas. Por exemplo, planejamos nossa aceleração em emergentes porque sabemos que nesses mercados — América Latina, Sudeste Asiático, Oriente Médio — a classe média vai crescer. E sabemos que temos grande potencial de crescimento.
Portanto, planejamos. Construímos um laboratório no Brasil por essa razão. Mas há outras coisas que não se pode planejar — e claramente o que está acontecendo agora é difícil de planejar.
Vamos passar por isso como já passamos por muitas coisas. No que diz respeito à minha divisão, a maior parte do que vendemos nos Estados Unidos é produzida localmente. É o caso para muitos bens de consumo, especialmente produtos de alto giro.
Dados recentes da divisão de consumo indicam que a participação de mercados emergentes na receita total está crescendo. É uma tendência?
Acreditamos que sim. No ano passado, metade do nosso crescimento veio de mercados emergentes. E o Brasil foi uma parte significativa disso, dentro da América Latina — assim como o México. México e Brasil estiveram entre os maiores contribuintes para o crescimento da divisão globalmente.
E achamos que, como você disse, no médio prazo, é o curso natural da história. Por duas razões.
Primeiro, porque acreditamos que esses mercados vão crescer de forma desproporcional, por causa da expansão da classe média e do fato de que os consumidores nesses mercados estão se tornando cada vez mais experientes e sofisticados.
E, segundo, temos um menor market share nesses mercados em comparação com Europa ou EUA. Portanto achamos que haverá um duplo efeito: mercados que crescem rápido e nossa participação de mercado também cresce.
E foi isso que aconteceu, por exemplo, com L’Oréal Paris no Brasil. Nos últimos cinco anos, o negócio triplicou. Por quê? Porque houve uma conjunção da Elseve ganhando participação de mercado em um mercado brasileiro que estava muito dinâmico. E é isso que queremos — essa é claramente nossa estratégia em todos os mercados emergentes.
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