Como ficam as ‘juniors oils’ com a suspensão da venda de ativos pela Petrobras

Operadoras independentes como 3R, PetroReconcavo, Enauta e PRIO buscam novas formas de expansão diante de recuo da estatal com seu plano de desinvestimento

Exploração de petróleo em campos onshore tem sido uma das principais atividades das 'junior oils' (Foto: Alejandro Cegarra/Bloomberg)
06 de Fevereiro, 2024 | 05:05 AM

Bloomberg Línea — Diante da decisão estratégica da Petrobras (PETR3, PETR4) de cessar a venda de ativos em campos maduros, as operadoras independentes de petróleo – as chamadas junior oils – procuram alternativas para continuar a crescer. Além de movimentos incipientes de fusões e aquisições, essas empresas podem buscar a internacionalização para manter a perenidade dos negócios.

Embora as junior oils tenham muito trabalho pela frente, após concluir aquisições nos últimos dois anos, os investimentos na cadeia de óleo e gás são de longo prazo, o que exige das empresas um planejamento sobre os próximos passos.

“Como em qualquer negócio, os riscos para as operadoras independentes é garantir um direcionamento dos investimentos para aumento de produção, além da busca de novos volumes onshore [em terra]”, disse o diretor para o mercado de energia e recursos naturais da EY, João Loureiro.

Na última quinta-feira (01), a operadora independente 3R Petroleum (RRRP3) anunciou a contratação do Itaú BBA como assessor financeiro para avaliar uma potencial fusão de ativos com a PetroReconcavo (RECV3).

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No dia 18 de janeiro, a 3R informou ao mercado ter recebido uma carta da acionista Maha Energy propondo uma “reorganização societária envolvendo a PetroRecôncavo”. Na ocasião, a PetroRecôncavo divulgou em comunicado não ter recebido, até aquele momento, qualquer proposta de combinação de negócios com a 3R e que, portanto, não havia qualquer negociação em andamento.

Em nota à Bloomberg Línea, a 3R disse que a proposta da Maha Energy “será analisada por seu Conselho de Administração e que contratou uma instituição financeira para suportar a análise da operação, assim como da melhor estrutura societária para implementação da potencial transação, caso venha a ser concretizada”.

Ainda no ano passado, especulações de mercado apontavam para possíveis negociações entre a PRIO (PRIO3) e a Enauta (ENAT3), mas à época a antiga PetroRio negou discussões sobre uma eventual fusão de ativos.

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Para Loureiro, essas empresas enfrentam diversos desafios como a obtenção de licenças ambientais para exploração. “Regiões do shale gas em Minas Gerais, por exemplo, têm enfrentado resistência ambiental para avançarem.”

Por outro lado, ele lembrou que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) já tem uma regulação que reduz a incidência de royalties para a extensão da produção em campos onshore, o que cria uma oportunidade de viabilidade estendida.

O mercado de operadoras independentes conta com cerca de 90 empresas, com as principais listadas em bolsa. Essas companhias compraram campos maduros do programa de desinvestimentos da Petrobras iniciado no governo passado.

Embora a estatal esteja reforçando seu foco no pré-sal, no plano estratégico de 2024 a 2028 afirmou que “a companhia mantém grandes projetos de revitalização em águas profundas, além de projetos complementares, a fim de aumentar os fatores de recuperação em campos maduros.”

“A atenção da Petrobras está se dividindo entre o pré-sal e os campos maduros, incluindo onshore. Não existe um posicionamento da estatal sobre novas vendas de ativos. Essa fonte secou para as junior oils”, afirmou o diretor de pesquisa na área de upstream para América Latina da consultoria Wood Mackenzie, Marcelo de Assis.

Para Vinicius Diniz Moraes, analista da Wood Mackenzie, as recentes aquisições de ativos da Petrobras pelas operadoras independentes vão demandar muito trabalho. “Ainda é cedo para falar de consolidação desse mercado. Essas empresas precisam primeiro gerar caixa para, depois, em um segundo momento, iniciar um movimento mais forte de fusões e aquisições”, avaliou.

Em sua visão, empresas como a PRIO terão grandes desafios por ora. A junior oil rompeu recentemente a barreira de produção de 100 mil barris por dia e agora aposta em seus novos ativos para manter o ritmo de crescimento.

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A PRIO aguarda licença do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para desenvolver o projeto de interligação entre os campos de Wahoo e Frade, que vão compartilhar a mesma plataforma de produção.

Já a Enauta está prestes a trazer uma nova plataforma (FPSO) de produção para sua operação. “Este deve ser um grande ano para a Enauta, que vai trocar sua FPSO, que era bastante limitada”, disse Moraes.

Amanda Bandeira, também analista da Wood Mackenzie, apontou que, no curto prazo, as junior oils terão que investir para desenvolver os ativos já adquiridos. “Essas empresas vão procurar atividades com geração de caixa mais imediata.”

Moraes disse ver no médio e longo prazo uma chance maior de consolidação do mercado. “Dependendo do perfil da empresa, as independentes podem buscar M&A ou a internacionalização”, disse o especialista.

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Ele afirmou que, no caso da PRIO, o seu tamanho já limita os tipos de ativos que podem ser encontrados no país para aquisição. “A empresa deve procurar principalmente campos offshore [em alto-mar], o que já limita o leque de opções. Fica a dúvida sobre se a PRIO realmente vai buscar ativos por aqui ou partirá para a internacionalização”, afirmou.

Marcelo Assis disse acreditar que as operadoras independentes podem buscar a aquisição de participação em projetos no Golfo do México, por exemplo. “Lá as regras são claras, o que favorece as empresas”, ponderou.

Em evento no mês passado, o CEO da PRIO, Roberto Monteiro, afirmou que o Golfo do México é interessante, sem mencionar, entretanto, se há estudos por parte da empresa para desembarcar na região.

Na avaliação do diretor da EY, mesmo que a Petrobras tenha adotado uma política menos liberal, o foco da empresa ainda se mantém no pré-sal. “Essa divisão de foco foi muito benéfica ao setor, pois trouxe o interesse de investimento em ativos como a camada onshore, que tem um potencial de crescimento, mas acabam não sendo interessantes para petroleiras de grande porte”, disse Loureiro.

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Ele acrescentou que o segmento onshore no Brasil é muito vasto e pode passar por um processo de aumento da produtividade. “Fala-se que o Brasil ainda não passou pela fase de revitalização desses campos e que essa pode ser uma oportunidade para muitas empresas de médio porte que não têm foco nos grandes volumes do pré-sal.”

Perspectivas de exploração e produção

Marcelo Assis afirmou que, para 2024, a atividade de exploração de novos campos segue em alta no Brasil, tanto por parte da Petrobras quanto de outras majors como BP e Petronas. Ele acrescentou que os volumes de produção devem aumentar neste ano.

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Do lado dos preços, a Wood Mackenzie projeta um cenário de estabilidade, apesar da tensão geopolítica e da desaceleração da demanda chinesa.

“Os juros não devem cair tão rapidamente quanto o esperado e não devemos ter repique de atividade econômica, empurrando os preços”, afirmou Assis.

No ambiente de oferta, os principais gargalos já foram precificados pelo mercado, avaliou. “Os preços devem se manter na faixa dos US$ 80.”

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Em sua visão, as cotações só teriam um salto se tivesse um envolvimento direto dos Estados Unidos e do Irã nos conflitos no Oriente Médio, com um consequente impacto no Golfo Pérsico. “Se a situação continuar do jeito que está, acho difícil uma grande mudança no patamar de preços do barril.”

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Juliana Estigarríbia

Jornalista brasileira, cobre negócios há mais de 12 anos, com experiência em tempo real, site, revista e jornal impresso. Tem passagens pelo Broadcast, da Agência Estado/Estadão, revista Exame e jornal DCI. Anteriormente, atuou em produção e reportagem de política por 7 anos para veículos de rádio e TV.