Carrefour já foi mais valioso que a LVMH. Agora luta para manter sua força global

Grupo supermercadista francês enfrenta o desafio de recuperar sua lucratividade, enquanto se desfaz de negócios fora da França; empresa é controlada pela família Moulin e pelos herdeiros de Abílio Diniz

Carrefour
Por Katie Linsell - Julien Ponthus
03 de Agosto, 2025 | 06:00 AM

Bloomberg — O grupo Carrefour foi um pioneiro dos hipermercados na França e levou sua a marca a diversos países em uma expansão ambiciosa que começou há mais de cinco décadas, atingindo um valor de mercado que já foi maior do que o do império de artigos de luxo LVMH.

Desde então, a sorte do Carrefour diminuiu à medida que a rede supermercadista luta para competir em seu mercado doméstico acirrado e reduz a presença no exterior.

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Seus negócios valem uma fração do valor da LVMH, a atual porta-bandeira global dos negócios franceses, e o chairman e CEO, Alexandre Bompard, luta para convencer os investidores de que pode liderar uma transformação.

As ações do Carrefour atingiram o nível mais baixo em 32 anos em junho, depois que o JPMorgan Chase colocou a ação em perspectiva negativa e rebaixou suas estimativas. Bompard reagiu ao se desfazer das operações na Itália, que enfrentavam dificuldades, e o grupo registrou vendas melhores do que o esperado, contribuindo para uma recuperação das ações.

Mas o fôlego passageiro foi rapidamente substituído por preocupações sobre o futuro da empresa após anos de lucros estagnados. Os investidores ainda fazem a mesma pergunta a Bompard desde que ele assumiu o comando há oito anos - ele será capaz de estimular o crescimento do Carrefour, quando muitos CEOs anteriores não conseguiram?

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Muitos observadores apostam que não. O Carrefour está entre as redes de supermercados com mais posições vendidas da Europa, com ações emprestadas equivalentes a 6% do free float em 24 de julho, de acordo com dados da S&P Global Market Intelligence.

As ações ainda estão em queda de cerca de 10% este ano e, nas últimas duas décadas, o Carrefour é o único grande supermercadista europeu a proporcionar um retorno negativo.

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“Estamos longe de ver uma reviravolta com as tendências que vemos e no contexto do histórico misto da empresa”, disse o analista do JPMorgan Borja Olcese em uma nota após a divulgação dos lucros trimestrais da empresa na semana passada.

Apesar do fraco desempenho das ações, Bompard, que responde aos acionistas, incluindo os herdeiros bilionários da família Moulin e os descendentes do falecido empresário brasileiro Abílio Diniz, permanece no conselho com a intenção de renovar seu mandato no próximo ano.

Pegada global

O diretor financeiro do Carrefour, Matthieu Malige, disse que uma revisão estratégica ainda tem muito espaço e que a empresa não descarta a venda de seu negócio na Polônia, que alguns analistas dizem ser deficitário.

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“Há muitas situações, incluindo a da Polônia, que estão sendo analisadas”, disse ele em uma entrevista à Bloomberg News esta semana.

A venda da operação na Itália confirmou o pouco valor que restou no quinto maior mercado do Carrefour. A rede pagou ao novo proprietário, a empresa italiana de alimentos NewPrinces, € 240 milhões (US$ 277 milhões) para tirá-la de suas mãos.

A expansão do Carrefour desde a década de 1970 deixou-o com uma presença em mais de 40 países, muitos deles com baixo desempenho.

Parte dos desafios da empresa reside em sua dependência dos hipermercados, que vendem de tudo, desde frutas frescas até roupas e máquinas de lavar, em um momento em que os compradores preferem fazer compras on-line, especialmente de itens não alimentícios.

Os produtos domésticos e elétricos respondem por cerca de 10% das vendas, enquanto que para o rival francês Leclerc a categoria é de 5% e para o supermercado britânico J Sainsbury Plc é de 3%, de acordo com um relatório da Bernstein.

No ano passado, o Carrefour adquiriu mais 55 hipermercados, o que levantou preocupações para alguns analistas sobre a estratégia da Bompard.

“Eles ainda precisam corrigir os fundamentos básicos de ser um varejista de alimentos em relação a preço, formato e produto”, disse William Woods, analista da Bernstein.

Desafios na França

É particularmente difícil operar na França, pois a maioria dos varejistas de alimentos têm capital fechado ou são cooperativas, que não estão vinculados às mesmas expectativas dos acionistas.

“O grupo concorre contra empresas independentes que jogam um jogo totalmente diferente, que conseguem sobreviver com margens menores e têm maneiras diferentes de ganhar a vida, como alugar parte de seus imóveis em shopping centers”, disse Gilles Guibout, diretor de ações europeias da AXA IM.

Diferentemente de outros países, o governo francês controla as relações com os fornecedores para garantir que os preços sejam mantidos baixos para os consumidores e, ao mesmo tempo, pressiona os varejistas a pagarem mais aos agricultores.

Outras grandes redes impulsionaram seus negócios por meio da entrega on-line, mas o Carrefour foi mais lento em relação a essa tendência.

O Carrefour também não possui um modelo operacional rígido que lhe permita competir agressivamente em preço com empresas como o líder de mercado Leclerc, de acordo com analistas.

Ainda assim, o cenário teve uma melhora à medida que os consumidores se recuperam de um período de hiperinflação e restauram seu poder de compra, disse Malige, do Carrefour.

A lucratividade aumentou, a entrega on-line cresceu rapidamente e uma estratégia para transformar os hipermercados em um modelo de franquia tem dado frutos, acrescentou.

Acordos regionais

Recentemente, o Carrefour firmou uma aliança com a quarta maior rede de supermercados da França, a Cooperative U, para cortar custos na Europa, mas não se sabe ao certo o quanto isso será eficaz depois que acordos semelhantes, inclusive com a Tesco, do Reino Unido, tiveram vida curta.

Enquanto isso, as fusões fracassadas têm sido uma dor de cabeça para a Bompard. O governo francês bloqueou uma proposta de aquisição de US$ 20 bilhões pela varejista canadense Alimentation Couche-Tard em 2021. A rede francesa rival Auchan considerou uma oferta potencial várias vezes, embora um acordo nunca tenha se concretizado.

Bernard Arnault, o bilionário CEO da LVMH Moët Hennessy Louis Vuitton, vendeu sua participação remanescente de 5,7% no Carrefour depois que as negociações com a Couche-Tard fracassaram.

Foi um constrangimento para Arnault, que vendeu a posição a € 16 por ação depois de ter adquirido uma participação em 2007, quando os preços estavam em torno de € 47 por ação.

Valor em queda

O valor de mercado do Carrefour encolheu para cerca de € 9 bilhões, o que é menos do que o acordo que ele fechou para adquirir a rival Promodes em 1999, quando estava no auge do modo de expansão entre os maiores varejistas do mundo.

Recentemente, em 2009, o Carrefour era tão valioso quanto a LVMH, mas a gigante do luxo agora vale € 231 bilhões.

Apesar do apoio do conselho à Bompard, alguns investidores expressam seu descontentamento. A gestora ativista Whitelight manteve uma posição vendida na rede no ano passado, mas agora está comprada, apostando em uma nova aquisição.

“O que precisamos é de um CEO que possa realmente se concentrar em aumentar a lucratividade dos supermercados” e “dar uma olhada, ativo por ativo, nos hipermercados”, disse Kevin Romanteau, fundador da Whitelight Capital.

-- Com a colaboração de Lisa Pham, James Cone e Tara Patel.

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