Bilionários gastam US$ 750 mil para preparar filhos para faculdades de elite

‘McKinsey para adolescentes’: consultorias que preparam jovens para aprovação nas universidades da Ivy League ganham sofisticação - e ficam cada vez mais caras nos EUA

Ingressar em uma universidade como a de Harvard, perto de Boston, é o sonho de muitos pais (Foto: Michael Fein/Bloomberg via Getty Images)
Por Francesca Maglione - Paulina Cachero
17 de Setembro, 2023 | 08:53 AM

Bloomberg News — Todos os pais que consultam Christopher Rim fazem a mesma pergunta: o que é necessário para meu filho entrar em Harvard ou Yale?

Sua resposta é US$ 750 mil.

Esse é o preço pelo aconselhamento de como conseguir uma vaga na cobiçada Ivy League, que reúne oito universidades de elite dos Estados Unidos. A preparação para a faculdade começa na 7ª série e o valor cobrado pelo serviço é mais do que o dobro do que pode custar de fato frequentar uma delas.

Mas, para aqueles que podem pagar, Rim e sua equipe na Command Education, com sede em Nova York, servirão como uma espécie de serviço de concierge: “mentores” que vão preparar um superdotado, estimularão um preguiçoso, ajustarão um B+ aqui ou um A- ali, além de prover curadores de atividades extracurriculares, aprimorando o currículo do ensino médio para que se torne brilhante.

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As universidades de elite há muito tempo estão repletas de filhos de abastados. Mas atualmente apenas cerca de 3% dos estudantes que se candidatam à Harvard conseguem de fato entrar. Com isso, ultrarricos estão dobrando a aposta - e os gastos - na estratégia.

Uma nova onda de serviços de consultoria universitária de luxo praticamente garante que seus clientes ingressarão em uma das escolas de seus sonhos. Pacotes com tudo incluído – às vezes com preços na casa dos seis dígitos – podem começar a preparar estudantes antes mesmo de eles entrarem no ensino médio, o High School.

“São empresários e famílias muito experientes, dinheiro não é problema para nossos clientes”, disse Rim, de 28 anos. “Se eles nunca conseguirem um emprego ou frequentarem a faculdade, viverão melhor do que a maioria das pessoas. O que estamos fazendo é motivar os alunos que possuem todos os recursos.”

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Não é novidade que pais ricos tentam pagar por todo tipo de vantagem para seus filhos. Mas a nova classe de consultores de alto nível – pensemos na McKinsey para clientes de 17 anos – é mais uma prova de até onde as pessoas vão para obter acesso a instituições de elite.

Pais que pagam o que for preciso

O pano de fundo de tudo isso é a antiga ansiedade de ingressar em uma escola de elite. O processo de inscrição para a faculdade ficou ainda mais confuso nos últimos anos, à medida que as taxas de aceitação despencam e os pais procuram qualquer artifício que possa dar uma vantagem aos seus filhos.

E mesmo enquanto milhões de pessoas lutam com dívidas estudantis e cresce o debate sobre o custo de ir para a faculdade, ser aceito em uma legítima Ivy -- ou em outras universidades de primeira linha -- continua sendo um importante símbolo de status para estudantes ricos e suas famílias.

Rim afirmou que um pai da Trinity School de Nova York – que custa US$ 64 mil por ano e cujos muitos alunos acabam na Ivy League – certa vez lhe ofereceu US$ 1,5 milhão se ele concordasse em não trabalhar com nenhum dos colegas de classe de seu filho. Rim recusou.

Consultoria de luxo para universidades. Leelila Strogov Photographer: Lila Barth/Bloombergdfd

A AcceptU, outra empresa de consultoria universitária, certa vez recebeu uma ligação de um pai ansioso – ou melhor, de um futuro pai. O homem tinha acabado de saber que sua esposa estava grávida e queria perguntar sobre a contratação de um consultor, segundo o co-fundador e diretor de operações Stephen Friedfeld.

Um estudo divulgado em julho por um grupo de economistas de Harvard descobriu que as crianças de famílias dos 1% mais ricos tinham 43% mais probabilidade de serem admitidas do que os estudantes da classe média. Os 0,1% mais ricos tinham duas vezes mais chances de entrar.

Alguns consultores ouviram preocupações de pais que são ex-alunos sobre os ataques às admissões de filhos de doadores de Harvard, que aumentaram recentemente. Os críticos chamam de “ação afirmativa para os ricos”, uma repreensão contundente agora que a Suprema Corte dos Estados Unidos acabou com programas de admissão com foco racial em universidades de todo o país.

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Assim, à medida que o verão no hemisfério norte acaba e a temporada anual de inscrições começa, o complexo sistema de admissões está começando mais uma vez.

Antes da pandemia, Rim trabalhava nos escritórios do Beaux-Arts Bergdorf Goodman Building, em Midtown Manhattan, não muito longe do Plaza Hotel. Hoje, ele gosta de cortejar pais-clientes no suntuoso Aman Club, um clube exclusivo para membros, em que a taxa de entrada chega a US$ 200 mil. Se isso não funcionar, Rim irá discretamente passar pela casa de um cliente – seja um condomínio no Central Park West ou na Fisher Island, em Miami – por um modesto depósito de US$ 10 mil.

US$ 3.000 por hora/aula

Hoje, pessoas ricas podem terceirizar anos de preparação para a faculdade para consultores e seus programas de construção de um “Ivy-Leaguer”. Mas como se destacar no atual rol de candidatos altamente credenciados e bem treinados?

Rim disse que a Command Education ajudou um estudante do ensino médio a patentear tecnologia para tênis que carregam baterias. Ajudou outro a entrar em contato com uma grande empresa de artigos esportivos para fornecer equipamentos de tênis e reformar quadras em comunidades carentes.

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Leelila Strogov, formada pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e CEO da AtomicMind, uma empresa de consultoria universitária em Manhattan, caracteriza seu mercado como “o conjunto de bilionários” cujos filhos às vezes exigem amor duro para trabalhar para entrar em uma escola da Ivy League.

Embora as famílias ultrarricas que podem fazer uma doação considerável ainda tenham uma vantagem no jogo de admissões, Strogov disse que as probabilidades estão contra os candidatos “ricos regulares” que devem distinguir-se dos seus pares de alto desempenho.

“Nosso sistema de admissão em faculdades está falido – é gamificado”, disse Strogov. “Usarei qualquer recurso ou ângulo que puder para ajudar nossos clientes. Estou nisso para vencer.”

A AtomicMind atribui a cada aluno-cliente um consultor principal para “coaching de funções executivas”. Juntos, eles acompanham as inscrições, enquanto cerca de 150 tutores – desde treinadores de debate até especialistas em pesquisa – ajudam a melhorar os registros acadêmicos e extracurriculares.

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O preço atual é de US$ 500 por hora, mas salta para US$ 3.000 se você quiser trabalhar diretamente com Strogov. Clientes exigentes podem gastar até US$ 85.000 por mês.

A empresa também é especializada em “posicionar” estudantes de ascendência asiática. Isso inclui orientar um estudante do Leste Asiático, que agora frequenta Columbia, em direção a uma especialização em humanidades para aumentar as chances de admissão do aluno.

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Esse grupo esteve no centro dos recentes casos da Suprema Corte, já que críticos argumentaram que os candidatos asiáticos com elevado desempenho perdiam para estudantes menos qualificados.

‘Somos uma extensão dos pais’

Na empresa IvyWise, com sede em Nova York, fundada em 1998 por Kat Cohen, programas personalizados para orientar alunos e pais ansiosos durante o processo de inscrição custam a partir de US$ 28 mil.

A empresa normalmente começa a trabalhar com alunos do 9º ano, juntando-os a conselheiros que anteriormente trabalharam em admissões em faculdades, muitos deles em instituições de prestígio como Stanford, MIT, Princeton e Yale.

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Eles também oferecem serviços para alunos desde o jardim de infância. Cohen quase dobrou sua equipe desde 2020 para atender à demanda.

O que tudo isso compra?

Muita ajuda e acesso praticamente 24 horas por dia, 7 dias por semana.

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Na AtomicMind, alguns alunos fazem até sete horas de aulas particulares por dia para fortalecer seu perfil acadêmico. Os conselheiros ajudam os alunos a escrever discursos para disputas do governo estudantil e a elaborar propostas para criar novos clubes. Uma vez, Strogov disse que até comprou um terno para um estudante quando ele apareceu de moletom para uma entrevista na faculdade.

“Somos contratados pelos pais porque eles não podem dedicar esse tempo às crianças”, disse Strogov. “Somos uma extensão deles.”

Além de vender um serviço exclusivo, essas empresas anunciam taxas de aceitação acima da média para seus clientes. A Command Education afirma que todos os seus alunos que se inscreveram antecipadamente em Harvard no ciclo de admissão de 2021-2022 foram aceitos.

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A IvyWise anuncia uma taxa de admissão de 48% para clientes da Duke University, em comparação com 6,6% para todos os candidatos. A AtomicMind possui taxas de aceitação de 100% para seus clientes em escolas competitivas de Harvard a Northwestern.

Vale o custo?

Nem todo mundo, no entanto, está convencido de que os concierges universitários valem seu preço. De acordo com a Associação de Consultores Educacionais Independentes, o pacote médio para conseguir consultoria para uma vaga custa cerca de US$ 6.700.

O presidente do grupo, Mark Sklarow, compara o negócio ao botox. “Se você quiser comprar elitismo ou serviço de concierge, é uma escolha”, disse Sklarow. “Não há muita diferença entre gastar meio milhão de dólares e US$ 8 mil em um consultor universitário.”

Matt Suescun, um calouro universitário de 18 anos de Nova Jersey, não poderia estar mais de acordo. Ele se inscreveu em 21 escolas usando recursos online gratuitos e um livro preparatório de US$ 25. Ele entrou em dez escolas.

Ele não é um “legado” de ex-alunos de sua família. Nenhum de seus pais frequentou a faculdade. E ele certamente não usou um consultor caro. De qualquer forma, ele está indo para Cambridge, Massachusetts. “No final das contas, ainda é sorte eu ter entrado em Harvard”, disse ele.

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