Azzas 2154 perde nova liderança sênior com saída inesperada de Thiago Hering

Executivo era o CEO da unidade Basic e sua saída encerra 145 anos de gestão familiar na marca que leva seu sobrenome. Grupo de moda liderado por Alexandre Birman cria um comitê de transição liderado por Gustavo Fonseca para a unidade

Nova loja remodelada da Hering no Shopping Bourbon, em São Paulo: vendas da marca chegaram a R$ 1,25 bilhão no primeiro semestre de 2025 (Foto: Bloomberg Línea)
04 de Setembro, 2025 | 03:59 PM

Bloomberg Línea — O Azzas 2154 (AZZA3) anunciou na noite de quarta-feira (3) a saída de Thiago Hering dos cargos de diretor estatutário e CEO da unidade Basic a partir de outubro. A decisão marca mais um capítulo na reestruturação executiva que atinge a companhia desde a fusão entre Arezzo e Grupo Soma, efetivada em agosto de 2024.

A empresa formou um comitê de transição liderado por Gustavo Fonseca, executivo com 11 anos no grupo, segundo fato relevante divulgado.

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O CEO Alexandre Birman e o sócio Roberto Jatahy também integram o comitê. A consultoria Heartman House foi contratada para acelerar iniciativas de crescimento da marca Hering, que consiste na unidade Basic.

No primeiro semestre, essa unidade de negócios apresentou receita bruta de R$ 1,25 bilhão, com crescimento de 13% na base anual - e equivalente a 18% do total do grupo.

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As ações do Azzas 2154 recuavam cerca de 1,80% perto das 16h desta quinta-feira (4), em sessão em que o Ibovespa subia quase 1% (veja mais abaixo).

Thiago Hering esteve à frente da tradicional marca têxtil desde 2021, quando sucedeu o pai, Fabio Hering. Sua saída representa o fim da gestão familiar direta na empresa fundada em 1880 em Blumenau. A família Hering mantém participação acionária na Azzas.

A decisão foi formalizada em ata do conselho de administração realizada por videoconferência.

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Os conselheiros aprovaram os termos da saída por unanimidade e concederam quitação ampla ao executivo, ou seja, a empresa pagou todos os valores devidos: salários, bônus, benefícios, verbas rescisórias e eventuais participações nos lucros pendentes.

A quitação protege Hering de futuras cobranças relacionadas a decisões tomadas durante sua gestão, desde que tenham sido dentro da legalidade e do estatuto da empresa. Ambas as partes renunciaram ao direito de processar uma à outra por questões relacionadas ao período em que Hering atuou como diretor.

Esse tipo de acordo é comum em saídas de executivos de alto escalão, pois evita disputas judiciais futuras e permite uma transição mais limpa.

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Rotatividade intensificada

A saída de Thiago Hering se soma a uma série de mudanças no comando da Azzas 2154.

Em agosto passado, Rafael Sachete anunciou a saída do cargo de CFO para assumir a liderança da divisão de calçados e bolsas. Eric Alencar, ex-CFO do Carrefour Brasil, assume a diretoria financeira neste mês de setembro, no próximo dia 10.

Rony Meisler, fundador da Reserva, deixou a companhia em dezembro passado após tensões com Birman.

As divergências entre os executivos se intensificaram após a fusão, com diferenças sobre autonomia e estilo de gestão. Ruy Kameyama, ex-CEO da brMalls, assumiu o comando da unidade de vestuário masculino.

Luciana Wodzik, executiva de longa trajetória na Arezzo, também deixou a liderança da divisão de calçados. A executiva havia construído toda a carreira dentro do grupo e foi promovida na reorganização pós-fusão. Sua saída surpreendeu o mercado pela proximidade com Birman.

Em abril, a empresa anunciou a saída de Cassiano Lemos (COO) e Marco Vidal (CHRO) em uma reestruturação que atingiu dezenas de funcionários. A medida fez parte da otimização da estrutura organizacional após a integração das operações. Gisela Dantas também deixou o cargo de CMO após um ano no grupo.

Conflitos entre controladores

As mudanças executivas ocorrem em meio a relatos de desentendimentos entre Birman e Jatahy. Os controladores do Azzas enfrentaram divergências sobre modelo de gestão e autonomia das unidades de negócio. As tensões chegaram ao ponto de as conversas necessitarem da mediação por advogados no passado recente.

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Segundo relatos de fontes à Bloomberg Línea, Birman tem estilo mais centralizador, o que conflita com executivos acostumados a maior autonomia.

Jatahy, fundador do Soma, mantinha perfil mais agregador e concedia liberdade aos gestores das marcas. As diferenças de personalidade impactaram a integração das culturas empresariais.

Em junho, os controladores anunciaram uma trégua e redesenharam a governança.

Pedro Parente deixou a presidência do conselho, substituído por Nicola Calicchio, ex-presidente da McKinsey na América Latina.

O número de cadeiras do conselho foi reduzido de nove para sete membros. Um comitê de estratégia foi criado para operacionalizar sinergias.

Impacto nas operações

O turnover de executivos de alto escalão gerou preocupações sobre a capacidade do grupo de retenção de talentos e a continuidade operacional.

Analistas questionaram a capacidade de formar sucessores internamente. A perda de executivos com profundo conhecimento das marcas pode levar a desafios para manutenção da identidade dos negócios.

A transição na liderança da Hering representa um teste para a nova governança da Azzas.

Gustavo Fonseca assume interinamente a operação enquanto a empresa busca um sucessor definitivo. O executivo possui experiência na unidade Fashion & Lifestyle.

A contratação da consultoria Heartman House, por outro lado, sinaliza um foco na aceleração do crescimento da Hering. A profissionalização da gestão poderia em tese impulsionar a performance da unidade Basic.

“O Azzas 2154 enfrenta pressão na geração de caixa, com queima de R$ 130 milhões no segundo trimestre devido a menores prazos com fornecedores”, escreveu o analista Rodrigo Gastim, do Itaú BBA, em relatório divulgado em agosto.

Ele escreveu que o mercado deverá monitorar duas questões no segundo semestre: aumento nas devoluções de produtos e potenciais impactos das tarifas americanas sobre exportações.

“O sentimento predominante é de esperar para ver, com o mercado buscando evidências mais claras de que a alavancagem operacional através da diluição de despesas administrativas se materializará nos próximos trimestres”, escreveram os analistas Luiz Guanais, Yan Cesquim e Pedro Lima, do BTG Pactual, em relatório divulgado nesta quinta sobre a saída de Hering.

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Os analistas do BTG citaram ainda que investidores permanecem cautelosos sobre o momentum de crescimento de vendas no segundo semestre, particularmente nos segmentos Basic e Calçados.

Diante dos desafios, as ações negociam com desconto considerado atrativo, com múltiplo de 7,4x o lucro estimado para 2026. O papel acumula alta de cerca de 15% em 2025, mas tem queda de 30% em 12 meses.

O Itaú BBA tem recomendação outperform - equivalente a compra - para o papel, com o preço-alvo de R$ 53. O BTG tem recomendação de compra também com R$ 53 como preço-alvo. A ação fechou a quarta-feira a R$ 33,60.

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