Bloomberg Línea — Ativos da América Latina têm um ano de recuperação em 2025, apesar da incerteza gerada pela política comercial de Donald Trump.
Uma rotação para mercados emergentes e fatores locais permitiram que os mercados de ações da região se descolassem de certa forma de perdas passadas em Wall Street - ou que superassem nessa comparação.
Com exceção dos mercados peruano e argentino, os principais índices de ações latino-americanos estão registrando ganhos, medidos em dólares, 20 vezes superiores ao desempenho do S&P 500.
Até algumas semanas atrás, o Msci Colcap (COLCAP) da Colômbia era o de melhor desempenho, mas agora o índice chileno IPSA (IPSA) leva a coroa.
“Durante 2025, o desempenho do IPSA foi favorecido pelo aumento dos preços do cobre e pelos resultados corporativos acima das expectativas do mercado”, disse Javier Pizarro, gerente de pesquisa do Banchile Corredores de Bolsa, à Bloomberg Línea.
O Chile é o maior produtor mundial do metal, que representa cerca de 11% de seu PIB e 90% das exportações de mineração. Durante o ano, o cobre subiu quase 7% na Bolsa de Metais de Londres, com máximas acima de US$ 10.000 por tonelada.
Além disso, o mercado de ações foi impulsionado por empresas voltadas para o consumo doméstico, o que foi apoiado por indicadores macroeconômicos positivos, como a recuperação das vendas no varejo e da produção industrial. Isso permitiu que o PIB do primeiro trimestre superasse as projeções iniciais.
Tudo isso ocorre em um contexto marcado por um calendário eleitoral que culminará com a eleição de um novo governo no Chile em novembro.
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Ações mais rentáveis
Emanoelle Santos, analista de mercado da XTB Latam, disse à Bloomberg Línea que houve uma combinação de fatores estruturais e cíclicos que impulsionaram a alta do principal índice do mercado acionário do Chile.
“Os resultados financeiros das empresas que compõem o índice têm sido robustos, com mais de dois terços mostrando aumentos em seus lucros durante o ano fiscal de 2024, refletindo uma reativação da atividade econômica doméstica e uma gestão de custos mais eficiente”, explicou.
Entre as ações com os maiores aumentos no preço no acumulado do ano estão Ripley (RIPLEY), Inversiones La Construcción (ILC) e Cencosud (CENCOSUD), todas com valorização de mais de 45%.
“O setor de varejo começou a mostrar sinais de recuperação, com destaque para empresas como a Ripley, que reverteu perdas significativas com lucros sólidos no final de 2024″, acrescentou Santos.
Alex Fleiderman, trader do BTG Pactual Chile, disse que a Cencosud faz parte da carteira recomendada da corretora para maio.
“A empresa reportou outro bom trimestre em seu principal mercado chileno, além de melhorar a dinâmica da receita no Peru, na Colômbia e nos EUA, mas com um ajuste contínuo na Argentina”, disse ele.
As ações da ILC subiram em razão da dissipação dos riscos regulatórios, de seu reingresso no IPSA e de uma recuperação sustentada em seus resultados financeiros.
A empresa, com operações nos setores de pensões, seguros, saúde e bancário, enfrentou um período de alta incerteza regulatória que afetou sua avaliação.
No entanto conseguiu reverter esse cenário após a rejeição pública da nova constituição proposta, a aprovação da reforma previdenciária e as mudanças no setor de saúde.
Freiderman observou que, em geral, o desempenho do IPSA no mês passado “deveu-se em grande parte à estabilidade de setores tradicionalmente de baixo beta, como shopping centers, serviços públicos e bancos”.
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Ele também lembrou que o avanço foi consolidado após a reafirmação do escopo limitado das tarifas recíprocas de Trump, que deixaram de fora as exportações de cobre, “e o início de negociações diretas para mitigar seu impacto, aproveitando o status do Chile como signatário de um Acordo de Livre Comércio”.
Pizarro, do Banchile Corredores de Bolsa, apontou que a maioria dos setores tem um desconto em sua avaliação, destacando entre eles o de consumo básico, o setor financeiro e o de shoppin center.
“Nossas projeções para uma recuperação do investimento e seu impacto positivo sobre o mercado de trabalho e o consumo sustentariam a perspectiva positiva para seus resultados operacionais”, disse.

Reformas e eleições
As eleições presidenciais programadas para novembro de 2025 também estão no radar dos analistas.
De acordo com Santos, o chamado “trade eleitoral” parece ter sido ativado mais cedo do que o normal, impulsionado pelo posicionamento favorável nas pesquisas de figuras políticas consideradas pró-mercado, como a candidata Evelyn Matthei.
Essa expectativa de continuidade de políticas econômicas favoráveis ao investimento foi interpretada pelos investidores como um sinal positivo, que melhorou a percepção de risco e reativou o apetite por ativos locais.
Santos advertiu, entretanto, que “à medida que a data da eleição se aproxima, o IPSA pode mostrar maior sensibilidade às mudanças nas pesquisas e ao tom do debate político, especialmente se surgirem propostas que possam afetar as estruturas fiscais ou regulatórias”.
Por outro lado, a aprovação da reforma previdenciária, que aumenta gradualmente a taxa de contribuição de 10% para 17%, representa uma mudança com efeitos de longo alcance no mercado de capitais chileno.
Nas palavras de Santos, essa mudança “não apenas aumentará a base de poupança forçada e aprofundará o sistema financeiro local mas também abrirá espaço para um maior investimento institucional em instrumentos de ações, como o IPSA”.
Na opinião do analista, esse fluxo sustentado de capital de pensão pode atuar como um estabilizador do mercado, reduzindo a volatilidade e aumentando a liquidez, ao mesmo tempo em que fortalece as condições para o financiamento de projetos produtivos por meio do mercado de ações.
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O rali continua?
Olhando para o futuro, Pizarro disse que o desempenho do indicador dependerá “em grande parte das expectativas de crescimento e risco. Fatores que poderiam afetar essas expectativas, como o preço do cobre ou uma deterioração maior do que a esperada na atividade global, teriam impacto sobre o índice”.
Para o especialista da XTB Latam, “a alta correlação entre o ciclo econômico chileno e os preços do cobre mantém o mercado exposto à volatilidade das commodities”.
Variações abruptas nos preços dos metais, ligadas a tensões geopolíticas ou interrupções na demanda global, podem afetar diretamente a confiança dos investidores e os fluxos para os ativos locais.
Outro elemento de atenção são as decisões de política monetária dos principais bancos centrais.
“Um atraso no ciclo de corte de taxas pelo Fed ou pelo BCE [Banco Central Europeu] poderia manter as condições financeiras mais apertadas por mais tempo, tornando os ativos dos mercados emergentes menos atraentes”, diz Santos.
Além disso, existe a possibilidade de uma desaceleração mais acentuada na China, o que representa um risco adicional para as exportações chilenas e, portanto, para a dinâmica do IPSA.
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