Queda do dólar deve enfrentar teste com corte de juros no Brasil e na América Latina

Início do ciclo de flexibilização monetário pode fazer as moedas latino-americanas perderem parte da força que ganharam nos últimos meses

Notas de dólar
Por Davison Santana - Maria Elena Vizcaino
02 de Julho, 2023 | 10:21 AM

Bloomberg — A valorização sem precedentes das moedas latino-americanas frente ao dólar este ano está prestes a enfrentar um teste com o início de um ciclo de cortes de juros, enquanto outras grandes economias mundiais ainda continuam a aumentar as suas taxas.

As moedas latino-americanas representam quatro das cinco moedas com melhor desempenho no segundo trimestre, beneficiando-se da baixa volatilidade e das taxas extremamente altas.

No entanto, com os custos de empréstimos agora prestes a cair, provavelmente a partir de julho no Chile e depois seguido pelo Brasil, em agosto, isso pode marcar o fim da valorização generalizada.

O peso mexicano e o real brasileiro “já atingiram nossa meta e estou um pouco cético em relação a ganhos adicionais, pois ambos os bancos centrais provavelmente começarão a cortar as taxas no segundo semestre e também existem riscos de baixa de médio prazo”, disse Esther Reichelt, estrategista do Commerzbank em Frankfurt. “Para mim, eles são mais uma posição de espera por enquanto.”

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Os mercados já estão de olho no peso chileno, apostando que os formuladores de políticas começarão o ciclo de flexibilização já no próximo mês, com mais de 3 pontos percentuais de cortes ao longo do ano.

Dados econômicos mais fracos do que o esperado e a desaceleração da inflação abriram caminho para a flexibilização monetária. Ao mesmo tempo, a queda dos preços do cobre está pressionando a moeda, à medida que a recuperação econômica da China decepciona.

A combinação de fatores negativos pode deixar o peso, que caiu cerca de 1% no segundo trimestre, sob pressão adicional.

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Caos político

No Peru, a valorização de 3,6% do sol no segundo trimestre foi estimulada por relatos de que a presidente Dina Boluarte permanecerá em seu cargo até 2026, acalmando anos de turbulência política. Mas isso pode se mostrar um impulso único, e com o presidente do banco central, Julio Velarde, dizendo que os cortes de juros podem começar nos próximos meses, a valorização do sol já está perdendo força.

Também é provável que o peso colombiano se estabilize em níveis atuais após uma valorização de 17% este ano, impulsionada em parte por fluxos corporativos sazonais relacionados a um prazo para pagamento de impostos.

“Há um ressurgimento do dólar em andamento, mas as moedas latino-americanas devem se manter muito bem se não houver muita correção de risco”, disse Alejandro Cuadrado, chefe de estratégia global de câmbio do BBVA em Nova York.

Embora o peso chileno e o sol peruano possam enfraquecer à medida que os cortes de juros se tornam iminentes, outras moedas “ainda podem atingir novas máximas antes do início da queda das taxas de juros”, acrescentou.

O índice de moedas de mercados emergentes MSCI caiu cerca de 1% no segundo trimestre, à medida que o dólar se fortalece, registrando a maior queda desde o terceiro trimestre do ano passado.

Rei do Carry

O peso mexicano oferece a melhor relação de “carry-to-volatility” da região, com sua volatilidade implícita de um mês até 300 pontos-base menor do que o real brasileiro.

Oscilações mais suaves, aliadas à alta liquidez, remessas fortes e ao chamado processo de nearshoring, devem manter o peso em alta. As exportações do México foram de US$ 52,9 bilhões em maio, a segunda maior já registrada, à medida que as empresas locais trabalham para abastecer o mercado consumidor dos EUA.

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Quanto à maior economia da região, o Brasil, os cortes de juros maiores do que o esperado são o maior risco para a continuidade da valorização do real. No entanto, ações locais baratas, que tendem a se beneficiar do ciclo de flexibilização, têm o potencial de sustentar os fluxos de dólares.

Somente em junho, o índice de ações Ibovespa registrou uma entrada líquida de US$ 1,6 bilhão de estrangeiros, segundo dados da bolsa local.

Além disso, a aprovação de um novo arcabouço fiscal e a perspectiva de gastos governamentais frugais tornam o real uma aposta atraente a médio prazo.

“Algumas avaliações de câmbio estão começando a parecer exageradas”, disse Bret Rosen, economista e estrategista da EMSO Asset Management. “Mas, no geral, o carry deve permanecer favorável para as moedas da América Latina.”

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-- Com a colaboração de Zijia Song.

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