Por que a perda de força do dólar não é tese estrutural entre muitas gestoras globais

Em entrevista à Bloomberg Línea, Rodrigo Aloi, chefe de pesquisa e estratégia da HMC Capital, que distribui fundos de casas como Oaktree e Bridgewater, aponta uma visão consensual de que o risco existe, mas em discussão de longo prazo

Donald Trump observado pelo secretário do Tesouro, Scott Bessent (à esq.), e pelo secretário de Comércio, Howard Lutnick, na Casa Branca (Foto: Jim Watson/AFP via Getty Images)
30 de Maio, 2025 | 05:52 AM

Bloomberg Línea — Sob efeitos de incertezas fiscais e protecionismo, o cenário econômico dos Estados Unidos tem reforçado dúvidas sobre a resiliência do dólar.

As pressões crescentes sobre a dívida pública e o vaivém de tarifas comerciais sob a gestão de Donald Trump são vistos por parte dos investidores como “rachaduras” na narrativa de excepcionalismo que, há anos, sustenta a posição dominante das ações americanas e do dólar nos mercados globais.

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Um sinal das mudanças vem da queda da moeda americana no ano. O DXY, índice que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de divisas fortes, acumula baixa perto de 8,50% em 2025. Contra o real, a moeda americana recua cerca de 8%.

O enfraquecimento do dólar, no entanto, não é uma tese estrutural para muitos gestores globais. A leitura do cenário é da HMC Capital, empresa global de investimentos que atua como third-party distributor para diversas gestoras internacionais e nacionais e que faz a distribuição de fundos das parceiras para o segmento institucional e qualificado.

Entre gestoras internacionais, a HMC representa nomes tradicionais como a Oaktree Capital Management, de Howard Marks, a Bridgewater Associates, de Ray Dalio, o Man Group e a Acadian, entre outros.

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A visão consolidada dos principais parceiros é que o risco existe, mas faz parte de uma discussão de longo prazo que pode levar anos para se consolidar.

“O dólar continua sendo, e provavelmente vai continuar sendo a principal forma de reserva global de valor. Assumir que o dólar vai perder esse status é uma visão radical de certa forma porque reflete um cenário improvável”, afirmou Rodrigo Aloi, chefe de pesquisa e estratégia da MHC, em entrevista à Bloomberg Línea.

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Aloi estima que o impacto do debate seja limitado para a grande maioria dos gestores parceiros da HMC. “Eles têm uma visão mais estrutural de construção de estratégias de investimento em vez de uma abordagem tática e oportunística – com exceção dos hedge funds, que têm essa atuação por natureza”, avaliou.

A tendência poderia se cristalizar no longo prazo se os Estados Unidos perdessem a credibilidade frente ao investidor global. Nesse sentido, um novo “sinal amarelo” foi o recente rebaixamento da nota de crédito dos EUA pela Moody’s, que reavivou o debate sobre a sustentabilidade da dívida americana no longo prazo.

“Caso o mercado entenda que a trajetória da dívida está se tornando insustentável, há o risco de que isso possa gerar um episódio de inflação. O risco de calote é muito baixo. Mas o dólar poderia sofrer com esse cenário, porque mais inflação significa que o próprio dólar está perdendo valor ao longo do tempo”, disse.

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Existe ainda a preocupação entre os investidores de que a política tarifária de Trump afete o crescimento econômico dos Estados Unidos e, consequentemente, a atratividade de suas ações e o desempenho do dólar.

“Ainda assim, vemos um discurso muito mais no sentido de achar oportunidades geradas em decorrência desse deslocamento de preços do que uma preocupação e redução de risco por causa desses acontecimentos.”

Rodrigo Aloi, chefe de pesquisa e estratégia da HMC Capital

Investidores buscam diversificação

Do outro lado do balcão, Aloi disse perceber uma abertura maior dos investidores para diversificar os investimentos no exterior para além do S&P 500 – principal índice da bolsa americana. Entre as oportunidades, o estrategista destacou a performance e a perspectiva de ações europeias.

“Nos últimos 12 meses, os benchmarks europeus de ação tiveram performance superior ao S&P – o que não acontecia nos últimos dez anos. Temos visto uma volta do normal, com uma performance melhor equilibrada entre diferentes geografias”, avaliou.

Aloi enxerga outro vetor de oportunidades no crédito privado global, que vem sendo beneficiado por uma combinação de três fatores: a taxa livre de risco maior que a média histórica, os spreads em níveis atrativos e o diferencial de juros Brasil e Estados Unidos, que permanece em patamar historicamente alto.

“Com tudo isso no radar, o brasileiro hoje pode usufruir da oportunidade em crédito global e continua sendo competitivo frente aos outros players que eventualmente estão investindo só em crédito Brasil”.

O estrategista lembrou ainda que a alta captação de fundos de crédito privado no Brasil no último ano tem gerado uma pressão de alocação que deixa o investimento menos atrativo, com compressão de spreads. Seria mais um motivo para observar o segmento no exterior, segundo ele.

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Beatriz Quesada

Jornalista especializada na cobertura econômica. Formada pela USP, escreve sobre mercados, negócios e setor imobiliário. Tem passagens por Exame, Capital Aberto e BandNews FM.