Bloomberg Línea — Investidores globais têm operado com otimismo nos últimos dias, na expectativa que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) inicie o ciclo de corte de juros em sua próxima reunião, nos dias 16 e 17 deste mês.
Ainda assim, tanto os Estados Unidos quanto outros países do mundo desenvolvido se deparam com um problema comum ao Brasil e a outros países emergentes: os desafios na trajetória da dívida pública, que se manifestam na alta do rendimento da dívida longa, com impactos em decisões de alocação de capital.
“Apesar de haver uma interpretação global dos investidores de que a curva curta começa a cair [em setembro], a longa continua pressionada”, afirmou Roberto Campos Neto, ex-presidente do Banco Central e atual vice-chairman do Nubank, em evento da Nu Asset realizado nesta quinta-feira (4) em São Paulo.
A avaliação do ex-BC é que a pressão sobre a curva longa de juros é um indicativo de desequilíbrio fiscal agravado após a pandemia. A solução passaria pelo corte de gastos, um tema recorrente entre investidores brasileiros e de países emergentes.
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Campos Neto ressaltou que a questão vai além do Brasil.
“Vários outros países vão enfrentar o mesmo tipo de problema, incluindo os Estados Unidos, que, pela primeira vez em muitas décadas, tem hoje um debate sobre o fiscal mais transparente e mais acirrado”, disse.
Desequilíbrio global
A semente para o desequilíbrio fiscal global foi plantada na pandemia, com a combinação de dois aceleradores econômicos: estímulos fiscais, por parte dos governos, combinados ao corte de juros promovido pelos bancos centrais.
A estratégia evitou uma recessão global, mas deixou como herança do pós-pandemia uma inflação alta e dívidas mais elevadas.
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“Quando você tem uma dívida maior e juros mais altos, o custo de rolagem dispara. Isso começa a sugar liquidez de outros lugares e a gerar impactos mais graves na economia”, avaliou.
Para Campos Neto, a experiência recente mostra que cerca de 90% dos países recorreram ao aumento de impostos no pós-pandemia para equilibrar as contas, evitando o corte de gastos.
Houve, no entanto, um foco mais intenso desses impostos sobre o capital do que sobre a mão de obra em sua visão. O desincentivo ao investimento, por sua vez, contribuiu para reduzir a produtividade global em um cenário que já trazia desafios estruturais.
“Estamos em uma armadilha: envelhecimento populacional, uma dívida muito grande e muitas contas para pagar, como os de defesa e os de transformação sustentável”, resumiu.
A solução passaria pelo corte de gastos. “Se os governos não conseguirem entender que precisam reduzir gastos, vão acabar tendo que fazer cortes em condições iniciais muito piores do que as que temos hoje.”
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