Novo ciclo do petróleo em LatAm: Brasil e Argentina avançam; México e Colômbia recuam

Relatório da Fitch Ratings mostra que pré-sal, Vaca Muerta e boom da Guiana puxam o avanço regional, enquanto México e Colômbia enfrentam queda de reservas e pressão financeira

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Bloomberg Línea — A América Latina entrou em uma nova fase na reconfiguração de seu mapa do petróleo em 2026. Enquanto alguns países enfrentam o esgotamento progressivo de suas reservas, outros consolidam uma trajetória de expansão da produção, das exportações e do acesso aos mercados de capitais.

Essa transformação redefine o equilíbrio energético regional e molda novos atores no cenário global de hidrocarbonetos.

O Brasil, a Guiana e a Argentina concentram o crescimento regional da oferta, enquanto a Colômbia e o México enfrentam quedas sustentadas nas reservas comprovadas.

Essa transição ocorre em um contexto de preços moderados e maior sensibilidade regulatória, com um horizonte em que a pressão fiscal, a sustentabilidade ambiental e o investimento em infraestrutura condicionam a lucratividade dos projetos.

O último relatório da Fitch Ratings atribui à região uma perspectiva de crédito “deteriorada” e adverte que “a volatilidade dos preços testará a flexibilidade das estruturas de custo dos produtores independentes à medida que os esquemas de royalties se tornarem mais relevantes”.

Para a agência de classificação de risco, as reservas na Colômbia e no México ressaltam a urgência da aplicação de capital, enquanto as empresas independentes da Argentina aumentaram as reservas e o crescimento da produção.

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“Apesar dos movimentos desfavoráveis do preço do petróleo, as empresas mantêm um bom acesso ao financiamento”, observou a Fitch.

Balanços

O Brasil tem consolidado sua liderança com uma produção de mais de 3,5 milhões de barris por dia, com projeções que colocam esse volume entre 4 e 5 milhões de barris por dia até 2030, de acordo com estimativas da Agência Internacional de Energia citadas pela Bloomberg Economics.

A Petrobras lidera esse crescimento por meio de uma estratégia de intensificação no pré-sal e de uma estrutura de custos que a Fitch classifica como uma das mais eficientes da região.

A Argentina, após uma reestruturação parcial de seu setor, está avançando com a consolidação de Vaca Muerta.

A Fitch espera que os produtores independentes aumentem a produção em 14% em 2025 e 12% em 2026. A infraestrutura de transporte e exportação, especialmente com a conclusão do oleoduto VMOS, capitalizará as reservas até então subutilizadas.

Jimena Zúñiga, analista da Bloomberg Economics, observa que “a Argentina também parece destinada a ultrapassar 1 milhão de barris por dia, à medida que o boom do xisto em Vaca Muerta ganha impulso”.

A Guiana representa o caso mais perturbador no mapa do petróleo regional. Com menos de um milhão de habitantes e sob um modelo contratual favorável à ExxonMobil e seus parceiros, o país caribenho deve se tornar um dos vinte maiores produtores per capita do mundo até 2030.

O Fundo Monetário Internacional estima que seu PIB per capita ultrapassará o da Espanha em cinco anos. A Guiana “já se tornou o país mais rico da América Latina, graças ao aumento da produção de petróleo”, disse Zúñiga.

Em contrapartida, a Colômbia e o México estão em trajetórias de queda. A Fitch estima que a vida útil das reservas comprovadas da Colômbia tenha caído para menos de sete anos, em parte devido à proibição da produção não convencional.

No México, o subinvestimento e as deficiências operacionais da Pemex reduziram esse horizonte para oito anos.

“O volume das reservas existentes é grande o suficiente para justificar uma avaliação ‘aa’, mas as restrições de liquidez levantam dúvidas sobre a capacidade da empresa de desenvolvê-las no curto prazo“, segundo o relatório da Fitch.

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Entre as empresas classificadas, a Pemex enfrenta os maiores desafios de vencimento financeiro, com US$ 15,9 bilhões em dívidas de curto prazo a vencer e US$ 7,6 bilhões em títulos com vencimento até 2026.

A Fitch prevê que o governo mexicano alocará US$ 13,4 bilhões no orçamento nacional para cobrir parte dessas obrigações.

“A Pemex apresenta uma alavancagem de 9,5 vezes o Ebitda em 2024 e um custo da dívida por barril produzido de US$ 8,33”, observa a Fitch.

“A Petrobras apresenta o perfil mais forte, com um índice de alavancagem de 0,6 vezes e um custo da dívida de US$ 2,00 por barril.”

O caso colombiano reflete uma tensão estrutural entre os objetivos fiscais e as restrições políticas.

A Fitch adverte que “o vínculo com o governo e a ausência de produção não convencional explicam a classificação ‘b’ dos produtores independentes do país”.

As perspectivas de exploração na margem equatorial, tanto na Colômbia quanto no norte do Brasil, podem mudar esse quadro se os investimentos em águas profundas se concretizarem.

Mudanças

O comportamento dos custos operacionais também começou a definir uma nova hierarquia entre os produtores.

A Fitch estima que o custo total médio de produção, incluindo royalties e impostos, foi de US$ 50 por barril em 2024, contra um preço estimado de US$ 70. Nesse cenário, os produtores com estruturas menos eficientes enfrentam riscos financeiros.

“As empresas com os custos mais altos incluem a Frontera Energy, com US$ 68,3 por barril, a YPF, com US$ 60,2, e a Ecopetrol, com US$ 59,9″, segundo a análise.

Em contrapartida, “a Petrobras registrou um custo médio de ciclo de US$ 15,17, um dos mais baixos do portfólio”.

As pressões sobre os custos aumentaram desde 2020 devido à inflação no setor, desvalorizações cambiais e menor diluição dos custos fixos devido à queda da produção de alguns participantes.

A Fitch adverte que “se os preços continuarem a cair, os emissores poderão aumentar ainda mais a flexibilidade do fluxo de caixa”.

Apesar desse ambiente mais cauteloso, as condições de liquidez permanecem estáveis.

A Fitch projeta um índice de caixa em relação à dívida de curto prazo de 2,5x em 2025 e de 1,6x em 2026. Empresas como a Hunt Oil Peru e os produtores de Vaca Muerta mantêm perfis de baixo custo que lhes permitem navegar em cenários de preços mais baixos sem comprometer a liquidez.

“A disponibilidade de linhas não comprometidas continua em vigor para os emissores classificados em todo o portfólio, o que fortalece a liquidez”, conclui o relatório.

Com base nesse cenário, a América Latina está caminhando para um novo estágio em que a geologia, as políticas energéticas e a capacidade de financiar a transição determinarão a posição relativa de cada país no tabuleiro de xadrez global do petróleo.