Bloomberg — O Hamas libertou, na manhã de segunda-feira, os 20 últimos reféns israelenses ainda vivos mantidos na Faixa de Gaza, após um acordo mediado pelos Estados Unidos no fim da semana passada.
O grupo militante palestino entregou os reféns ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha em duas etapas. Israel recebeu os primeiros sete reféns por volta das 8h45, no horário local, e os 13 restantes foram libertados cerca de duas horas depois. O exército israelense confirmou posteriormente que esses 13 já estavam em território israelense.
Israel ainda não comentou sobre o estado de saúde dos reféns após mais de dois anos em cativeiro.
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No mesmo período, Israel começou a libertar prisioneiros palestinos. Houve cenas de celebração em cidades como Ramallah, na Cisjordânia, e Khan Younis, em Gaza, quando os detidos desceram dos ônibus e foram recebidos por multidões em festa.
O primeiro grupo de reféns foi libertado pouco antes da chegada do presidente dos EUA, Donald Trump, a Israel, em uma viagem ao Oriente Médio para celebrar o acordo de cessar-fogo firmado na semana anterior, também com mediação do Egito, Catar e Turquia. Trump afirmou que o pacto deve encerrar o devastador conflito de dois anos em Gaza.
O presidente americano foi recebido no principal aeroporto de Tel Aviv pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e fará um discurso no Parlamento, em Jerusalém, nesta segunda-feira, antes de seguir para o Egito, onde participará de uma cerimônia de assinatura com líderes mundiais.
Segundo a presidência egípcia, o evento contará com a presença do primeiro-ministro britânico, Keir Starmer, do presidente francês, Emmanuel Macron, do chanceler alemão, Friedrich Merz, do emir do Catar, xeque Tamim bin Hamad al Thani, e do primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney.
A longa lista de líderes ressalta a importância atribuída por Trump ao fim da guerra, à estabilização do Oriente Médio e ao fortalecimento dos laços entre Israel e os países árabes.
O governo egípcio afirmou que Netanyahu também participaria da cúpula, mas o gabinete do premiê declarou posteriormente que ele “não poderá comparecer por questões de agenda”. Não ficou claro por que Netanyahu recusou o convite do presidente Abdel Fattah el-Sisi, que, segundo o site Axios, teria sido feito a pedido de Trump.
Segundo o acordo da semana passada, 48 reféns — todos homens, exceto um — ainda estavam detidos em Gaza, sendo que 20 deles estavam vivos.
O Hamas concordou em entregar os corpos dos reféns mortos, embora não esteja claro se isso ocorrerá nesta segunda-feira ou mais tarde.
Israel é obrigado a libertar quase 2.000 prisioneiros palestinos, alguns deles ex-membros do Hamas que cumprem penas de prisão perpétua.
Israel retirou suas tropas da maior parte das áreas povoadas da Faixa de Gaza e concordou em permitir a entrada de muito mais ajuda humanitária no devastado território mediterrâneo, lar de cerca de 2,2 milhões de pessoas.
Quase todos foram deslocados desde o início da guerra, em 7 de outubro de 2023, e o ministério da Saúde controlado pelo Hamas em Gaza afirma que mais de 67 mil pessoas foram mortas. O exército israelense diz que quase 470 de seus soldados morreram em combate em Gaza.
A guerra desencadeou crises em todo o Oriente Médio — provocando confrontos entre Israel e grupos apoiados pelo Irã no Líbano, na Síria e no Iêmen, além de tensões diretas entre o Estado judeu e o próprio Irã.
O conflito também levou a protestos em massa em várias partes do mundo, a maioria em apoio aos palestinos, cujo sofrimento tem contribuído para o crescente isolamento de Israel, inclusive entre aliados importantes na Europa.
“Após a chegada dos reféns vivos, a Cruz Vermelha retornará a Gaza para buscar alguns dos sequestrados que morreram”, disse Gal Hirsch, coordenador de prisioneiros de guerra e pessoas desaparecidas do gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, a jornalistas no domingo.
“Não estamos divulgando o número exato que será trazido de volta amanhã.”
O Hamas, considerado um grupo terrorista pelos Estados Unidos e pela União Europeia, iniciou a guerra com seu ataque de 2023.
Enquanto lançava 5.000 mísseis contra cidades israelenses, milhares de seus combatentes cruzaram a fronteira e mataram 1.200 pessoas, sequestrando outras 250.
A maioria dos reféns foi libertada durante cessar-fogos anteriores, no fim de 2023 e no início de 2025.
Um órgão apoiado pela ONU declarou a ocorrência de fome em partes de Gaza, em agosto, devido ao bloqueio israelense à entrada de ajuda humanitária.
Especialistas acusaram Israel de genocídio e de adotar uma política de fome forçada — acusações que o país nega.
De modo geral, israelenses e palestinos reagiram com alívio ao acordo de cessar-fogo e à libertação dos reféns. Os habitantes de Gaza estão devastados após dois anos de conflito intenso.
Embora Israel não tenha alcançado o objetivo declarado de Netanyahu de destruir o Hamas — e não haja garantia de que o grupo vá se desarmar, como prevê o plano de paz de 20 pontos de Trump —, o país viu as divisões sociais e as pressões econômicas se agravarem à medida que a guerra se prolongava.
O shekel se fortaleceu para o maior nível em três anos neste mês, com a perspectiva de fim do conflito, enquanto as ações e os títulos israelenses registraram alta.
Já o endividamento e o déficit fiscal do país dispararam desde o início da guerra.
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O genro de Donald Trump, Jared Kushner, e seu enviado para o Oriente Médio, Steve Witkoff, atuaram como intermediários nas negociações realizadas na cidade egípcia de Sharm El-Sheikh, no Mar Vermelho.
Os dois discursaram na noite de sábado para uma multidão entusiasmada na Praça dos Reféns, em Tel Aviv, onde foram aclamados por seu papel na obtenção do acordo.
A plateia aplaudia sempre que o nome de Trump era mencionado, enquanto o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu — visto por parte dos israelenses como alguém que prolongou a guerra para agradar aos membros de sua coalizão de extrema direita — foi vaiado quando Witkoff tentou elogiá-lo.
“Um dia, Steve e eu contaremos essas histórias”, disse Kushner, logo após Witkoff. “Elas vão fazer vocês rirem e chorarem. Foi uma loucura. Notei que o Steve não usou nenhum palavrão no discurso — acho que ele gastou todos durante as negociações.”
Suas palavras mostraram a intensidade das negociações da semana passada. Ainda há muitos desafios para os mediadores superarem nas próximas semanas — e possivelmente meses. Além de não confirmar que irá se desarmar, o Hamas ainda não concordou formalmente em ficar de fora da futura administração de Gaza.
Demonstrando sua capacidade contínua de exercer poder — apesar de uma guerra em que perdeu quase todos os principais líderes militares e seu arsenal de mísseis —, o Hamas mobilizou forças policiais em partes da Cidade de Gaza apenas algumas horas depois da retirada das tropas israelenses no fim de semana.
As forças israelenses devem recuar em etapas até uma zona de segurança logo dentro da fronteira de Gaza.
Segundo o plano, elas podem permanecer ali “até que Gaza esteja devidamente segura contra qualquer nova ameaça terrorista”.
Ainda há pouca clareza sobre quem administrará Gaza a seguir. A proposta dos Estados Unidos prevê um “Conselho da Paz”, presidido por Trump e incluindo o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, que supervisionaria um comitê tecnocrático de palestinos responsável pelos serviços públicos.
No entanto, Trump disse a jornalistas, durante o voo para Israel, que precisa avaliar a popularidade de Blair na região antes de seguir com a ideia. Blair é amplamente criticado no mundo árabe pelo envolvimento do Reino Unido na invasão do Iraque liderada pelos EUA em 2003.
“Primeiro, quero ter certeza de que Tony será bem aceito por todos, porque ainda não sei disso”, disse Trump aos repórteres. “Sempre gostei de Tony, mas quero confirmar que ele é uma escolha aceitável para todos.”
-- Com a ajuda de Abeer Abu Omar, Ethan Bronner e Alister Bull.
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