Vinícola francesa que rejeitou o nome Bordeaux faz planos para crescer no Brasil

Château Le Puy defende a produção natural e diz que não precisa se associar ao nome da célebre região francesa. Proprietário Harold Langlais promete exportar rótulo de alta gama para o Brasil, em entrevista à Bloomberg Línea

Vinhos do chateau le puy, de bordeaux
Por Daniel Buarque
22 de Maio, 2025 | 04:06 PM

Bloomberg Línea — Poucas regiões no mundo têm um nome tão fortemente associado a vinhos de qualidade quanto Bordeaux, na França.

Mas, por mais que conhecida e valorizada que seja, um pequeno produtor local decidiu ignorar a “apelação” (designação de origem) da região e trabalha para ser visto como algo diferente, com uma marca própria.

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“Não somos Bordeaux, somos Le Puy”, disse Harold Langlais, sócio e co-proprietário da vinícola e membro do comitê de enólogos do Château Le Puy durante um almoço recente em São Paulo.

Em visita ao Brasil, Langlais promoveu seus vinhos branco, tintos e rosés, prometeu voltar a exportar um rótulo icônico que está indisponível no país e falou sobre aumentar o número de garrafas exportadas para o mercado da América do Sul.

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A diferença central do seu vinho, segundo o produtor, está no método usado para preparar a bebida.

Apesar de estar dentro de Bordeaux, entre as famosas subregiões de Saint-Émilion e Pomerol, e de produzir a bebida desde 1610, Le Puy foi uma das primeiras vinícolas a promover uma produção mais natural da bebida.

A propriedade se destaca pelo compromisso em evitar o uso de produtos químicos sintéticos há mais de quatro séculos, adota uma filosofia de mínima intervenção na bebida, utiliza práticas sustentáveis e incentiva a biodiversidade.

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Para Langlais, isso resulta em bebidas mais vivas e interessantes, que se destacam enquanto a famosa região enfrenta uma crise por causa da queda na produção, afetada pelas mudanças climáticas, e da redução na demanda global.

“As pessoas não bebem mais Bordeaux. A região está em crise, e as pessoas acham seus vinhos entediantes”, disse Langlais. “Le Puy é diferente. É como um alimento. É alegria”, disse. Segundo ele, o nome da região no rótulo se torna desnecessário.

“Não precisamos ser vistos como Bordeaux e podemos ser apenas um simples vinho de mesa”, explicou.

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Esta posição evoca um movimento ocorrido nos anos 1960 e 1970 na Itália, quando produtores da Toscana rejeitaram as normas das denominações locais, adotaram novas uvas e técnicas e criaram os vinhos que ficaram conhecidos como “Super Toscanos”. Por esse parâmetro, Le Puy seria como um “Super Bordeaux”.

Harold Langlais, sócio e co-proprietário da vinícola e membro do comitê de enólogos do Château Le Puy

A vinícola é pequena e produz cerca de 200 mil garrafas por ano, segundo Langlais. E o volume tem caído a cada ano também em razão das mudanças climáticas, que têm desafiado a produção na região.

O Château Le Puy exporta seus vinhos para 70 países atualmente, especialmente para o Japão, por causa da associação com o mangá Gotas de Deus, que cita o rótulo. A vinícola vende relativamente pouco para o Brasil.

Segundo Langlais, são enviadas apenas 2.000 a 3.000 garrafas para o país a cada ano. “Mas quem sabe agora não aumentamos para 5.000”, disse.

Para crescer no país, ele disse que a vinícola vai voltar a mandar para o país o rótulo Barthélemy, um dos vinhos mais especiais da marca, que custa 150 euros na França e que deve chegar ao Brasil por um valor em torno de R$ 4.500 com os impostos, segundo a importadora World Wine, que traz os rótulos de Le Puy para o país.

Atualmente, a importadora vende o vinho rosé Château Le Puy Rose Marie por preços a partir de R$ 740, dependendo da safra, e tem também o Château Le Puy Magnum (garrafa de 1,5 litro), por R$ 1.390.

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Apesar da aposta em crescimento no mercado sul-americano, o produtor disse que a vinícola enxerga a exportação mais como uma missão do que como uma estratégia comercial.

“Queremos que todos sejam expostos a nossos vinhos. Temos um mercado forte na França e não precisaríamos vender para fora, mas acreditamos que é importante espalhar nosso estilo de vinificação para o mundo”, disse.

Em tempos de guerra comercial e de ameaças de aumento das tarifas sobre bebidas alcoólicas - em particular as francesas - pelo governo de Donald Trump, o produtor diz não se preocupar com a tensão geopolítica.

“A história vai esquecer Trump e ele não vai fazer diferença. Pensamos no longo prazo, e a nossa preocupação real é outra, pois o que vai afetar o futuro é o aquecimento global. Vamos precisar aprender a viver em um mundo instável, complexo e problemático”, afirmou o produtor.

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Daniel Buarque

Daniel Buarque

É doutor em relações internacionais pelo King’s College London. Tem mais de 20 anos de experiência em veículos como Folha de S.Paulo e G1 e é autor de oito livros, incluindo 'Brazil’s international status and recognition as an emerging power', 'Brazil, um país do presente', 'O Brazil é um país sério?' e 'O Brasil voltou?'