Shutdown nos EUA paralisa lançamento de cervejas, vinhos e destilados e afeta o setor

Fabricantes de bebidas alcoólicas tiveram de adiar os planos de novos rótulos, enquanto não conseguem obter as aprovações regulatórias diante da paralisação do governo; atraso prejudica as receitas

Garrafas de uísque
Por Ari Natter - Charles Gorrivan
18 de Outubro, 2025 | 02:41 PM

Bloomberg — Os americanos terão de esperar um pouco mais pelo novo uísque Magic Rabbit, com sabor de chocolate e amendoim em versão cremosa. O lançamento, previsto para janeiro, tornou-se mais uma vítima do fechamento (shutdown) do governo dos Estados Unidos, que paralisou as aprovações exigidas pelo Departamento do Tesouro para que fabricantes de bebidas alcoólicas possam introduzir novos produtos ou alterar receitas e rótulos.

As consequências vão desde o atraso no lançamento das cervejas natalinas de algumas microcervejarias e de novos vinhos californianos até o adiamento forçado de hard seltzers com infusão de ervas.

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“É algo enorme”, disse Rob Pinson, advogado que assessora destilarias do Tennessee, além de vinícolas e cervejarias, como sócio do escritório Adams & Reese, de Nova Orleans. “Se você não consegue colocar o produto no mercado, não consegue gerar receita.”

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O impasse atinge um setor que já enfrenta dificuldades. As exportações de destilados dos EUA vêm caindo em meio à guerra comercial conduzida por Donald Trump, enquanto as vendas gerais de bebidas alcoólicas diminuem, com jovens, mulheres e consumidores mais preocupados com a saúde reduzindo o consumo.

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Apenas 54% dos adultos afirmaram beber, segundo pesquisa da Gallup divulgada em agosto — o menor percentual desde o início da série histórica, em 1939.

A Cleveland Whiskey, pequena destilaria artesanal de Ohio com 13 funcionários, teve de adiar a primeira produção da nova versão cremosa do Magic Rabbit — uma ideia que surgiu depois que clientes começaram a usar o uísque em milk-shakes e sobremesas, contou o presidente da empresa, Tom Lix.

No total, nove novos rótulos de uísque estão parados, o que pode custar à companhia centenas de milhares de dólares em vendas perdidas, segundo ele.

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“Isso é significativo para o nosso negócio; é a diferença entre contratar e não contratar pessoas”, disse Lix por telefone. “Não posso imprimir rótulos nem engarrafar o produto sem as aprovações.”

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O Escritório de Impostos e Comércio de Álcool e Tabaco (TTB, na sigla em inglês), vinculado ao Tesouro dos EUA e responsável também por emitir licenças para abertura de novas vinícolas e cervejarias, colocou mais de 86% de seus funcionários em licença não remunerada, de acordo com seu plano de contingência. O site da agência informa que “todas as operações não excepcionais estão suspensas”.

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Um porta-voz do Tesouro não respondeu a pedidos de comentário.

O TTB, que normalmente processa mais de 200.000 solicitações por ano para aprovar fórmulas e rótulos de bebidas alcoólicas — muitas delas em poucos dias —, interrompeu o trabalho justamente quando o setor entra em seu trimestre mais movimentado.

Isso ameaça atrasar o lançamento de cervejas e lagers sazonais planejadas para o Natal e o inverno, já que muitos fabricantes não conseguiram enviar suas novas receitas ou rótulos antes do fechamento, explicou Pinson.

Ainda assim, muitas microcervejarias obtiveram as aprovações necessárias para seus produtos temáticos de fim de ano antes da paralisação, disse Bart Watson, presidente da Brewers Association, entidade que representa produtores artesanais com sede no Colorado.

O acúmulo de processos pode gerar um efeito cascata. Durante o fechamento de 35 dias entre 2018 e 2019, as aprovações chegaram a atrasar até cinco meses, conforme os pedidos não processados se acumulavam, segundo o Wine Institute, associação sediada em Sacramento que representa vinícolas da Califórnia.

“Estamos ouvindo de produtores de vinho que foram obrigados a adiar o engarrafamento e a produção de rótulos programados para lançamento já neste fim de ano”, afirmou em e-mail Julie Berge, vice-presidente da entidade. “Para muitas vinícolas, esses atrasos são financeiramente insustentáveis.”

Entre os clientes de Pinson estão dois fabricantes de hard seltzers que tiveram de adiar o lançamento de novas bebidas com sabor de ervas por não conseguirem as aprovações exigidas para fórmulas e rótulos, contou o advogado, sem revelar os nomes das empresas.

A St. Augustine Distillery, com sede na Flórida — que já vinha sofrendo com o aumento dos custos de importação de vidro, rótulos e rolhas, além da queda no turismo local —, agora enfrenta mais um golpe.

O plano de recuperação da destilaria inclui uma reformulação das embalagens, substituindo rótulos de estilo vintage por designs mais limpos e legíveis, com o objetivo de competir com marcas nacionais em novos mercados.

Embora os novos rótulos de vodca, gim e rum já tenham recebido aprovação, a empresa ainda aguarda liberação para seu novo bourbon, enviado há algumas semanas. O produto traz um rótulo preto e dourado, em uma garrafa moldada sob medida com a inscrição “The Spirit of Florida” na base.

“Para quem vê de fora, conseguir a aprovação de um rótulo pode parecer um detalhe menor”, disse Richard deMontmollin, vice-presidente de produção. “Mas posso garantir que isso realmente tira o chão da gente.”

A destilaria planejava lançar as novas embalagens antes da temporada de festas, tradicionalmente o período mais lucrativo, quando os consumidores buscam garrafas para presentear. Embora deMontmollin não tenha estimado o prejuízo, ele afirmou que o impacto é “sem dúvida significativo”.

“O momento não poderia ser pior”, acrescentou. “Estamos sendo pressionados de todos os lados, e não poder lançar um novo produto reduz uma das poucas chances de sucesso que temos em meio a tantos outros desafios.”

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